Amazônia perdeu 20% desde 1970 e Cerrado, 50%, aponta relatório

Estudo da ONG WWF diz que desmatamento intenso está sufocando biomas e aumentando lista de espécies ameaçadas de extinção.

30 out 2018 - 12h05
(atualizado em 5/11/2018 às 11h43)
Desmatamento da Amazônia, em foto de 2007; floresta brasileira perdeu 20% de sua área desde 1970
Desmatamento da Amazônia, em foto de 2007; floresta brasileira perdeu 20% de sua área desde 1970
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

O Fundo Mundial para a Natureza (WWF, da sigla em inglês), ONG de defesa do meio ambiente, acaba de divulgar a versão 2018 do seu relatório Planeta Vivo. E as conclusões não são nada boas, principalmente para o Brasil.

A análise, feita por 50 pesquisadores em todo o mundo com base em pesquisas de 19 organizações, apontou para um desmatamento intenso, que reduziu, de 1970 para cá, 20% da Floresta Amazônica e 50% do Cerrado, biomas bastante representativos do país.

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A redução das áreas verdes acaba trazendo uma implicação direta na vida de espécies, aumentando ainda mais a lista daquelas que estão ameaçadas de extinção.

O relatório atual, que traz um cenário desolador, confirma uma curva de desgaste ambiental que vem se acentuando nos últimos anos.

A WWF divulga o relatório a cada dois anos. Nesta edição, o levantamento cita animais brasileiros entre os ameaçados em função dessa perda de ambiente natural. Na lista estão a jandaia-amarela (Aratinga solstitialis), o tatu-bola (Tolipeutes tricinctus), o uacari (Cacajao hosomi), o boto (Inia geoffrensis) e o muriqui-do sul (Brachyteles aracnoides).

No caso dos botos, a exploração é tida como involuntária: os animais acabam sendo presos em redes de pesca, mesmo não sendo alvo de pesca predatória.

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De acordo com a WWF, que monitora, desde 1970, 16.704 populações animais, declínio de populações de vertebrados no período em todo o mundo é de 60% - mamíferos, peixes, aves, répteis e anfíbios. De lá para cá, houve um declínio de 83% das populações de água doce. No caso dos mamíferos, a redução total foi de 22%.

Para efeitos comparativos, entre 1970 e 2010, esse declínio foi de 52%. Ou seja: não estamos conseguindo conter o estrago, quanto menos recuperá-lo. Um dos exemplos mais críticos trazidos pelo relatório é a população de elefantes na Tanzânia, que reduziu em 86% desde os anos 1970.

Para se recuperar sozinha do estrago causado pela humanidade, a natureza precisaria de 6 milhões de anos, diz o documento.

Nos trópicos, principalmente nas Américas Central e do Sul, a deterioração do ecossistema é ainda mais grave - com redução de 89% dessas populações.

A região entre os trópicos é onde está a maior parte da vida do planeta, justamente por conta da questão climática. Ao mesmo tempo, é nesta faixa onde estão também as maiores áreas de uso de solo e dos recursos naturais - as áreas cultivadas para a produção de alimentos.

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Amazônia perdeu 50 mil km² de terra nos últimos 7 anos
Foto: AFP / BBC News Brasil

O desmatamento para o uso intenso da terra tem afetado drasticamente os ecossistemas do planeta.

Segundo a WWF, a taxa de extinção das espécies hoje - número que indica o risco de desaparecimento das mesmas - é de 100 a 1.000 vezes maior do que era antes de as atividades humanas começarem a alterar a biologia e a química do planeta.

Isso significa que a Terra vive seu sexto processo de extinção em massa nos últimos 500 milhões de anos. Desta vez, o culpado é uma espécie que habita o planeta - nós, os humanos.

"Preservar a natureza não é apenas proteger os tigres, pandas, baleias e animais que apreciamos. É muito mais: não pode haver um futuro saudável e próspero para os homens em um planeta com o clima desestabilizado, os oceanos sujos, os solos degradados e as matas vazias, um planeta despojado de sua biodiversidade", declarou o diretor-geral da WWF, Marco Lambertini.

Ambientes brasileiros

Em junho, dados divulgados pelo Ministério do Meio Ambiente indicavam que a devastação do Cerrado, a savana brasileira, era 60% a mais do que a perda na Amazônia nos últimos sete anos.

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No total, foram 80 mil km² de terras devastadas, contra 50 mil km² da Amazônia.

A região do Cerrado é onde mais se expande o agronegócio brasileiro. Em coletiva de imprensa realizada em junho, o pesquisador Claudio Almeida, responsável por divulgar os dados, ressaltou que na parte mais ao norte do bioma, em especial nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, foi observada a maior incidência do desmatamento nos últimos anos - os Estados respondem por 62% do total perdido.

E é justamente essa região apontada como a nova fronteira do agronegócio brasileiro - dedicada sobretudo à produção de soja, óleo de palma e criação de gado.

Os números são do monitoramento chamado Prodes do Cerrado, feito por satélite pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Quando os dados foram divulgados, o Instituto de Pesquisas Ambientais da Amazônia divulgou nota afirmando que a "savana consolida-se como o bioma mais ameaçado do Brasil atualmente".

O desmatamento ocorrido no Brasil tem afetado, de acordo com o WWF, não só a vida dos animais. Mas também a oferta de água doce - o que ajuda a explicar as recorrentes crises hídricas que têm ocorrido, como a que deixou em risco o abastecimento da região Sudeste nos últimos anos.

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Declínio de vertebrados - mamíferos, peixes, aves, répteis e anfíbios - é uma das preocupações levantadas pelo relatório
Foto: AFP / BBC News Brasil

Isto porque as regiões mais afetadas, onde estão Cerrado e Amazônia, são justamente as que abrigam os principais mananciais da malha hidrográfica brasileira.

De acordo com as metas da convenção da Organização das Nações Unidas para a biodiversidade, pelo menos 17% dos ecossistemas de cada país precisariam estar em áreas protegidas para a conservação.

O Brasil, país que tem a maior biodiversidade do planeta, está distante desse número. Apenas 8% do cerrado está protegido. No Pantanal, apenas 2% das áreas estão protegidas.

Planeta

O relatório mostra que três quartos do planeta já foi impactado pela ação humana. Há uma projeção que, em 2050, apenas 10% da Terra esteja livre da interferência humana.

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O WWF aponta que os seres humanos já ultrapassaram os limites de segurança quanto às mudanças climáticas e níveis de interferência no sistema terrestre. Integridade da biosfera e fluxos biogeoquímicos de fósforo e nitrogênio também já sofreram interferências humanas tidas como irreversíveis - sobretudo por conta do uso de fertilizantes na agricultura e do manejo da pecuária intensiva.

Segundo o texto, isto representa um declínio acentuado da "saúde da planetária", da "natureza" e da "biodiversidade". "Prejudicando a saúde o bem-estar das pessoas, espécies, sociedades e economias em todos os lugares", ressalta.

WWF aponta que os seres humanos já ultrapassaram os limites de segurança quanto às mudanças climáticas e níveis de interferência no sistema terrestre
Foto: Mariana Veiga / BBC News Brasil

A organização emitiu um alerta vermelho para a degradação do solo e ressaltou que está perto de fazer o mesmo em relação à acidificação das reservas de água doce e dos oceanos.

Uma possível solução apontada para tentar reduzir esses estragos seria o emprego mais eficiente de tecnologias já disponíveis para a produção de alimentos. Embora tenha havido avanços por conta dos equipamentos e técnicas mais modernas, a WWF acredita que as melhorias cresceram de forma menor do que o potencial de dano.

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A pegada ecológica do homem, conclui o relatório, está hoje três vezes mais degradante do que era em 1970.

Um exemplo está no desperdício. Atualmente, cerca de 40% do que é produzido acaba sendo descartado por conta de falhas no processo de produção, transporte e mesmo dentro das residências.

O relatório frisa que é preciso "elevar o nível de alerta" para provocar um amplo e consciente movimento, chamando a atenção "suficiente dos líderes mundiais".

Segundo a ONG, é preciso uma ação consistente antes de 2020, porque, ao contrário, "uma porta sem precedentes se fechará rapidamente".

"Somos a primeira geração que tem uma visão clara do valor da natureza e do nosso impacto nela. Poderemos também ser a última capaz de inverter esta tendência", adverte o relatório.

Posicionamento ABIOVE

O Cerrado é o segundo maior bioma do Brasil. Dos seus 204 milhões de hectares (24% do território brasileiro), 103 milhões (50,5% da área original) estão cobertos por vegetação nativa.

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O cultivo de soja ocupa apenas 8% do bioma Cerrado (17 milhões de hectares). Os demais 92% (187 milhões de ha) são ocupados com vegetação nativa (103 milhões de ha), além da pecuária, algodão, cana de açúcar e eucalipto, que juntos perfazem 84 milhões de ha. Além disso, dos 70 milhões hectares ocupados com pastagens, cerca de 20 milhões de hectares têm aptidão de clima e solo para lavouras anuais. São essas áreas de pastagens que têm dado lugar à expansão da soja.

É equivocada a crença que a soja dizima o Cerrado brasileiro. Houve um declínio da ordem de cinco vezes das taxas de desmate no Cerrado nos últimos 10 anos. A área ocupada pela soja no Cerrado brasileiro, a principal região de produção do grão no País, atingiu em 2017 a menor taxa de desmatamento dos últimos 16 anos.

Entre 2014 e 2017, 7% das novas áreas plantadas com soja cresceram com desmatamento (90 mil hectares/ano). Entre 2007 e 2013, essa fatia era de 18% (190 mil hectares/ano) e, entre 2001 e 2006, de 27% (220 mil hectares/ano), aponta um estudo inédito elaborado pela Agrosatélite, com base em imagens de satélite e informações geoespaciais.

O estudo mostra que a expansão da sojicultura entre 2014 e 2017 foi de 1,4 milhão de hectares e somente 270 mil hectares de vegetação nativa foram convertidos em lavoura. Esses 270 mil convertidos em lavoura representam apenas 8,1% do total desmatado do Cerrado.

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A sojicultura está na menor fase de desmatamento do Cerrado, a queda é expressiva e a tendência é de redução, isso ocorre porque o crescimento da soja está expandindo em áreas que já estão abertas. A tendência de redução do desmatamento ganha força também com o aumento da produtividade das lavouras, maior fiscalização do governo, controle para compra e financiamento da indústria e acordos setoriais com a sociedade civil. A governança ambiental pública hoje é muito evoluída, conta com imagens de satélite de alta resolução e realiza frequentemente operações rigorosas por meio de IBAMA, Policia Federal e Guarda Nacional.

A cultura da soja traz benefícios econômicos e sociais significativos em locais com baixo IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Os municípios que lideram a produção de soja no Brasil têm Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e taxa de crescimento anual da população superiores à média nacional, segundo pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

O IDH é calculado pelo PNUD (órgão das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e considera indicadores como taxa de alfabetização, renda e mortalidade infantil. O índice vai de zero a um e, quanto mais perto de um, melhor o indicador. Dos 20 principais municípios produtores de soja no País, 19 têm IDH acima da média brasileira. O crescimento populacional anual nesses locais também é bem maior do que a média brasileira. O IBGE declara que a compilação desses dados "mostra que a agropecuária é importante para alavancar as condições de vida dos municípios".

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