Caso Henry: especialistas alertam sobre como identificar sinais de violência em crianças

Sem o contato com funcionários de creches, escolas ou até mesmo outros familiares durante o isolamento social, as vítimas têm muita dificuldade para fazer as denúncias; adultos fora do ambiente familiar podem ajudá-las.

9 abr 2021 - 08h18
(atualizado às 09h25)
No isolamento e sem o contato com funcionários de creches, escolas ou até mesmo outros familiares, vítimas de abuso infantil têm mais dificuldades para fazer denúncias
No isolamento e sem o contato com funcionários de creches, escolas ou até mesmo outros familiares, vítimas de abuso infantil têm mais dificuldades para fazer denúncias
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

A morte do menino Henry Borel, de 4 anos, no Rio de Janeiro criou um alerta em relação a agressões contra crianças, especialmente durante a pandemia, quando as famílias estão em isolamento social. A mãe e o padrasto do menino, o vereador Dr. Jairinho (Solidariedade), foram presos nesta quinta-feira (8/4) sob a suspeita de atrapalhar a investigação.

O menino foi encontrado morto no apartamento da mãe, com diversas lesões graves pelo corpo. A mãe de Henry e Dr. Jairinho, padrasto do menino, disseram à polícia que o garoto teria sofrido um acidente doméstico no dia.

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Segundo o delegado responsável pela investigação, Henrique Damasceno, hoje o casal é investigado por homicídio duplamente qualificado, por conta de tortura e impossibilidade de defesa da vítima.

Dr Jairinho (saindo do carro) e Monique (à frente na foto), presos nesta quinta, estão sendo acusados de atrapalhar as investigações sobre a morte do filho dela
Foto: Alamy / BBC News Brasil

Sem o contato com funcionários de creches, escolas ou até mesmo outros familiares durante o isolamento social, as vítimas têm muita dificuldade para fazer as denúncias.

A diretora-presidente do Instituto Liberta, Luciana Temer, disse que o afastamento das crianças e adolescentes da escola rompeu o principal canal de denúncias usado por elas para relatar a violência: o professor.

"Dados do Ministério da Saúde dizem que mais de 70% dos casos de abuso infantil acontecem dentro da residência. O professor é um adulto que pode perceber esse tipo de situação, seja por uma marca física, por uma mudança no comportamento ou até mesmo por uma denúncia da criança. Sem ele, hoje essas vítimas estão impossibilitadas de se encontrar com alguém fora do ambiente familiar", afirmou Temer.

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Mas como identificar se uma criança pode estar sofrendo abuso ou sendo violentada?

Sinais

Luciana Temer diz que suspensão das aulas presenciais rompeu o principal canal de denúncias usado por elas para relatar a violência: o professor
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

A Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP) lançou a segunda edição de uma cartilha em parceria com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e o Conselho Federal de Medicina (CFM) chamada Manual de Atendimento às Crianças e Adolescentes Vítimas de Violência. Nela, os especialistas, entre médicos e psicólogos, dão dicas de como identificar possíveis sinais de que uma criança está sofrendo algum tipo de violência.

Um dos principais alertas é uma mudança drástica de comportamento. É quando uma criança agitada passa a ficar mais quieta, acuada. Ou uma criança alegre que se torna triste e até agressiva.

O adulto também deve ficar atento a sinais de agressão aparentes no corpo da criança, como vergões, roxos ou machucados. Os especialistas explicam, porém, que nem sempre as agressões deixam marcas no corpo.

A criança agredida, dizem os especialistas, também pode apresentar alteração no sono, seja ter insônia ou passar a dormir demais, e na alimentação. Neste caso, algumas podem passar a comer por ansiedade, enquanto outras podem se tornar anoréxicas ou desenvolver bulimia.

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Outro possível sinal apresentado por uma criança que sofre violência é apresentar depressão, sinais de baixa auto-estima e deixar de confiar nas pessoas ao redor dela.

Percepção de um adulto

Luciana Temer explica que muitas vezes as crianças precisam contar com a ajuda de um adulto de fora do ambiente familiar para contar suas angústias e fazer denúncias. Essa pessoa também pode monitorar a criança e perceber alguns sinais de violência sem mesmo que a vítima precise contar. Seja dentro ou fora do círculo familiar, é preciso prestar atenção aos sinais dados pelas crianças.

"Eu faço um apelo para que vizinhos e familiares fiquem atentos, na medida do possível, se a criança tiver um comportamento estranho. A família está fechada, mas tem um vizinho que escuta agressões, tem uma tia que tem contato distante e percebe. É um chamado de responsabilidade de todos nós, principalmente quando a criança está mais confinada", afirmou.

Um dos principais alertas de que algo errado pode estar acontecendo é a mudança drástica de comportamento da criança
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Ela disse que não sabe como é possível resolver esse problema de outra forma, mas que o importante neste momento é evitar que ele cresça ainda mais durante o isolamento e que esse aprendizado também se estenda para depois da quarentena.

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"É uma situação muito grave e que não é excepcional da pandemia. Os números da violência são muito assustadores há anos. Precisamos fazer o Brasil falar disso com indignação. Essas situações se naturalizaram porque somos um país machista e o corpo feminino e infantil não são respeitados".

Quem perceber alguma atitude suspeita de abuso infantil pode fazer uma denúncia pelo Disque 100 ou acionar diretamente a polícia pelo 190.

Doutora em direito pela PUC-SP e ex-secretária da Juventude, Esporte e Lazer do Estado de São Paulo, Luciana Temer disse que o ambiente familiar cria uma "relação óbvia de desproteção" para a criança que sofre abuso. Segundo ela, isso é agravado porque a mãe, que em tese deveria proteger a criança também está submetida à violência geralmente cometida pelo marido contra as duas.

A educação da própria criança para identificar uma situação de abuso ou violência também é importante, segundo ela.

Um grupo de artistas, ativistas e outros profissionais lançaram a música "Ninguém Mexe Comigo!" no YouTube para conscientizar crianças e adolescentes de forma lúdica sobre o que pode ser considerado um abuso e como denunciá-lo. A canção, composta pela cantora Bruna Caram foi inspirada no livro infantil Não Me Toca, Seu Boboca, de Andrea Viviana Taubman.

Durante o videoclipe, idealizado pela designer e ativista Paola Bellucci Ortolan, são mostradas ilustrações que ajudam a criança a identificar e relatar um abuso.

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A canção é acompanhada por Marcelo Jeneci na voz e sanfona, Alice Bevilaqua de Castro com violino e conta com a interpretação de libras da Roberta Almeida.

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