As parcelas de R$ 600 do auxílio emergencial chegaram ao fim e passarão a ter seu valor cortado pela metade, segundo os planos do governo federal.
O presidente Jair Bolsonaro anunciou na terça-feira (01/09) que o benefício será reduzido para R$ 300 e será pago por quatro meses.
Para que esse cenário se concretize, no entanto, o governo Bolsonaro depende do Congresso Nacional.
O presidente disse que a mudança será feita por Medida Provisória. Isso significa que, embora entre em vigor na data da publicação, ela passa pelo crivo dos deputados e senadores, que podem fazer alterações.
Não seria a primeira vez que o Congresso faria mudanças no benefício. Na criação do auxílio em resposta à pandemia, o governo pretendia pagar R$ 200, mas foi o Legislativo que ampliou o benefício para R$ 600.
O anúncio sobre o futuro do auxílio emergencial, criado para proteger a renda de parte da população durante a pandemia do coronavírus, era aguardado há semanas, visto que a última parcela de R$ 600 foi referente a agosto.
Primeiro, o auxílio foi anunciado com duração de três meses, a ser pago a trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados que cumprem determinados requisitos, como renda familiar per capita de até meio salário mínimo (R$ 522,50) ou com renda total de até três salários mínimos (R$ 3.135). Em julho, o governo anunciou prorrogação por mais dois meses — até agosto, portanto.
A declaração de Bolsonaro, acompanhado por ministros, foi feita menos de uma hora após a divulgação da queda histórica do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, de 9,7% no 2º trimestre em comparação com os 3 primeiros meses do ano.
Após esse resultado, a economia brasileira entra oficialmente em recessão técnica (caracterizada por dois trimestres consecutivos de retração).
Bolsonaro também anunciou que o governo encaminhará na quinta-feira (03/09) ao Congresso a reforma administrativa que, segundo ele, valerá apenas para futuros servidores.
O que está em jogo
A discussão sobre o futuro do auxílio emergencial dividiu o governo e economistas.
De um lado, está o reconhecimento de que o benefício trouxe popularidade para o presidente. Além dos benefícios econômicos da transferência de renda neste momento de crise, Bolsonaro está vendo a importância do benefício para conquistar apoio de parte da população.
Analistas apontam que o benefício foi um dos motivos para uma melhora na aprovação do presidente. É importante lembrar que, considerando também as famílias dos 65 milhões de beneficiários do auxílio emergencial, o pagamento chega a beneficiar mais de 120 milhões de pessoas — mais da metade da população brasileira.
A avaliação de Bolsonaro atingiu o melhor patamar desde o início do mandato dele, em janeiro de 2019, segundo pesquisa Datafolha realizada em 11 e 12 de agosto. Subiu de 32% para 37% a parcela de entrevistados que consideram seu governo ótimo ou bom e caiu de 44% para 34% os que o consideravam ruim e péssimo.
A pesquisa anterior tinha sido divulgada em junho, mês em que foi preso Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente.
De outro lado, está a bandeira que Jair Bolsonaro levantou durante a campanha presidencial de 2018: o liberalismo econômico, personificado no ministro da Economia, Paulo Guedes.
Foi a promessa de reduzir a participação do Estado na economia e de promover ajustes nas contas públicas que garantiu ao então candidato Bolsonaro o apoio do grande empresariado. Embora Bolsonaro não tivesse histórico de defender essas medidas, ele garantia que a economia ficaria nas mãos de Guedes.
Economistas alinhados a esse pensamento liberal têm criticado intensificar medidas de transferência de renda porque, segundo eles, não há espaço fiscal para isso.
Enquanto ainda pagava R$ 600 por mês, o custo mensal do programa era de cerca de R$ 50 bilhões. Nos cinco meses terminados em agosto, portanto, o gasto supera R$ 250 bilhões. Para ter uma dimensão, o valor é mais que o dobro do déficit primário (ou seja, o resultado negativo) registrado em 2019, que foi de R$ 95 bilhões.
Foi em meio a esse debate que Guedes chegou a falar em impeachment em agosto, ao defender o teto de gastos, regra que limita o crescimento dos gastos da União. O ministro disse que os auxiliares que aconselham o presidente a "furar" a regra do teto de gastos estão levando o presidente para uma "zona de impeachment".
E o Renda Brasil?
Outro anúncio aguardado — este ainda sem uma definição — é sobre o Renda Brasil. Embora já tenha sido batizado, seu desenho não foi divulgado: é o programa de transferência de renda que o governo Bolsonaro prometeu para substituir o Bolsa Família, importante marca do governo do ex-presidente do PT Luiz Inácio Lula da Silva.
O Bolsa Família hoje atende mais de 14 milhões de famílias, com benefício que varia em função da renda, do número de pessoas na família e idade delas. O valor pago é, em média, de R$ 188, segundo dados de junho de 2020.
Paulo Guedes, chegou a dizer que o Renda Brasil reuniria programas sociais existentes e teria valor mais alto que o Bolsa Família.
Já no fim de agosto, no entanto, Bolsonaro demonstrou resistência em tirar recursos de outros programas, como o abono salarial, pago a trabalhadores formais que recebem até dois salários mínimos, para o programa. Foi nessa ocasião que ele disse que não poderia "tirar de pobres para dar para paupérrimos".
A nova edição do auxílio emergencial, com valor mais baixo, também é uma forma de o governo ganhar tempo na elaboração do prometido Renda Brasil, que esbarra na falta de recursos.
Para viabilizar um programa mais amplo que o Bolsa Família e não desrespeitar regras fiscais, seria necessário tirar recursos de outros programas ou cortar outras despesas.
A proposta da lei orçamentária de 2021 enviada pelo governo nesta segunda-feira (31/08) ao Congresso prevê um aumento de mais de 18% nos recursos para o Bolsa Família. A dotação sobe de mais de R$ 29 bilhões neste ano para quase R$ 35 bilhões no ano que vem. O governo argumentou que prevê um aumento no número de famílias beneficiadas pelo Bolsa para 15,2 milhões em 2021.