Uma amiga do estudante de 16 anos que promoveu o ataque a tiros na Escola Estadual Sapopemba, na Zona Leste de São Paulo, acredita que teria sido um dos alvos na manhã desta segunda-feira, 23. A amizade estava estremecida desde junho, quando eles acabaram se agredindo durante uma aula. No ataque, uma adolescente do terceiro ano do Ensino Médio morreu após ser atingida na cabeça, e outras duas estudantes ficaram feridas. Uma quarta vítima teve ferimentos leves, que não foram ocasionados por disparo de arma de fogo.
O crime ocorreu por volta das 7h30, quando os alunos do 1º E do Ensino Médio estavam em aula vaga de Sociologia. O adolescente chegou com três blusas, o que causou estranheza nos colegas de sala por causa da previsão de calor em São Paulo. Pouco depois, ele utilizaria uma das peças como uma espécie de máscara no rosto.
A turma estava dentro da sala de aula. A coordenadora do colégio passou um trabalho a pedido do professor ausente. Os alunos já se reuniam em grupos para realizar a atividade, e quando a funcionária saiu do local, o aluno suspeito a seguiu, em direção ao corredor.
“Ele saiu da sala também, falando que ia no banheiro. A gente ouviu um barulho, como se fosse uma bomba muito forte. A escola já tem histórico [de bombas]. A gente foi fechar a porta da sala, ele apareceu, e disparou contra a menina que estava fechando a porta. Era uma amiga minha”, relata a estudante que já foi amiga do adolescente e presenciou o ataque.
A menina que fechava a porta foi atingida no braço. Porém, antes disso, o aluno já havia atirado em outra garota, de 17 anos, que estudava no 3º ano do Ensino Médio. O disparo atingiu a região da cabeça dela, e todos os alunos que estavam no andar a viram caída no chão, conforme conta a amiga dele ouvida pelo Terra.
“Ele nunca tinha falado com ela. Ela não falava nada [não praticava bullying]. Ele só atirou nela acho que porque ela viu ele. Não teve nenhuma motivação. A gente nem conhecia ela”, explica.
Briga
A estudante entrevistada pelo Terra não falava com o rapaz desde junho, quando eles se desentenderam. "Eu era amiga dele, e ele sempre foi uma pessoa muito exposta nas redes sociais, e tinha coisa que ele postava que eu não achava certo dele postar”, relembra. Ela chegou a conversar com ele sobre isso, e foi a partir disso que a briga começou.
“Ele veio me questionar porque eu não achava certo, que ele não gostou, que eu tinha inveja dele. Isso tudo durante a aula. Quando o professor saiu da sala, ele me deu um tapa, e aí eu fui para cima dele, para tentar me defender.”
O Terra teve acesso ao vídeo em que o atirador aparece em uma briga, com duas meninas. A princípio, as imagens mostram o adolescente e outra aluna, ambos com o uniforme da escola, puxando os cabelos um do outro. A menina ainda o acerta com um chute, tentando se desvencilhar. Eles se separam e o menino a empurra, fazendo-a cair ao chão.
Nesse instante, outra estudante com capuz parte para cima do jovem, também puxando seus cabelos e dando tapas em sua cabeça. A primeira aluna se junta a ela, agredindo o rapaz. Eles são separados enquanto a sala grita. O vídeo teria sido gravado em junho deste ano.
A jovem confirma que é uma das meninas que aparece na filmagem, e também esclarece que sofreu uma suspensão pela briga. Depois disso, eles pararam de se falar.
“Ele tinha motivação para acertar alguém da sala. A gente acredita que seja todo mundo da sala que fazia bullying contra ele. Por eu ter sido amiga dele, e ele ter se revoltado contra mim… eu até tentei fugir da sala o máximo possível. Acredito que se ele tivesse me visto, teria disparado contra mim”, revela.
Há alguns meses o atirador também publicou em seu perfil nas redes sociais uma montagem como se estivesse matando uma das colegas de classe. Não há informações se ela está entre as vítimas. No comentário de uma das fotos publicadas em seu perfil, uma seguidora alerta o jovem: "Vc pode fazer uma denúncia, né?".
Revolta
A jovem esclarece que o adolescente era “revoltado” com as pessoas da sala, pois sofria bullying devido a sua sexualidade. “As pessoas não concordavam”. Segundo a menina, o atirador usava isso para ganhar visualizações nas redes sociais.
Ela relembra que, no início do ano, o estudante já tinha dito que iria fazer um ataque na escola, mas de maneira “sarcástica”. “Ele falava que ele sofria muito bullying na escola. Todo mundo desconfiava dele”, diz ela ao apontar que a turma achava que a escola deles seria a próxima a registrar um atentado.
Desde o meio do ano, ele não falava com ninguém da sala, pois segundo a jovem, já havia arrumado briga com todo mundo. O comportamento dele mudou “drasticamente”.
Trauma
A menina presenciou toda a cena. Viu a colega de sala ser atingida por um disparo no braço, e quando correu, viu a adolescente do terceiro ano caída no chão, já ensanguentada. Desesperados, ela e outros alunos foram rumo à coordenação, e tentaram pular o muro da escola para fugir.
“Todos os professores, todo mundo desesperado. Agora, vai ser difícil voltar para a escola. Eu estou meio transtornada com essa situação, porque eu não acredito que aconteceu isso. Não acredito que poderia ter sido eu se ele tivesse me visto. Se ele tivesse olhado para o meu rosto, teria atirado contra mim. Eu acredito que eu não vou voltar mais para a escola esse ano. Diante da situação, por mais que ele não esteja”, confessa.
*Com a colaboração de Vanessa Ortiz
*ATENÇÃO: Se você sofre algum tipo de bullying na escola ou cyberbullying de colegas na internet, faça a denúncia no Disque 100 – Disque Direitos Humanos. A ligação é gratuita e o atendimento é feito 24 horas por dia. Para receber atendimento ou fazer denúncias pelo WhatsApp, basta enviar mensagem para o número 61 99656-5008. Também é possível ser atendido pelo Telegram, basta digitar "Direitoshumanosbrasil" na busca do aplicativo. Após uma mensagem automática inicial, o atendimento será realizado pela equipe do Disque 100.
Se você é pai, mãe ou responsável por uma vítima de bullying, converse com ela. Procure a direção da escola para tentar solucionar o problema entre os envolvidos e suas famílias. Se o(a) diretor(a) não tomar nenhuma atitude, formalize a denúncia em casos mais graves no Conselho Tutelar ou na polícia da sua cidade.