Após dois anos, processos da Kiss ainda estão longe do fim

Complexidade do caso e número elevado de testemunhas a serem ouvidas são motivos para a demora; acusados estão em liberdade

26 jan 2015 - 13h47
(atualizado às 14h24)
<p>Ato na Praça Saldanha Marinho, em Santa Maria, distrubui abraços a familiares das vítimas do incêndio na Boate Kiss, que matou 242 pessoas, na data que marca um ano da tragédia</p>
Ato na Praça Saldanha Marinho, em Santa Maria, distrubui abraços a familiares das vítimas do incêndio na Boate Kiss, que matou 242 pessoas, na data que marca um ano da tragédia
Foto: Luca Erbes / Futura Press

Dois anos após o incêndio da Boate Kiss, em Santa Maria (RS), não há culpados nem punidos pela tragédia. A complexidade do caso, que deixou 242 mortos e cerca de 600 feridos, é o principal entrave para a Justiça.

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Atualmente, o processo criminal está em fase de instrução processual. Nessa etapa, são ouvidas as testemunhas de defesa e acusação. Ao seu final, terão sido ouvidas 74 pessoas. Existem 57 volumes com o total de 12,5 mil páginas redigidas sobre o processo.

Embora tenha sido iniciada em maio de 2014, essa ainda não tem previsão de conclusão.  O juiz responsável pela condução dos trabalhos na comarca de Santa Maria, Ulysses Fonseca Louzada, está em férias e retorna em fevereiro, quando serão retomadas as audiências. As testemunhas serão ouvidas até março deste ano. Uma reconstituição da noite da tragédia não foi descartada pelo juiz.

Após a volta do magistrado, devem ser ouvidas cinco testemunhas, todas referentes à defesa de Elissandro Spohr, sócio da danceteria. Também são processados o outro sócio, Mauro Londero Hoffmann, e os músicos da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos. Todos os acusados por homicídio doloso respondem em liberdade.

Charge mostra o Ministério Público, ao lado do prefeito Cezar Schirmer (PMDB), do Corpo de Bombeiros e de vereadores, calando os protestos por justiça
Foto: Marcelo Becker / Terra

Como não há previsão de finalização dessa etapa de instrução processual, não é possível estipular quando Louzada irá proferir a sentença. Assim, não se pode precisar se e quando os réus vão a júri. Após todas as testemunhas serem ouvidas, também irão se pronunciar os acusados. Concluídas ambas as etapas, o juiz profere a sentença – tal qual ocorre em qualquer processo penal que envolva crime doloso, não apenas no caso da Boate Kiss.

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A sentença de pronúncia não põe fim ao processo. Nela, o juiz decide se existem indícios de crime doloso contra a vida e, por isso, os acusados podem ir ao tribunal do júri. Essa sentença pode ser pela absolvição sumária, pela desclassificação do crime, pela impronúncia, ou pela pronúncia. Caso sejam pronunciados, os réus irão a júri popular. Devido à complexidade do caso, no entanto, a acusação pode apresentar novas provas na fase de instrução.

Outras ações

Além desse processo, outros cinco correm em separado, todos referentes à noite de 27 de janeiro de 2013. São investigados também crimes de falsidade ideológica, fraude processual e falso testemunho, em diferentes esferas criminais. Além disso, correm em separado uma ação civil pública e uma ação coletiva. À parte, foram abertos dois novos inquéritos que investigaram crimes referentes a fraude processual e dano ambiental. 

Amigos e familiares de vítimas pedem por justiça em ato que marcou o 1º ano da tragédia
Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil

As investigações foram concluídas em dezembro de 2014 e houve nova denúncia, dessa vez contra mais 43 pessoas. Algumas destas já haviam sido citadas anteriormente no caso. Ainda em 2013, o juiz determinou a limpeza do interior do prédio, prevendo possíveis reconstituições futuras e também buscando preservar a saúde pública. O local foi higienizado apenas no fim de 2014, após uma série de impedimentos de ordem burocrática.

No universo dos processos que tramitam na esfera cível, encontra-se uma ação civil pública, movida pelo Ministério Público, que denunciou os bombeiros Alex da Rocha Camillo, Altair de Freitas Cunha, Daniel da Silva Adriano e Moisés da Silva Fuchs. Com exceção de Altair, todos os demais também respondem pelo caso na esfera militar. Na ação movida pelo MP, eles são acusados por improbidade administrativa. 

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Uma ação coletiva, originada a partir da Defensoria Pública do Estado, solicitou à Justiça o pagamento de valores referentes às necessidades alimentícias das familiares das vítimas fatais do incêndio e o pagamento de pensão correspondente ao trabalho realizado pelas vítimas antes do incêndio. O Tribunal de Justiça revogou essa ação tendo em vista que os afetados não poderão ser conhecidos antes da liquidação de sentença em 1º grau.

Tragédia em Santa Maria: entenda o incêndio na Boate Kiss

Até agora, apenas quatro pessoas estiveram presas: durante o período de 27 de janeiro de 2013 a 29 de maio do mesmo ano os acusados de homicídio doloso permaneceram encarcerados na Penitenciária Estadual de Santa Maria, mas tiveram a prisão relaxada por apresentarem os requisitos necessários para responder ao processo em liberdade. 

Entenda

Em 22 de março de 2013, a Polícia Civil gaúcha apresentou o resultado do Inquérito Policial referente ao incêndio ocorrido na Boate Kiss, em 27 de janeiro do mesmo ano. Da investigação, que durou 55 dias, resultou o maior inquérito da história da Polícia Civil do Rio Grande do Sul, com aproximadamente 13 mil páginas. A investigação, comandada pelos delegados Marcelo Arigony e Sandro Meinerz, apurou 35 responsáveis pela tragédia, entre os quais estavam proprietários, sócios e gerentes da danceteria, bombeiros e funcionários do município. Destes, 16 foram imediatamente indiciados. 

Mauro Londero Hoffmann, Elissandro Callegaro Spohr, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão foram acusados, à época, de 241 homicídios dolosos qualificados, além de 623 tentativas de homicídio. 

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Incêndio na Boate Kiss

Na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013, um incêndio deixou 242 mortos em Santa Maria (RS). O fogo na Boate Kiss começou por volta das 2h30, quando um integrante da banda que fazia show na festa universitária lançou um artefato pirotécnico, que atingiu a espuma altamente inflamável do teto da boate.

Com apenas uma porta de entrada e saída disponível, os jovens tiveram dificuldade para deixar o local. Muitos foram pisoteados. A maioria dos mortos foi asfixiada pela fumaça tóxica, contendo cianeto, liberada pela queima da espuma.

Os mortos foram velados no Centro Desportivo Municipal, e a prefeitura da cidade decretou luto oficial de 30 dias. A presidente Dilma Rousseff interrompeu uma viagem oficial que fazia ao Chile e foi até a cidade, onde prestou solidariedade aos parentes dos mortos.

Os feridos graves foram divididos em hospitais de Santa Maria e da Região Metropolitana de Porto Alegre, para onde foram levados com apoio de helicópteros da Força Aérea Brasileira (FAB). O Ministério da Saúde, com apoio dos governos estadual e municipais, criou uma grande operação de atendimento às vítimas.

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Quatro pessoas foram presas temporariamente - dois sócios da boate, Elissandro Callegaro Spohr, conhecido como Kiko, e Mauro Hoffmann, e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos. Enquanto a Polícia Civil investiga documentos e alvarás, a prefeitura e o Corpo de Bombeiros divergem sobre a responsabilidade de fiscalização da casa noturna.

A tragédia fez com que várias cidades do Brasil realizassem varreduras em boates contra falhas de segurança, e vários estabelecimentos foram fechados. Cerca de 20 municípios do Rio Grande do Sul cancelaram a programação de Carnaval naquela ano devido ao incêndio.

No dia 25 de fevereiro, foi criada a Associação dos Pais e Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Boate Kiss em Santa Maria com o objetivo de oferecer amparo psicológico a todas as famílias, lutar por ações de fiscalização e mudança de leis, acompanhar o inquérito policial e não deixar a tragédia cair no esquecimento. 

Com informações da GHX Comunicação

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Fonte: Especial para Terra
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