O Dia da Independência prometia terminar pacífico em Salvador, mas o cenário mudou no final de tarde deste sábado. As manifestações começaram no final da manhã com a já tradicional Marcha dos Excluídos, após o desfile cívico de corporações militares e escolas percorreu o trecho entre o Campo Grande e a Praça Municipal. Por volta das 16h, cerca de 200 participantes da Operação Sete de Setembro, autointitulada “o maior protesto da história do Brasil”, e disposta a lutar por “mudanças que beneficiem o povo de forma geral”, entraram em confronto com policiais militares na avenida Joana Angélica, por onde passavam rumo ao Dique do Tororó. Onze mil pessoas haviam confirmado presença na Operação.
Parte das cerca de 200 pessoas que integravam a caminhada fugiu para as regiões da Barroquinha e Politeama, e outros começaram o quebra-quebra que terminou com um número ainda não divulgado de presos na 1ª Delegacia de Polícia, no Vale dos Barris.
Durante a manhã, as manifestações haviam sido fracas por causa da chuva que caía na cidade. O Grito dos Excluídos, coordenada pela Pastoral da Juventude da Igreja Católica, carregou bandeiras com o tema “Juventude que luta constrói o Projeto Popular”, e falou contra a violência contra os jovens no País. Também estiveram presentes membros do Movimento Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento dos Sem Teto de Salvador (MSTS), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Frente Popular de Luta (FLP), entre outros.
Logo à frente da marcha estava a família do garoto Joel da Conceição Castro, assassinado dentro de casa por policiais militares em novembro de 2010. A última audiência de instrução do caso aconteceu no dia 5 de setembro, com o depoimento dos acusados, e a previsão da Justiça baiana é que o júri popular seja marcado para novembro deste ano.
Os integrantes do Movimento Passe Livre (MPL) em Salvador prometeram se juntar ao protesto, mas menos de 20 pessoas compareceram. De acordo com um membro do grupo, que preferiu não se identificar, a adesão foi pequena porque muitos companheiros foram detidos para averiguação na noite de sexta-feira e ainda hoje pela manhã. “Não havia justificativa. Foram presos porque portavam tinta em spray nas mochilas. Isso é um jeito de nos enfraquecer, mas estamos indo para a delegacia cobrar uma resposta”, relatou, pedindo para não se identificar.
A PM afirmou desconhecer a Operação Sete de Setembro, e apenas seis militares acompanhavam a chegada dos manifestantes. Mais tarde, entretanto, dezenas de PMs do 18º batalhão e alguns da Companhia de Ronda e Operações Especiais (Rondesp) se juntaram ao policiamento. Durante o confronto, foram destruídos pontos de ônibus, dois coletivos foram depredados e um incendiado, e vidraças de bancos e lojas foram quebradas.
Protestos contra tarifas mobilizam população e desafiam governos de todo o País
Mobilizados contra o aumento das tarifas de transporte público nas grandes cidades brasileiras, grupos de ativistas organizaram protestos para pedir a redução dos preços e maior qualidade dos serviços públicos prestados à população. Estes atos ganharam corpo e expressão nacional, dilatando-se gradualmente em uma onda de protestos e levando dezenas de milhares de pessoas às ruas com uma agenda de reivindicações ampla e com um significado ainda não plenamente compreendido.
A mobilização começou em Porto Alegre, quando, entre março e abril, milhares de manifestantes agruparam-se em frente à Prefeitura para protestar contra o recente aumento do preço das passagens de ônibus. A mobilização surtiu efeito e o aumento foi temporariamente revogado. Poucos meses depois, o mesmo movimento se gestou em São Paulo, onde sucessivas mobilizações atraíram milhares às ruas – o maior episódio ocorreu no dia 13 de junho, quando um imenso ato público acabou em violentos confrontos com a polícia.
A grandeza do protesto e a violência dos confrontos expandiu a pauta para todo o País. Foi assim que, no dia 17 de junho, o Brasil viveu o que foi visto como uma das maiores jornadas populares dos últimos 20 anos. Motivados contra os aumentos do preço dos transportes, mas também já inflamados por diversas outras bandeiras, tais como a realização da Copa do Mundo de 2014, a nação viveu uma noite de mobilização e confrontos em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Salvador, Fortaleza, Porto Alegre e Brasília.
A onda de protestos mobiliza o debate do País e levanta um amálgama de questionamentos sobre objetivos, rumos, pautas e significados de um movimento popular singular na história brasileira desde a restauração do regime democrático em 1985. A revogação dos aumentos das passagens já é um dos resultados obtidos em São Paulo e outras cidades, mas o movimento não deve parar por aí. "Essas vozes precisam ser ouvidas", disse a presidente Dilma Rousseff, ela própria e seu governo alvos de críticas.