"Eu não fiz nada para adquirir isso. O erro foi de pessoas irresponsáveis. (...) Não tem justificativa, eu quero punição". Assim desabafou uma dos seis pacientes que receberam transplante de órgãos contaminados com o vírus HIV no Rio de Janeiro.
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Em entrevista ao Fantástico, da TV Globo, neste domingo, 13, a paciente, que não quis se identificar, falou sobre o sentimento de revolta que se abateu sobre ela e sua família após ser notificada da contaminação.
Após a Secretaria Estadual de Saúde do RJ (SES-RJ) iniciar a investigação do caso e constatar a contaminação de nove órgãos, doados por duas pessoas com HIV, a paciente foi chamada a um posto de saúde para a realização de exames, que constataram a contaminação no dia 3 de outubro.
"Vai mudar minha vida completamente, porque antes era só os remédios para não ter rejeição dos meus rins. Eu não fiz nada para adquirir isso. O erro foi de pessoas irresponsáveis, e acho que quem lida com a vida de outra pessoa tem que ter responsabilidade", afirmou.
Ainda de acordo com a paciente, ela não recebeu qualquer orientação sobre tratamentos, exames complementares ou medicações e só deveria voltar para novas consultas no dia 29 de outubro. No entanto, após o caso vir à tona, ela recebeu um reagendamento para a próxima terça-feira, 15.
O governo do Rio de Janeiro teria informado que os pacientes contaminados estariam recebendo atendimento clínico e psicológico. Segundo a mulher, esse contato não aconteceu.
Outro paciente, que recebeu uma córnea e não foi contaminado com HIV, também falou à reportagem e desabafou sobre o caso. Ele revelou que será submetido a novos exames, também na terça-feira. "Eu fico preocupado, a gente está bom, aí pega um negócio desse e complica, né?".
Entenda o caso
A Polícia Federal investiga o caso de seis pacientes no Rio de Janeiro que receberam transplante de órgãos contaminados com o vírus HIV. O caso é investigado também pela Polícia Civil, pelo Ministério Público do Rio (MP-RJ) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Os pacientes estavam na fila do transplante da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro. Os órgãos infectados pelo HIV partiram de dois doadores. A notícia foi dada inicialmente pela BandNews FM na sexta-feira, 11, e confirmada pelo Terra.
O laboratório PCS Lab Saleme, responsável pelo exame de sangue dos pacientes e dos doadores, é investigado. O laboratório é do primo do ex-secretário de Saúde, conhecido como Doutor Luizinho, agora deputado federal e líder do PP na Câmara dos Deputados.
A empresa atuava com o governo a partir de uma licitação de R$ 11,4 milhões e tinha outros dois contratos de prestação que não passaram pelo trâmite. Os três contratos, assinados em 2023, somam mais de R$ 17,5 milhões.
A contaminação foi descoberta em 10 de setembro, após um paciente transplantado, que recebeu um coração, apresentar problemas de saúde cerca de nove meses depois de receber o órgão. No hospital, ele recebeu um resultado positivo para o teste de HIV. O paciente não tinha o vírus antes do transplante.
A partir desta informação, a Secretaria da Saúde testou amostras dos órgãos doados pela mesma pessoa e identificou mais cinco casos de contaminação. Os pacientes identificados já foram notificados pela secretaria.
Em nota ao Terra, a Secretaria de Estado de Saúde (SES) disse que a empresa teve o serviço suspenso após a ciência do caso e que, desde então, os exames sob responsabilidade do laboratório privado passaram a ser realizados pelo Homerio. Isso aconteceu em setembro, faltando três meses do contrato de licitação terminar.
Segundo o Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro, a Vigilância Sanitária interditou cautelarmente o laboratório no dia 8 de outubro.
Ainda de acordo com a secretaria, todas as amostras de sangue de doadores armazenadas desde o contrato de licitação de dezembro serão reavaliadas.
“Uma comissão multidisciplinar foi criada para acolher os pacientes afetados e, imediatamente, foram tomadas medidas para garantir a segurança dos transplantados”, acrescentou a nota, que chamou a situação de “inadmissível” e “sem precedentes”.
O que diz o Ministério Público
"A 5ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Saúde da Capital instaurou um inquérito civil para investigar as irregularidades noticiadas no programa de transplantes do Estado do Rio de Janeiro, após tomar conhecimento de eventos adversos.
O procedimento está sob sigilo, em razão do envolvimento de dados sensíveis dos pacientes. Assim que houver medidas a serem adotadas pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), as informações pertinentes serão repassadas à Secretaria de Saúde e à sociedade.
O MPRJ ressalta que está à disposição para ouvir as famílias afetadas, receber denúncias de quem se sentir lesado e prestar atendimento individualizado às partes envolvidas".