Potencial subterrâneo é alternativa à escassez de água

4 nov 2014 - 08h45
(atualizado às 08h47)
Foto: Eco Desenvolvimento

A crise hídrica sem precedentes que atinge o Estado de São Paulo pode ser amenizada com a exploração sustentável de águas subterrâneas. É o que defende o doutor em Geociências Bruno Conicelli, pesquisador do Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas da Universidade de São Paulo (USP).

Desde o início do ano, a falta de chuvas vem fazendo despencar o nível dos principais reservatórios utilizados para o abastecimento público. No Sistema Cantareira, o índice de 12,8% registrado na quarta-feira, 29, era três vezes menor do que o percentual do mesmo dia em 2013, quando marcou 37,4%. A situação se repete nos demais pontos de captação, como no Alto Tietê e  na represa Guarapiranga.

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Para Conicelli, o que ocorre em São Paulo reflete uma tendência em regiões metropolitanas densamente povoadas. Ele avalia que cenários de escassez hídrica vão se repetir, seja pela falta de qualidade dos recursos disponíveis ou pelo agravamento dos eventos climáticos extremos, como as estiagens prolongadas.

“Devemos ter em mente que cada gota de água disponível é importante, portanto aspectos como a redução do consumo, reuso de água, aproveitamento de água da chuva, cobrança pelo uso da água e gestão do território, dentre outros, devem ser pensados de forma integrada”, sugere Conicelli.

Conforme o pesquisador, o papel da água subterrânea em tempos de escassez hídrica é ainda mais estratégico, pois os aquíferos podem dispor de água por longos períodos, mesmo em tempos prolongados de estiagem. Além disso, ele destaca a vulnerabilidade à contaminação das fontes superficiais. “A demanda por água de qualidade cresce à medida que a população aumenta e o país se desenvolve”, alerta.

Água subterrânea: como explorar

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As águas subterrâneas, contudo, também não estão livres de contaminação, e essa é uma das principais preocupações quanto a sua exploração em larga escala. Conicelli afirma que, como ocorre com qualquer recurso renovável, é preciso seguir uma série de regras e metodologias para garantir o seu uso sustentável: com disponibilidade ao longo do tempo e sem afetar sua qualidade.

Para se perfurar poços tubulares, por exemplo, é preciso obter outorga pelo órgão gestor, assegurando o controle quantitativo e qualitativo dos usos da água. Também se deve observar o perímetro imediato de proteção, não perfurar próximo de rios poluídos ou fontes potenciais de poluição e realizar o monitoramento da qualidade das águas, além de tamponar poços desativados para evitar que se tornem caminhos de contaminação.

Entraves para a exploração

O uso das águas subterrâneas para o abastecimento publico em larga escala só é viável se os aquíferos forem bons “produtores” de água. O problema, conforme Conicelli, é que os reservatórios da Região Metropolitana de São Paulo não permitem que poços explorem uma grande vazão.

“Esse fator inibe que as concessionárias explorem as águas subterrâneas de forma intensa, fazendo isso de maneira localizada somente onde a rede superficial não alcança. As águas subterrâneas na região são utilizadas basicamente por usuários privados”, explica.

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Em sua análise, uma alternativa a ser considerada é a complementaridade entre as águas subterrâneas e superficiais. Para tanto, defende que haja planejamento, preparando as cidades e as atividades econômicas para o aumento gradual do uso da água subterrânea.

“Em muitos casos, a gestão integrada das duas manifestações do mesmo recurso hídrico tem que ocorrer sob pena de colocar em risco a segurança hídrica ou o encarecimento econômico, social e ambiental dos produtos associados à água”, opina.

O pesquisador considera que o custo vem caindo e não é impeditivo para a exploração dos reservatórios subterrâneos. Cita, inclusive, que as águas subterrâneas geralmente tem um valor final menor que fontes regulares de água superficial, pois não necessitam de tratamento - embora sejam menos competitivas em razão da baixa vazão.

“O recurso subterrâneo é excelente para o abastecimento de médias e pequenas cidades e, eventualmente, grandes cidades, mas isso é raro”, diz. “Estimamos que mais de 50% das cidades brasileiras têm seus abastecimentos públicos feitos de forma total ou parcial por fontes subterrâneas”, acrescenta.

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O que são as águas subterrâneas

A água subterrânea é um recurso que está presente em uma unidade geológica, constituída de rocha ou sedimento e suficientemente permeável para permitir a extração de forma econômica e por meio de técnicas convencionais. Os chamados “aquíferos” possuem capacidade de armazenar uma grande quantidade de água, mas de transmiti-la de forma lenta, explica Conicelli. O Aquífero Guarani é a maior reserva de água subterrânea da América do Sul e 70% de sua área se localiza no Brasil - ocupando 9,9% do território nacional.

O pesquisador estima que haja pelo menos 416 mil poços no País, com um incremento anual de 10,8 mil novas captações, atendendo a até 40% da população. Somente no estado de São Paulo, dos 645 municípios, 462 (71,6%) são abastecidos total ou parcialmente com água subterrânea, incluindo cidades de médio a grande porte, como Marília, São José dos Campos e São José do Rio Preto.

Sabesp garante água até março de 2015

Em nota, a Companhia de Saneamento Básico de São Paulo (Sabesp) alega que a crise hídrica tem origem no calor recorde e na inédita falta de chuvas -  a maior em 84 anos. A empresa informa que as medidas adotadas em resposta ao quadro garantem o abastecimento até março de 2015.

Um bônus gradual para clientes entra em vigor no próximo sábado, dia 1º: quem economizar de 10% a 15% de água, terá desconto de 15%; entre 15% e 20%, desconto de 20% e, por fim, quem economizar acima de 20%, terá um desconto de 30%.

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Desde 15 de maio, foram utilizados no abastecimento público 182,5 bilhões de litros de água da reserva técnica das represas Jaguari/Jacareí e Atibainha. A Sabesp já tem a autorização de uso de mais 105 bilhões de litros, se necessário.

Também ocorreu a transferência de vazões dos sistemas Alto Tietê, Guarapiranga, Rio Claro e Rio Grande para atender áreas originalmente abastecidas pelo Cantareira - com maior participação dos sistemas Rio Grande e Guarapiranga a partir de outubro.

Já sobre a adoção de racionamento, a companhia entende que a medida penalizaria a população. “Os esforços feitos pela população e pela Sabesp até o momento equivalem à economia que se obteria com um rodízio de 36 horas com água por 72 horas sem água”, finaliza a nota. 

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A crise no sistema Cantareira

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