Escritórios de advocacia demitem estudantes da PUC que ofenderam alunos da USP

Entre os gritos proferidos durante os Jogos Jurídicos estavam 'pobre' e 'cotista'; reportagem não conseguiu localizar a defesa dos alunos

18 nov 2024 - 20h18
(atualizado às 23h29)

Após a divulgação de vídeos que mostram estudantes de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) ofendendo alunos da Universidade de São Paulo (USP), durante os Jogos Jurídicos realizados no último final de semana, alguns dos identificados foram demitidos de escritórios de advocacia onde estagiavam. Os estudantes da PUC gritavam falas como "pobre" e "cotista" para os alunos da USP. A reportagem não conseguiu localizar a defesa dos alunos.

Arthur Martins Henry, que foi filmado gritando palavrões, foi demitido do Castro Barros Advogados, que tem escritórios em São Paulo, Rio e Distrito Federal. "Informamos que o estagiário envolvido no lamentável ato discriminatório praticado neste fim de semana, tendo como vítimas estudantes da USP, não integra mais o Castro Barros Advogados. O escritório repudia quaisquer práticas discriminatórias", afirmou, em nota.

Tatiane Joseph Khoury, que foi filmada gritando "ainda por cima é cotista", também foi demitida do Escritório Pinheiro Neto. "O escritório lamenta o episódio ocorrido no último sábado e reitera que não tolera e repudia racismo ou qualquer outro tipo de preconceito. Informamos que a estagiária envolvida nesse episódio não integra mais o escritório", informou.

Outra aluna da PUC também identificada nos vídeos, Marina Lessi de Moraes teve sua demissão confirmada pelo Escritório Machado Mayer. "O Machado Meyer Advogados comunica que, alinhado com os seus valores institucionais e o seu compromisso inegociável com a promoção de um ambiente inclusivo e respeitoso, decidiu pelo desligamento da estagiária envolvida no episódio do último final de semana nos Jogos Jurídicos."

Nesta segunda-feira, 18, a Faculdade de Direito da PUC abriu uma comissão para avaliar a continuidade dos estudantes na instituição. O prazo para a comissão apresentar o resultado das apurações é de 40 dias.

A PUC-SP disse que irá apurar os fatos e que "repudia com veemência toda e qualquer forma de violência, racismo e aporofobia, e lamenta profundamente o episódio ocorrido em 16/11, envolvendo um grupo de estudantes do curso de Direito da nossa Universidade nos Jogos Jurídicos de 2024?.

"Manifestações discriminatórias são vedadas pelo Estatuto e pelo Regimento da Universidade, além de serem inadmissíveis e incompatíveis com os princípios e valores de nossa Instituição. A Reitoria determinou à Faculdade de Direito a apuração dos fatos, com o rigor necessário, a partir das normas universitárias e legais, promovendo a responsabilização e conscientização dos envolvidos", completou.

A Federação Nacional de Estudantes de Direito (Fened) e o Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, emitiram uma nota afirmando que estão articulando, junto a outras entidades jurídicas e do movimento negro, a responsabilização criminal dos autores dos atos discriminatórios. "Não podemos permitir que atitudes como essas continuem a se repetir sem as devidas consequências, pois são o reflexo de uma sociedade que ainda marginaliza os corpos negros e pessoas provenientes de grupos historicamente oprimidos", dizem.

As entidades também chamam a atenção para a coordenação dos Jogos Jurídicos de São Paulo para que "tomem as medidas necessárias e urgentes a fim de que os envolvidos nesse episódio de racismo e elitismo sejam devidamente punidos".

Estudante diz que racismo é presente no dia a dia

O episódio deste final de semana, com frases explícitas de cunho racista e elitista direcionadas a alunos negros da USP, não é algo frequente, segundo a estudante de Direito da PUC Fernanda Ferreira, que participou dos Jogos Jurídicos deste ano e do ano anterior. Ela não estava no jogo de handebol, em que o episódio aconteceu, mas afirma não ter conhecimento de cenas com xingamentos tão explícitos. "Não tinham acontecido antes, ou se aconteciam ninguém filmou", diz.

No entanto, o preconceito contra cotistas e racismo é presente no dia a dia da universidade, ela afirma. "A gente sente nos olhares, comentários", diz a estudante, que conta já ter passado por episódios de discriminação "implícitos" por ser bolsista. Ela relata ainda um episódio de constrangimento contra uma professora negra da PUC por alunas.

A PUC-SP afirma que promove a inclusão social e racial, por meio de programas de bolsas na graduação e na pós-graduação, bem como de permanência dos estudantes bolsistas. "Na atual gestão da reitoria, foram incluídos letramento racial na formação dos docentes e, principalmente, foi implementado programa de ação afirmativa para contratação exclusiva de docentes negros até que atinjam o número correspondente ao percentual da população negra em São Paulo definida pelo IBGE", diz a universidade.

A aluna lamenta, porém, que as disciplinas de estudos de classe, gênero e raça são optativas. "Não é uma matéria obrigatória na grade. Para além de pensar em expulsão, seria importante colocar essas matérias como obrigatória e ter mais docentes negros", diz. / COLABOROU CAIO POSSATI

Publicidade
Fique por dentro das principais notícias
Ativar notificações