Covas afirma que aumento de casos de covid-19 entre classes A e B na capital paulista preocupa

Prefeito disse que resultados já tabulados de inquérito sorológico feito entre adultos, a ser divulgado na semana que vem, mostrou aumento de 56% da doença na região oeste; prevalência em outros estudos mostrava concentração na periferia

11 set 2020 - 15h34
(atualizado às 20h48)

Em coletiva de imprensa ao lado do governador João Doria (PSDB), o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB) afirmou nesta sexta-feira, 11, que dados do quinto inquérito sorológico em adultos, que deverá ser divulgado na semana que vem, traz um dado novo e preocupante. De acordo com o prefeito, resultados já tabulados mostram um aumento de 56% de prevalência do novo coronavírus em adultos das classes A e B na região oeste da capital.

"Alguns números estão sendo tabulados e deixam a secretaria municipal da Saúde e a Prefeitura preocupadas, como o aumento de 56% no número de pessoas com coronavírus nas classe A e B", disse Covas. "Essa foi uma doença que começou na região central, depois atacou em especial a periferia, e todos os inquéritos sorológicos mostram prevalência maior nos bairros de menor IDH. Mas esse dado tabulado traz esse aumento de 56% na região oeste da capital. Mas isso será apresentando na próxima semana", disse.

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O prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), em entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes
O prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), em entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes
Foto: Divulgação/Governo do Estado de SP / Estadão

O secretário municipal de Saúde, Edson Aparecido, destacou que o aumento não é restrito à zona oeste. "São nas áreas com o IDH mais alto. Vila Mariana, Pinheiros, Moema, Mooca, Santana e Morumbi são alguns dos distritos (que tiveram aumento)", disse. Os crescimentos nesses locais variam entre 53% e 56%. A alta foi calculada com base nos dados coletados na primeira semana de setembro em comparação com a fase interior do inquérito, realizado em meados de agosto.

Para o secretário, a alta está acontecendo na população que conseguiu fazer melhor o isolamento social durante o auge da pandemia, mas que agora está saindo às ruas, no comércio, em bares e restaurantes, e está sendo infectado.

Aparecido destaca que o dado não é indicativo de uma segunda onda iminente. "Esse aumento é em uma forma como a que ocorreu no começo da pandemia". Além disso, ele afirma que o aumento não foi detectado a partir de uma procura maior por atendimento médico, mesmo na rede particular, por pessoas com sintomas da covid, mas sim resultado da pesquisa que a Prefeitura vem fazendo há dois meses, para acompanhar a evolução da doença na população. "É o número de pessoas que tiveram contado com o vírus, mesmo assintomáticas".

Os hospitais Sírio-Libanês e São Luiz do Morumbi afirmaram que, de fato, não registraram aumento de procura de pacientes com sintomas de covid. Eles disseram que a demanda se mantém estável nas últimas quatro semanas. O Hospital Albert Einstein também foi procurado, mas não respondeu.

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Por ora, os técnicos da Prefeitura de São Paulo não estudam retroceder em nenhuma das medidas de abertura econômica já adotadas por causa desses dados. A atenção, disse Aparecido, está agora no resultado de outro estudo, um inquérito sorológico escolar. O resultado das duas pesquisas pode impactar em uma nova revisão sobre as decisões sobre volta às aulas. "Especialmente porque nessas regiões de IDH mais alto, as escolas particulares querem voltar", disse.

Especialistas veem relação com reabertura e falta de cumprimento de medidas

Por mais que a flexibilização da quarentena esteja sendo gradual, especialistas ouvidos pelo Estadão consideram que o comportamento humano pode ser um dos responsáveis por esse crescimento

O pesquisador Vitor Engrácia Valenti, professor livre-docente na Universidade Estadual Paulista de Marília, aponta a flexibilização precoce e intensa da quarentena como possível fator relacionado a esse crescimento. "Houve aumento na mobilidade das pessoas em agosto, quando as regras foram mais flexibilizadas e bares e restaurantes, mais frequentados. A população com condição socioeconômica mais favorecida pôde ir com mais frequência a esses ambientes e, por se aglomerar bastante, essa pode ser a principal variável envolvida com esse aumento", diz.

Ele avalia que a flexibilização pode passar a falsa impressão de que a pandemia está sendo controlada. "Se essas medidas são realizadas de modo muito intenso ou descuidado, pode causar novos surtos. Os casos podem demorar mais para se estabilizar, ou não cair ou aumentar um pouco em outubro por conta do feriado de 7 de setembro."

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Além de desrespeitar o distanciamento social, as pessoas devem ter relaxado nas medidas preventivas, segundo Valenti. "No Japão, por exemplo, se uma pessoa pega um resfriado, ela já põe máscara e evita aglomeração. Aqui, por não estarmos habituados, é difícil efetivar essas medidas, usar máscara adequadamente. Podemos até ter um segundo surto."

O infectologista e epidemiologista Carlos Magno Castelo Branco Fortaleza, membro do Comitê de Contingência da Covid-19 do Estado de São Paulo, considera que esse crescimento apontado por Covas segue um percurso visto em outros países. "Agora, vemos pequenos movimentos dentro da grande tendência da covid. Durante esses pequenos movimentos, grupos populacionais específicos que relaxaram muito as medidas de afastamento social têm aumento súbitos", explica.

Porém, ele não encara esse aumento nas classes altas como uma grande tendência, mas, sim, "uma pequena tendência dentro do vetor". Segundo ele, todos esses pequenos movimentos são naturais, porque decorrem do comportamento das pessoas, da adesão às medidas preventivas. "Às vezes, uma pequena abertura de duas horas em um bar se torna um rombo, significa milhares de pessoas aglomeradas. A gente tem tentado lidar com isso com informação."

O médico observa que a covid-19 tem diminuído no Estado de São Paulo, especialmente na capital, mas isso não representa uma situação que, segundo ele, permite uma fala triunfalista. "Entendo que o Covas falou desse aumento como como alerta", diz Fortaleza. Sobre se a flexibilização ocorreu de forma precoce, ele afirma que essa discussão, mesmo que se faça uma análise detalhada, não tem resposta pronta.

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"A gente avalia epidemiologicamente cada setor, mas sempre pensa que se a situação piorar, o setor volta a ser fechado. Com essa possibilidade, vai fazendo ajuste. Não é algo matemático e exato porque o comportamento humano não é matemático. Tudo tem sido feito com imenso cuidado. O que o Covas fala pode apontar para uma nova tendência de crescimento relacionada ao relaxamento das medidas individuais de cuidado. Ele alerta porque, se a tendência continuar, pode se tornar nova corcova na curva do vírus", diz.

Inquéritos anteriores mostraram 'hotspots' na periferia

Os resultados dos últimos inquéritos sorológicos feitos pela Prefeitura sempre mostraram uma prevalência da doença em bairros mais centrais e periféricos. No primeiro resultado divulgado, por exemplo, a taxa de infecção variava. Na zona leste, a doença havia atingido a 12,5% dos moradores. Na zona sul, a 7,5% da população.

Depois, essa taxa foi maior na zona sul, com 11% e foram considerados 'hotspots', onde houve maior concentração de testes positivos, bairros como Brasilândia, Cachoeirinha, Jaçanã, Liberdade, Santa Cecília, Cidade Ademar, Jardim São Luis, Campo Limpo, Capão Redondo, Parque São Lucas, Sapopemba, Itaim Paulista, Itaquera e Lajeado.

Na divulgação dos resultados de uma nova etapa, no final de julho, Covas afirmou que os principais fatores associados à doença seguiam relacionados à pobreza e vulnerabilidade social, como baixa escolaridade, menor renda e maior número de moradores em um mesmo domicílio. "O vírus está jogando luz sobre a desigualdade que nós temos na cidade de São Paulo. É quatro vezes maior a incidência do coronavírus na classe D do que na classe A. Quem é mais pobre tem mais chance de pegar o vírus", disse, na ocasião.

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Na divulgação dos resultados da quarta fase, o inquérito mostrou que pessoas das classes D e E tinham três vezes mais chance de ter a doença do que as das classes A e B.

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