Há meses as pousadas, chácaras e hotéis às margens das represas que formam o Sistema Cantareira estão sofrendo com falta de hóspedes. O problema com a escassez de água em cidades do interior de São Paulo espantou as centenas de hóspedes na região e gerou prejuízo incontável aos bolsos dos empresários e donos desses imóveis. Em Joanópolis, a pouco mais de cem quilômetros da capital paulista e banhada pela represa Jacareí/Jaguari, pousadas já ameaçam fechar as portas por conta da falta de turistas.
Rafael Ribeiro de Vasconcelos, 50 anos, arrendatário da Pousada Bongaville desde novembro de 2013, costumava ver a fazenda lotada. Turistas se hospedavam nos chalés do terreno procurando divertimento com esportes náuticos e descanso com o sossego e silêncio do lugar. Porém, desde o dia 20 de abril, no feriado da Páscoa, nenhum hóspede aparece por lá. Segundo Vasconcelos, os cofres da pousada costumavam receber R$ 100 mil por mês. Nos dias de hoje, além de ter demitido 12 dos 15 funcionários, Rafael não consegue pagar as contas.
“Está acontecendo não só com minha pousada, mas com todas as propriedades em volta da represa. Os turistas estão se afastando. A água não é o único, mas um dos principais atrativos da região, a beleza da água. Usávamos para o ecoturismo, esportes náuticos etc. Várias cachoeiras já não têm mais água”, lembrou. “Já tive turista que veio depois disso. Eles chegaram aqui para procurar esportes náuticos e acabaram indo embora porque eu não pude oferecer isso”, completou Vasconcelos.
Ele conta que, em tempos normais, a água fica 35 metros acima do que está agora. A seca tornou a manutenção da pousada inviável, mas Vasconcelos irá esperar o próximo período de chuva para tentar recuperar o prejuízo. “É incontável. Estamos segurando porque temos uma reserva (de dinheiro). Se não tem turista também não tem renda. É com dor no coração que despedimos funcionário porque sabe-se que é uma família que você está deixando de alimentar. Sabemos que é do nosso suor que sai a alimentação deles”, disse.
Além da falta de água, parte das obras da Sabesp para captação do chamado volume morto é realizada exatamente em frente à Bongaville . “Já tive turistas que vieram aqui e foram embora por causa do barulho das bombas”, disse o arrendatário. Depois disso, uma reclamação realizada por ele fez o barulho melhorar, mas as obras no local continuaram, com a presença de balsas e máquinas.
Crise hídrica
Na semana passada, a Sabesp - responsável pelo fornecimento de água, coleta e tratamento de esgotos em municípios do Estado de São Paulo - reafirmou que o abastecimento está garantido até março de 2015, com autorização e obras para utilização de uma "segunda cota" da reserva técnica do Sistema Cantareira. Essa segunda etapa, de 106 bilhões de litros, do volume morto pode elevar o nível do sistema em 10,7 pontos percentuais, quando começar a ser utilizada.
A primeira etapa de bombeamento, que teve início em maio deste ano, captou 105,5 bilhões de litros do reservatório Jaguari-Jacareí. No fim de agosto, 77 bilhões de litros começaram a ser retirados da Represa Atibainha. De acordo com a Sabesp, foram gastos R$ 80 milhões em obras para abastecimento da população.
São Paulo enfrenta a pior crise hídrica dos últimos 80 anos. Temperaturas mais altas que a média no início do ano aliadas a chuvas fracas no período não recuperaram as represas para o atual período do inverno, quando a pluviosidade normalmente é significativamente menor.
“Ninguém imaginava isso, mas foi muita irresponsabilidade. Há quatro anos, estávamos com 100% da nossa capacidade e a Sabesp, não sei por qual motivo, começou a baixar o nível da água, para evitar enchentes na região", conta Vasconcelos.
José Ricardo Gomes, 77 anos, construiu a Pousada Toca das Maritacas há 25 anos na cidade de Bragança Paulista, que também sofre com o problema da seca da represa Jacareí/Jaguari. “É muito doído ver isso desse jeito. Construí essa pousada do zero e agora ela está assim”, lamentou. Gomes precisou demitir dois de seus cinco funcionários para manter a pousada aberta.
O empresário contou que, principalmente nos finais de semana, turistas estacionavam seus barcos na frente da pousada e consumiam produtos no bar do estabelecimento. Com a represa seca, essa situação já não acontece há meses. “Eu tinha 20 barcos na garagem e aquilo representava cerca de 50% do faturamento e agora não tem nenhum. Calculo ao todo uns 80% de queda mensal no faturamento. A represa era um atrativo. No fim de semana, enchia de barco aqui na frente, mas agora não tem mais nada. Só vai voltar ao normal quando a represa também voltar e isso vai demorar muito. Alguns anos”, disse.