Quando era jovem, não me considerava uma feminista. Achava que o feminismo não era mais necessário, era até antiquado. Escrevo as últimas duas frases com a vergonha que apenas a honestidade que sair da ignorância nos traz.
A vida, a maior professora, fez seu trabalho. Hoje, sei que estava errada. Assédio no ambiente de trabalho, apropriação por colegas homens de ideias sem o devido reconhecimento, desmerecimento da mulher como intelectual, críticas a uma mulher pensar demais, ou de menos, na carreira, baixo acolhimento e promoção por homens de suas colegas mulheres foram coisas que vivi e que vi colegas brilhantes viverem - e terem suas vidas e carreiras impactadas por isto. Colegas economistas especialistas em gênero relatam estas experiências com a evidência dos dados também.
Há duas semanas, um deputado estadual de São Paulo, Arthur do Val, embarcou para a guerra na Ucrânia em um dos muitos espetáculos populistas que vivemos nesta era. O que um deputado estadual brasileiro acha que lhe cabe estar ali é do meu desconhecimento. Mas, o fato é que o deputado embarcou para a guerra - e recebeu alguns elogios por isto.
No final da semana passada, a mídia noticiou o conteúdo horripilante de áudios que o tal deputado havia trocado com amigos sobre a sua percepção a respeito das ucranianas. Não vale aqui retomá-los. Vale destacar que, apesar do horror do conteúdo, ele não é surpreendente. Estes áudios, infelizmente, são o reflexo, na sua forma mais chula, da condição da mulher na nossa sociedade.
Como de jure as mulheres hoje têm mais direitos que há poucas décadas, esta condição acaba ficando, de alguma forma, velada. Fica fácil então dizer que a lei garante oportunidades iguais para homens e mulheres e que qualquer diferença que ocorra na trajetória de vida de um homem e uma mulher decorre de um fator natural que separa os dois sexos.
Esta, certamente, é uma visão conveniente. Porém, ela não é verdadeira. Claro, nem todo homem atua como o tal deputado. Mas a situação que o deputado se colocou é caricata demais para ser usada como exemplo do cotidiano que a maioria de nós vive. O nosso dia a dia é mais sutil. E neste cotidiano, as mulheres não são vistas como iguais por seus colegas homens.
A mais marcante das condições femininas é a diminuição da mulher como ser pensante e autossuficiente para decidir sobre seu corpo, sua vida e carreira. A condição feminina moderna ainda é marcada pela desumanização da mulher.
Queria poder dizer a mim mesma, ainda jovem, que o feminismo é necessário. Ele nos lembra que as mulheres são menos livres que os homens. O feminismo também nos dá meios para refletirmos sobre nossas escolhas, no meio privado e público, que podem combater estas diferenças, promovendo mulheres, e homens, que busquem um mundo onde todos tenham as mesmas permissões, liberdades e o mesmo respeito.
*PROFESSORA DO INSPER, PH.D. EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DE NOVA YORK EM STONY BROOK