Cidades de diferentes Estados brasileiros passaram a adotar medidas para bloquear o tráfego, em uma tentativa de reduzir o fluxo de pessoas e frear a propagação do coronavírus. Isso ocorreu no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio e São Paulo, onde as medidas consistem desde barreiras para triagem sanitária até bloqueio total de vias com tubos de concreto. Em muitos lugares, no entanto, esse tipo de decisão ainda está em um limbo legal e tem colocado em lados opostos prefeituras e governos estaduais.
Pelo menos dez prefeitos em Santa Catarina determinaram algum tipo de isolamento das cidades por conta dos novos casos de coronavírus registrados no Estado. O governador Carlos Moisés (PSL) disse que as iniciativas não têm respaldo no decreto estadual que declarou quarentena em todo o território catarinense. O Ministério Público interveio e apontou que as medidas ferem o direito de ir e vir, e orientou prefeituras para criações de barreiras sanitárias de triagem.
Em Governador Celso Ramos, o prefeito Juliano Campos (PSB) determinou a retirada de barreiras nas quatro entradas da cidade. Segundo ele, a decisão foi tomada após a Justiça negar obrigação do Estado de oferecer apoio policial para as barreiras. "Eu estava com barreiras há quatro dias sem apoio da polícia. Nós usamos tubos de concretos e postes para fechar as vias. Retiramos porque não tivemos apoio do governo", afirmou.O comandante da Polícia Militar, coronel Araújo Gomes, afirmou que o decreto estadual não prevê isolamento dos municípios e que o governo constrói com o Ministério Público uma saída para as decisões das administrações locais.
"Nas vias municipais as prefeituras são as autoridades, eles podem alterar o fluxo de trânsito, mas não podem bloquear totalmente os acessos aos municípios. O Ministério Público já disse que é ilegal. O que é possível e, aí pode contar com apoio da PM, são as barreiras sanitárias de triagem", explicou.
Em Balneário Camboriú, um dos principais destinos turísticos do Estado e onde foi registrado o primeiro bloqueio de acessos, foram instaladas barreiras nas oito entradas. Após a recomendação do Ministério Público, o prefeito Fabrício Oliveira disse que seguirá com controle sanitário: "Nós temos 135 mil moradores e o maior adensamento do sul do Brasil, mais de 30% de nossos moradores são idosos. A barreira sanitária é necessária, é prerrogativa nossa. Alguns acessos seguem fechados porque não temos capacidade de manter equipes completas em todos os acessos", afirmou.
A prefeitura de Capão da Canoa, no litoral norte gaúcho, anunciou na sexta-feira passada o fechamento de dez das 13 entradas para o município ao justificar à "falta de conscientização das pessoas que entendem que a quarentena é férias". "Infelizmente, algumas medidas drásticas precisam ser tomadas em época de crise. A falta de consciência de pessoas que entendem que a quarentena é férias nos levou a tomar ações como essa. Pedimos que respeitem as orientações pela saúde de todos!", publicou a prefeitura em sua página oficial.
"Temos 13 acessos e apenas três deles estão abertos com monitoramento feito pelo nosso comitê de saúde, identificando cada um para podermos ter maior controle. As blitz vão continuar, sem médicos, mas temos enfermeiros, técnicos de enfermagem, agentes da vigilância sanitária e outros técnicos da área de saúde para passar informações e dar orientações", disse o prefeito Amauri Magnus Germano (PTB) ao Estado.
Medidas como essas, porém, já foram criticadas pelo governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite. "O governo está proibindo que os municípios fechem os seus acessos. Esse tipo de restrição de circulação é algo inadequado e que extrapola a competência dos prefeitos. Esse novo decreto também reforça as nossas ações de enfrentamento ao coronavírus no que diz respeito à atividade econômica. Estamos garantindo que não haja desabastecimento e que os serviços essenciais continuem funcionando", afirmou.
Rio enfrenta resistência federal
Municípios fluminenses montaram barreiras e fecharam entradas neste sábado, 21, numa tentativa de reduzir a circulação de pessoas e a disseminação do coronavírus. As ações ocorreram em meio a uma disputa entre o governo federal e governos regionais sobre medidas de Estados e municípios para tentar restringir a circulação de pessoas e bens.
O governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), determinou esta semana em decreto a suspensão de transporte interestadual e aéreo de passageiros, afetando a ligação com alguns estados e voos internacionais. O governo federal rebateu informando que o fechamento de aeroportos ou a suspensão do transporte nas estradas só podem determinados pela União.
Segundo a Polícia Rodoviária Federal, policiais militares realizavam interdições parciais nos acessos à ponte Rio-Niterói neste sábado para impedir o tráfego de táxis, vans, Uber e ônibus com destino ao Rio de Janeiro. Eram liberados apenas os táxis que operam no município do Rio. Pela manhã, a Polícia Militar também realizava bloqueio na Avenida Brasil, no bairro do Caju, na descida da ponte.
No município de Rio Bonito, a prefeitura montou bloqueios nos acessos à rodovia BR-101, mas foram removidos à tarde por agentes da Polícia Rodoviária Federal com apoio de um trator da concessionária que opera no local.
Em Silva Jardim, na altura do quilômetro 239 da BR-101, uma equipe da prefeitura bloqueava a entrada da cidade com um veículo e cones. Em Volta Redonda, a guarda municipal fazia operação de fiscalização para restringir a entrada de coletivos na cidade.
Na região serrana, o prefeito de Teresópolis, Vinicius Claussen, determinou o fechamento de todas as entradas da cidade, permitindo apenas a circulação de profissionais de saúde, agentes da força de segurança, trabalhadores de concessionárias e equipes de logística.
"Fecharemos também todo o comércio, bares, restaurantes, hotéis, onde só estarão permitidos funcionamento de mercados, farmácias, postos de gasolina e depósitos de gás", disse Claussen em vídeo publicado nas redes sociais. "De acordo com orientações do secretário estadual de saúde (Edmar Santos), com essa parada urgente, conseguiremos em 15 dias diminuir o avanço do contágio e aí sim ter o nosso sistema de saúde a capacidade de manter os casos, cuidar das pessoas e salvar vidas", completou.
Medidas atingem praias e contam com ajuda de alto-falantes
Desde terça-feira, 17, quando entrou em vigor a determinação para fechamento de estabelecimentos não essenciais e proibição de transporte coletivo, posteriormente estendida também para proibição de pessoas em locais públicos como praias e parques e na entrada de ônibus e vans nas divisas, foram realizadas pelo menos 5.200 intervenções, que geraram ao menos 80 termos circunstanciados em Santa Catarina. Um casal, que estava na praia de Canasvieiras, em Florianópolis, foi abordado por infringir determinação para impedir a propagação da doença.
Na capital gaúcha, viaturas da Guarda Municipal e do Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), órgão de trânsito da cidade, vêm aumentando a circulação com alto-falantes para afugentar aglomerações de pessoas em ruas do Centro e em bairros da cidade. A determinação é do prefeito Nelson Marchezan Júnior e deverá se intensificar no entorno de parques e Orla do Guaíba neste final de semana para evitar aglomeração de pessoas.
Vias em São Paulo foram bloqueadas, mas liberadas no mesmo dia
As três principais rodovias de acesso ao litoral norte do Estado de São Paulo tiveram bloqueios da Polícia Rodoviária Estadual, na manhã deste sábado, 21, para impedir a passagem de turistas em direção às praias. As blitzes aconteciam nas rodovias Rio-Santos, Tamoios e Oswaldo Cruz. Só veículos de emergência, prestadores de serviços essenciais e moradores de cidades da região, como São Sebastião, Ubatuba e Caraguatatuba, eram liberados para seguir viagem. Carros com turistas eram obrigados a fazer o retorno.
O governo informou na noite deste sábado que as vias foram liberadas após recomendação da Procuradoria-geral do Estado aos policiais rodoviários. A gestão do governador João Doria disse não ter sido notificada da decisão para o bloqueio. Os bloqueios, que eram temporários, tinham sido determinados pela Justiça, a pedido do Ministério Público estadual, após a decretação de estado de emergência na região devido ao coronavírus.