Especialista alerta para importância de equipamentos de segurança em protesto

Cinegrafista da Band, gravemente ferido por um artefato explosivo em protesto no Rio, não usava capacete, que amenizaria o impacto

7 fev 2014 - 16h14
(atualizado às 18h13)
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Cinegrafista da Band ficou ferido depois que uma bomba estourou ao lado dele
Foto: Daniel Ramalho / Terra

"Vocês, jornalistas, precisam entender que para ser repórter de guerra, hoje, não é preciso mais pegar um avião e ir para outro país. A área de conflito é o que todos nós vivemos aqui hoje, no Brasil e no Rio de Janeiro." A afirmação de Théo Toscano, especialista em artigos explosivos do Centro Conjunto de Operações de Paz (CCopab), do Exército, é um alerta que ficou mais do que evidente, após o rojão que feriu gravemente o cinegrafista da TV Bandeirantes Santiago Andrade, na manifestação de quinta-feira, no centro do Rio de Janeiro. 

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Andrade registrava imagens em frente à Central do Brasil, posicionado entre polícia e manifestantes, e não usava capacete, máscara de gás, ou qualquer outro aparato de segurança que o pudesse proteger de pedras, bombas de gás ou, no caso, do rojão que, ao ser aceso por um suposto manifestante ou policial à paisana, se dirigiu justamente para a região da sua orelha esquerda. Após ser operado nesta madrugada, ele segue internado no hospital municipal Souza Aguiar, também no centro do Rio, em estado muito grave. 

Por mais que o manifesto contra o aumento da passagem de ônibus não tenha contado com o uso de armas letais, como é de praxe em operações em comunidades do Rio, por exemplo, ainda assim, alega o especialista, o uso destes equipamentos é de fundamental importância para todos os envolvidos: policiais, manifestantes e jornalistas. 

"O ideal para todos é usar o mesmo capacete que os soldados da ONU utilizam, capaz de segurar até um tiro. Mas se ele estivesse usando um capacete, sei lá, de motoqueiro, por exemplo, com certeza amenizaria os impactos que ele sofreu", explicou. Ele salientou ainda que cada uma dessas proteções para a cabeça tem um nível de segurança de acordo com cada tipo de situação de conflito.  

"Mas esses capacetes de obra, por exemplo, de nada adiantam", alertou ainda. "Vocês têm que entrar equipados. Virou algo muito parecido com guerra civil. Isso vai fazer total diferença para a cobertura", completou. O Terra providencia a seus funcionários nestas ocasiões capacetes e máscaras de gás. 

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Toscano explicou ainda a dinâmica do que ocorreu com o cinegrafista da TV Bandeirantes. Após analisar todas as imagens divulgadas por diversos veículos de imprensa, inclusive no portal Terra, ele chegou a conclusão de que, sim, tratou-se de um artefato explosivo artesanal e que o forte deslocamento de ar, com a proximidade do estouro, foi determinante para a gravidade do caso. 

"Quando você tem algo que explode, a parte física é empurrar o ar. É a mesma coisa que você fechar o saco de pipoca e estourá-lo. Se esse deslocamento de ar for muito forte, ele machuca. Você tem partes que são mais sensíveis, como o tímpano e orelha. Pode causar danos sérios", enfatizou. "Esse artefato me lembrou a Guerra das Espadas da cidade de Cruz das Almas, onde já morreu gente e a imprensa já cansou de cobrir. É o mesmo tipo de artefato", complementou. 

A Guerra das Espadas é um festejo junino tradicional da cidade baiana, e também da capital Salvador, mas que desde 2011 é proibida pelo Tribunal de Justiça da Bahia. Ainda assim, ano passado, uma pessoa morreu e quatro ficaram feridas. "Todos vocês têm que aprender a andar no lugar, não mexer nas coisas e prestar atenção em tudo. Se acharem algo no chão, não mexam, pois aquela artefato pode estar esperando você tocar para explodir. E se equipem sempre", finalizou Toscano. 

Ao Terra, a assessoria de imprensa da TV Bandeirantes enviou um posicionamento oficial sobre a falta de equipamento de segurança do profissional no momento da explosão: "Nossos cinegrafistas usam, normalmente, colete à prova de balas, durante coberturas em áreas de conflito, como, por exemplo, quando acompanham ações policiais em regiões consideradas inseguras. Eles recebem também treinamento adequado para esse tipo de cobertura. No final do ano passado, nossa equipe, inclusive o cinegrafista Santiago Andrade, frequentou um curso orientado por especialistas do Exército. Um dos focos do curso foi exatamente sobre segurança na cobertura de manifestações. Assim, no episódio da Central do Brasil, Santiago estava postado a uma certa distância dos pontos de confronto, quando jogaram o artefato que o atingiu pelas costas. E trabalhava nas mesmas condições em que os cinegrafistas normalmente cobrem eventos como aquele. Mas estamos ainda apurando todos os detalhes que envolvem o procedimento."

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Santiago participou do último curso do Exército para jornalistas em área de conflito ao lado do fotógrafo do Terra Mauro Pimentel. Em novembro de 2011, um cinegrafista da Bandeirantes morreu durante uma operação policial na favela de Antares, em Santa Cruz, zona oeste do Rio de Janeiro. Gelson Domingos foi atingido por uma bala perdida durante a ação que envolvia homens do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e do Batalhão de Polícia de Choque (BPChq). A presidente Dilma Rousseff prestou solidariedade ao profissional.

Por um triz

Na ocasião em que o artefato explode rente ao rosto do cinegrafista Santiago Andrade, a repórter Fernanda Corrêa, companheira de Andrade na TV Bandeirantes, se abrigava no carro da emissora diante do conflito instalado. Por questão de minutos, porém, ela não correu o sério risco de ser ela a atingida.

"Muito pouco antes de tudo acontecer, ele me chamou para gravar uma passagem (parte em que o jornalista narra os fatos presencialmente para a câmera). Eu me posicionei, e as bombas começaram a explodir. Disse para ele que a situação estava perigosa e que era melhor a gente sair dali. Ele me disse 'vai indo', e ficou para registrar mais um pouco antes de ir", contou a repórter ao Terra, antes de prestar depoimento sobre o caso.

"Foi coisa de um minuto depois. Vi aquele clarão, o estrondo da bomba e dos estilhaços batendo no carro. Vi que tinha alguém caído no chão. Mas continuei me protegendo no carro. Só quando um colega veio meio dizer que era o Santi, que eu saí e enlouqueci com a cena", contou ainda, abalada, assim como todos os funcionários da emissora. 

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Santiago portava uma câmera de grande porte, ao contrário da maioria dos equipamentos que outros profissionais de imprensa utilizam, mais compactos, muitas vezes acopladas a capacetes, e que dão maior mobilidade ao jornalista no momento em que alguma confusão ocorre e é preciso um refúgio. 

Um cinegrafista de uma grande emissora, que não quis se identificar, explicou que essas câmeras grandes, com suporte no ombro, "tiram praticamente toda a sua visão periférica. Por isso que a gente praticamente só usa Go Pro (micro-câmera) e handcam (câmera de mão)". 

Sindicato

O Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro responsabilizou nesta sexta-feira o Estado por omissão no caso da agressão ao repórter cinematográfico da TV Bandeirantes. Para a presidente do sindicato, Paula Mairán, embora a emissora tenha que ser responsabilizada pelo ocorrido, é tarefa do Estado fiscalizar os canais de TV, que são serviços públicos, e assegurar a proteção aos jornalistas.

"Estamos, desde o ano passado, apontando a falta de políticas públicas para garantir o exercício do jornalismo em segurança. Entre elas, a responsabilidade da autoridade de segurança pública e das empresas", disse. Segundo Paula, jornalistas continuam sendo enviados às ruas sem equipamentos de proteção e em condições de vulnerabilidade.

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Com informações da Agência Brasil.

Fonte: Terra
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