SÃO PAULO - Centenas de manifestantes participaram de um protesto na tarde deste domingo, 8, na cidade de São Paulo por justiça no caso Mariana Ferrer e contra a "cultura do estupro" e a violência de gênero. Atos semelhantes também ocorreram em outras capitais, como Fortaleza e Porto Alegre, dentre outras.
A influenciadora digital Mariana Ferrer, de 23 anos, foi humilhada durante audiência judicial que analisava denúncia de estupro registrada por ela. Cláudio Gastão Filho, advogado do acusado, insultou a jovem, a chamou de mentirosa e exibiu fotos sensuais feitas por ela, sem qualquer relação com o suposto crime, falando em poses "ginecológicas".
O defensor foi notificado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Santa Catarina, onde ocorreu o julgamento, para prestar esclarecimentos. Ele diz ter atuado dentro dos "limites profissionais e legais" e afirmou ser comum a dinâmica "acalorada" entre acusação e defesa em audiências.
A manifestação teve concentração a partir das 13 horas, em frente ao Masp, antes de descer a Rua da Consolação, na região central paulistana, com encerramento na Praça Roosevelt por volta das 16 horas, no centro expandido da capital paulista. As duas vias foram parcialmente interditadas para o trânsito de veículos.
Uma das organizadoras do ato, a empresária Gabriela Saraiva, de 21 anos, diz que a maioria das participantes não era ligada a coletivos, organizações e partidos políticos, embora eles também estivessem presentes (com cartazes e faixas, especialmente de candidatas à Câmara de Vereadores). "O ato demonstra o nosso apoio à Mariana e por Justiça", descreve.
Entre as manifestantes, algumas utilizavam instrumentos musicais para dar apoio aos cânticos de protesto. É o caso da empresária Daiane Cristina de Souza, de 27 anos, que levou um tamborim que costuma tocar no bloco que carnaval que participa. Ela veio de Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo, para participar do ato. "Acho que, quando temos um país em que acontece um estupro a cada 8 minutos (segundo o Anuário de Segurança Pública), temos de nos prontificar, vir e dar a cara a tapa", defende.
Também da região metropolitana, de Mogi das Cruzes, a estudante Nina Ribeiro, de 16 anos, estava acompanhada da mãe, a professora Flávia Ribeiro, de 54. A ideia de participar foi da adolescente, que confeccionou três cartazes - um deles com o rosto dos quatro homens que participaram da audiência em que Mariana Ferrer foi atacada pelo advogado.
"É o que a gente pode fazer a respeito, é o justo a se fazer", comenta Nina. Ela diz ter ficado revoltada com o episódio. "Acho que todas as mulheres sentiram como se fosse uma traição contra nós. Viemos para mostrar que não aceitamos mais." A mãe da adolescente concorda. "Acho que ela está se engajando em uma causa que vale a pena a gente se posicionar. De uma forma ou outra, mesmo que demore um tempo, tem que mudar."
A esteticista Francielle Santos Ventura, de 24 anos, também produziu um cartaz, que dizia "Quando um estuprador é inocentado, muitos outros são formados". "Quando uma mulher é estuprada, todas são violentadas. Acho que, a partir do que aconteceu com a Mariana Ferrer, deu um impacto em todas as mulhere, não só em quem já luta pela causa feminista, como todos as outras", disse. Ela veio de Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo, com duas amigas. "Espero que a Justiça seja feita de verdade", acrescenta.
'Eu não sou livre enquanto alguma mulher não for', apontavam cartazes
Entre os cânticos e gritos de protesto, as manifestantes diziam "Se cuida, seu machista, a América Latina vai ser toda feminista", "Feminismo é revolução" e "Vem pra rua, vem, por Mari Ferrer". Críticas ao presidente Jair Bolsonaro e ao vice-presidente Hamilton Mourão também se repetiram.
Nos cartazes, a maioria fazia referência ao caso Mari Ferrer, com frases como "Justiça por Mariana Ferrer" e "Excelentíssimo, nós imploramos por Justiça" (em referência a uma frase semelhante que a influenciadora disse em uma audiência). Outros diziam: "Eu não sou livre enquanto alguma mulher não for"; "Estupro culposo não existe"; "Contra a cultura do estupro"; "Mexeu com uma, mexeu com todas"; e "O estupro veio antes da minissaia"; dentre outros.
Enquanto passavam, as manifestantes ganharam algumas buzinadas e gritos de apoio de motoristas, ciclistas e pessoas que passeavam pela região. Dezenas pararam para tirar fotos e filmar. A maioria das participantes eram mulheres jovens, mas também havia pessoas de outras faixas etárias e homens. Um grupo que estava em frente ao protesto realizou a performance "Un violador en tu camino" (Um violador em seu caminho), criada por um coletivo feminista chileno e que se espalhou por manifestantes em diversos países.
O protesto foi acompanhado pela Polícia Militar. Não foram registrados incidentes, ao menos até por volta das 16 horas, quando o trânsito na Rua da Consolação começou a ser liberado para o tráfego de veículos.