Como adversários de Bolsonaro no Senado podem ajudá-lo a vencer disputa de R$ 30,1 bilhões

Senadores de oposição defendem manutenção do veto de Bolsonaro, e governo diz ter votos para vencer em sessão prevista para terça-feira.

3 mar 2020 - 06h49
(atualizado às 08h05)
Bolsonaro passa em frente ao Congresso em seu dia de posse; Presidente terá novo teste de força no Senado nesta terça-feira
Bolsonaro passa em frente ao Congresso em seu dia de posse; Presidente terá novo teste de força no Senado nesta terça-feira
Foto: Marcos Brandão/Agência Senado / BBC News Brasil

Senadores de oposição ao presidente Jair Bolsonaro podem ajudar o Planalto a vencer uma disputa envolvendo R$ 30,1 bilhões do Orçamento, nesta terça-feira (3).

Hoje à tarde, uma sessão do Congresso pode decidir a manutenção do veto de Bolsonaro que removeu cerca de R$ 30,1 bilhões do orçamento em emendas parlamentares.

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O Palácio do Planalto diz acreditar ter os votos para ganhar a disputa, se a questão for levada à análise dos senadores.

A conta inclui políticos de oposição a Bolsonaro, mas que já disseram publicamente que votarão para manter a verba sob responsabilidade do Executivo.

Na tarde de segunda-feira (2/03), o ex-presidente do Senado Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou ser favorável à manutenção do veto, "apesar das divergências com o governo de Jair Bolsonaro". "O orçamento impositivo, lá atrás, foi um avanço. Mas isso que se discute é bem diferente e temerário", escreveu Calheiros no Twitter.

Apesar de o MDB se considerar "independente" em relação ao governo, Renan Calheiros tem sido crítico ao Planalto desde o início do mandato de Bolsonaro.

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Outra emedebista que votará a favor do veto presidencial é a senadora Simone Tebet (MDB-MS).

O próprio líder da oposição no Congresso, Randolfe Rodrigues (DEM-AP), se diz favorável a manter o veto de Bolsonaro — no entanto, ele afirma que trabalhará para adiar a discussão, evitando que o assunto seja discutido já.

"Tem três vetos antes de chegar no veto da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias, relativo aos R$ 30,1 bilhões). Faremos obstrução (tentar impedir a votação) até chegar neste veto. Nossa estratégia será a obstrução", disse ele ao site especializado Congresso em Foco.

Além da bancada oposicionista, o grupo conhecido como "Muda Senado" — uma articulação informal anticorrupção com cerca de 20 senadores —também é contra destinar os R$ 30,1 bilhões para as emendas formuladas pelo relator do Orçamento, o deputado Domingos Neto (PSD-CE).

Oriovisto Guimarães (Pode-PR) e Fabiano Contarato (Rede-ES), que integram o grupo, disseram à BBC News Brasil serem favoráveis a manter o veto, ecoando declarações de outros congressistas do "Muda Senado" em entrevistas e nas redes sociais.

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No caso do dispositivo vetado por Bolsonaro na Lei de Diretrizes Orçamentárias, a análise inicial é feita pelos deputados. Se eles derrubarem o veto, os senadores serão chamados a opinar sobre o assunto.

Acordo 'improvável' com o Congresso

Na Casa Alta, pelo menos 41 dos 81 senadores precisam votar para derrubar o veto de Bolsonaro — e neste caso, o Planalto acredita ter a matemática a seu favor.

"A gente tem os votos para manter, no Senado (...). Na Câmara é complicado, mas basta uma Casa para manter o veto. (Para derrubar) tem que aprovar nas duas", diz à BBC News Brasil um articulador do governo que acompanha o assunto.

Por causa da situação no Senado, ele diz que é improvável que o governo feche um acordo com o Congresso — uma das possibilidades aventadas até então era de que Executivo e Legislativo dividissem os R$ 30,1 bilhões.

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"Para o Senado, é muito ruim derrubar este veto. Você vai colocar um relator, um deputado do PSD (Domingos Neto, CE), controlando R$ 30,1 bilhões em emendas de deputados e senadores? Se você tiver uma boa relação com o deputado, tudo bem, mas e se você for de outro grupo (político)? Acho que o Senado estaria se apequenando diante da Câmara. Não são emendas feitas pelo conjunto do Congresso, são modificações apresentadas por um relator", diz ele.

Alcolumbre e Bolsonaro em evento no final de 2019; os dois se encontraram na véspera de votação sobre orçamento impositivo
Foto: Marcos Brandão/Senado Federal / BBC News Brasil

Jair Bolsonaro recebeu o presidente do Senado para um encontro de cerca de uma hora no começo da tarde desta segunda-feira (02), no Palácio do Planalto. Nenhum dos dois mencionou qualquer acordo entre os poderes.

O analista político e ex-professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (Ipol-UnB) Paulo Kramer concorda ser pouco provável um novo acordo para dividir os recursos entre Executivo e Legislativo. Ele destaca, porém, que negociações assim costumam prosseguir até o momento da votação.

Deputados favoráveis à derrubada do veto devem se reunir com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) na manhã desta terça.

Disputa começou em dezembro passado

Embora só tenha se tornado pública pouco antes do Carnaval, a disputa entre o Planalto e parte do Congresso começou bem antes, em dezembro de 2019.

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Foi no dia 18 daquele mês que Bolsonaro resolveu vetar um artigo da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o 64-A.

Este trecho dava ao relator-geral do Orçamento, Domingos Neto (PSD-CE), o direito de direcionar os R$ 30,1 bilhões em emendas, como havia sido pedido por diferentes partidos e bancadas no Congresso.

O trecho também fixava um prazo de 90 dias aos ministérios para liberar o dinheiro, sob risco de responsabilização dos gestores na Justiça.

Segundo técnicos consultados pela reportagem da BBC News Brasil, a mudança gerou pesadas reclamações na Esplanada dos Ministérios no começo deste ano, o que motivou o veto presidencial.

"Ali (naqueles R$ 30 bilhões) têm de tudo. Tem lugares na Esplanada que só poderão contar com esse dinheiro de emendas de relator", diz um técnico. "Na verdade, criou-se uma instância de execução (orçamentária) dentro do Legislativo, uma coisa super complicada", disse o profissional.

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"Houve uma reação muito forte na Esplanada, dos militares, de todo mundo. O gestor (de cada ministério) corria risco de ser processado caso não fizesse a execução orçamentária dentro desse prazo de 90 dias", ressalta ele.

Um acordo entre Congresso e Executivo começou a ser costurado antes do Carnaval, mas naufragou quando o Planalto deixou de mandar um projeto de lei dividindo os R$ 30 bilhões.

Executivo prefere gastar em Defesa; Congresso privilegiou cidades

Na rubrica dos investimentos,

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Enquanto o Planalto dispõe de pouco mais de R$ 19,3 bilhões para aplicar em investimentos em 2019, as emendas parlamentares do Congresso determinarão o destino de R$ 22,1 bilhões nesta rubrica.

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As prioridades de cada Poder também são bastante distintas, na hora de alocar o dinheiro.

No Executivo, as prioridades estão nas áreas de defesa (R$ 6,01 bilhões), transporte (principalmente manutenção de rodovias), com mais R$ 5,8 bilhões, saúde (R$ 1,2 bilhão) e educação (R$ 1,1 bilhão).

Já o Legislativo priorizou urbanismo, habitação e saneamento (R$ 6,6 bilhões), seguidos de investimentos em saúde (R$ 3,1 bilhões), educação (R$ 3 bilhões) e transporte (R$ 2,07 bilhões).

Na hora de alocar dinheiro, dados mostram que as prioridades de cada Poder são bastante distintas
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Congresso ocupa cada vez mais espaço no Orçamento

Os R$ 30,1 bilhões reivindicados por Domingos Neto não são o primeiro movimento do Congresso para ocupar mais espaço no Orçamento desde o começo da gestão de Jair Bolsonaro.

Em meados do ano passado, congressistas já tinham aprovado uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que tornou obrigatório o pagamento das emendas de bancada — somando cerca de R$ 15,4 bilhões.

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Na época, o governo apoiou a proposta: sem ter como resistir à pressão do Congresso,

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A mudança na Constituição também trouxe algumas regras para o uso do dinheiro das emendas de bancada. Por exemplo: se o dinheiro for aplicado em uma obra ou projeto que dure mais de um ano, a bancada fica obrigada a destinar emendas para esta finalidade até que esteja concluída.

Até então, o pagamento de emendas deste tipo não era obrigatório, e frequentemente o dinheiro acabava não saindo dos cofres públicos.

No ano que vem, o valor destas emendas de bancada voltará a crescer, segundo a PEC aprovada.

Outros dois fatores também fazem com que o Congresso esteja

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Bolsonaro terá de lidar este ano com as consequências de não ter construído uma base de apoio no Congresso e enfrentar um "ano curto" na política, já que no segundo semestre deputados e senadores concentrarão suas energias na eleição municipal.

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