Em um ano eleitoral, a operação da Polícia Federal que implicou o ex-presidente Jair Bolsonaro, alguns de seus principais aliados e o presidente de seu partido (PL), Valdemar Costa Neto, poderá ter um impacto direto nos planos para as eleições municipais deste ano e até mesmo para atuação do partido no Congresso.
Uma das principais medidas autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito no Supremo Tribunal Federal ao qual está ligada a operação, é que os envolvidos na investigação não conversem ou tenham qualquer tipo de contato entre si. Isso inclui Bolsonaro e o presidente de seu partido.
A impossibilidade de coordenação da ação política entre o presidente do partido -- liberado no domingo, depois de ter sido preso na quinta-feira, durante a operação, por porte ilegal de arma e posse de uma pepita de ouro sem origem comprovada -- e quem deveria ser seu principal cabo eleitoral pode afetar diretamente o desempenho sonhado por Valdemar para o PL nas eleições deste ano.
"As demais cautelares fazem parte do processo, mas a proibição do presidente Bolsonaro e do presidente Valdemar se comunicarem inviabiliza completamente a atividade eleitoral do partido", disse à Reuters o deputado Filipe Barros (PL-PR). "É uma determinação ilegal e tem claramente o intuito de atrapalhar o PL nessas eleições."
Barros lembra que em 30 dias abre a janela eleitoral e o partido precisa definir quais serão seus candidatos em quais prefeituras, a formação das chapas para vereadores e a agenda de viagens que se planeja para Bolsonaro, que seria o principal cabo eleitoral do PL na campanha.
O ex-presidente é presidente de honra do partido e seu ex-companheiro de chapa nas eleições de 2022, o general Walter Braga Netto, o secretário de relações institucionais. Pela decisão de Moraes, nenhum dos três pode ter contato.
O partido tem hoje 339 prefeituras. A meta de Valdemar era, inicialmente, chegar a 1000, mas já havia falado em 1500, e tentar aumentar consideravelmente o tamanho do partido no Nordeste. Tudo com base na popularidade que Bolsonaro ainda tem, com cerca de 20% eleitores fiéis, independentemente das denúncias.
"A oposição liderada por Bolsonaro realmente será duramente atingida por isso. O partido pede musculatura política e vai ter que certamente refazer seus planos de triplicar o número de prefeitos nas próximas eleições", disse à Reuters André César, analista da Hold Assessoria Legislativa.
A operação da última quinta-feira aconteceu dentro da investigação do envolvimento de membros do antigo governo, das Forças Armadas e de aliados próximos de Bolsonaro na tentativa de um golpe de Estado para manter o ex-presidente no poder.
Alexandre de Moraes determinou que Bolsonaro não pode ter contato com nenhum dos outros investigados. Isso inclui, além de Valdemar, auxiliares próximos, como Tércio Arnaud -- um dos responsáveis pelo chamado gabinete do ódio -- e Braga Netto. Além disso, o ex-presidente teve seu passaporte retido pela Justiça.
Um parlamentar próximo a Valdemar que pertencia ao PL e deixou o partido por problemas regionais, disse à Reuters que o efeito na estratégia do partido este ano é "enorme".
"É um desgaste enorme para um partido que tinha a meta de ampliar sua base de prefeitos este ano. Como você coordena uma eleição se o presidente e seu principal cabo eleitoral não podem conversar? Afeta toda a estratégia do partido", disse, em condição de anonimato por não estar mais no PL.
O parlamentar lembra que o partido já tem muitas dificuldades internas com a entrada do grupo de direita radical encabeçado por Bolsonaro, que acabou trazendo muitas divisões. Cabia a Valdemar mediar esses conflitos, junto com Bolsonaro, em um diálogo hoje impossível.
O maior beneficiado, diz, certamente será o partido do governo e seus aliados.
"Se alguém perde, alguém se beneficia. Sem dúvida, o PT e os aliados vão ser beneficiados diretamente ou indiretamente com essa desarticulação no PL, que é o principal partido de oposição. Se isso se reflete em resultado, não temos como saber ainda. Mas sem dúvida prejudica", afirmou.
Parlamentares do partido ouvidos pela Reuters se mostraram apreensivos com o que classificaram com um ataque proposital ao PL.
O deputado José Medeiros (PL-MT) disse à Reuters que a investigação é "uma operação conjunta do STF e do governo Lula para destruir o grupo de Bolsonaro", que poderia vencer as eleições deste ano e eleger um presidente em 2026.
"É uma disputa eleitoral. Mas a ação da polícia vai unir o Brasil contra Lula", disse.
O partido não respondeu ao pedido da Reuters para comentar o tema.