A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) alertou nesta terça-feira (08/12) para o risco do sistema de saúde do país entrar em colapso com o provável agravamento da alta de casos de covid-19 após o fim do ano.
A instituição disse que isso se deve ao estágio da pandemia no país, caracterizado pela sincronização dos surtos nas capitais e suas regiões metropolitanas e no interior.
Se antes as epidemias nos grandes centros e nas cidades menores tinham intensidades diferentes e inversas, o que permitiu atender a população por meio da redistribuição de pacientes, o mesmo não ocorre agora.
O coronavírus já se espalhou por todo o país, e os dados mostram que os surtos das capitais e seu entorno e das cidades do interior caminham no mesmo ritmo.
Isso se agrava porque passamos por um momento em que a disseminação do vírus voltou a crescer e deve se intensificar ainda mais após o período de férias, como ocorreu na Europa, e o Natal e o Ano Novo.
Esse agravamento simultâneo das epidemias em diferentes regiões deve lotar os hospitais dos grandes centros e do interior ao mesmo tempo, fazendo com que o sistema de saúde como um todo tenha menos margem de manobra para dar conta dessa demanda.
"Nos próximos meses, a busca por assistência especializada pode aumentar simultaneamente, nas regiões metropolitanas e no interior, provocando novo colapso do sistema de saúde", afirma Fiocruz em uma nota técnica publicada em seu site.
A sincronização das epidemias
Esse cenário é diferente de antes porque o novo coronavírus chegou ao Brasil primeiro pelas grandes cidades e só depois atingiu as cidades menores, uma fase que ficou conhecida como a interiorização da pandemia.
Esse processo ainda foi retardado pela adoção das medidas de restrição de circulação e a mudança de hábitos, como evitar aglomerações, usar máscaras e manter a higiene das mãos.
Até o fim de maio, as regiões metropolitanas concentravam 67% das mortes por síndrome respiratória aguda grave (srag), que é a manifestação mais séria da covid-19, registradas pelo sistema Infogripe.
Enquanto os surtos das capitais e áreas metropolitanas crescia, a epidemia ainda era branda no interior.
Depois, os casos começaram a cair nas capitais e a aumentar no interior, o que levou a um esgotamento da capacidade do atendimento de hospitais de diferentes regiões em tempos diferentes, "possibilitando o deslocamento da população em busca de atendimento em locais para onde existiam leitos disponíveis" ou onde eram abertos novos leitos.
"Mesmo assim, a doença (covid-19) acabou por ocupar boa parte dos demais leitos de UTI, o que explica em parte o excesso de óbitos observado por outras causas de internação", destaca a Fiocruz.
Mas a fundação diz que, a partir de julho, foi observada uma convergência das curvas de casos nas capitais e no interior em quase todos os Estados.
O processo de interiorização da pandemia se concluiu em outubro, segundo a instituição, quando o novo coronavírus estava espalhado por todo o território nacional. Naquele mês, as capitais e seu entorno responderam por apenas 33% das mortes por srag.
Com isso, as epidemias das áreas metropolitanas e do interior, que antes caminhavam em ritmos diferentes, passaram a ficar sincronizadas.
Férias e festas de fim de ano devem intensificar alta
Mas a sincronização ocorreu em meio a uma tendência de queda de casos e óbitos, ou seja, quando a pandemia estava perdendo força.
Agora, os surtos estão sincronizados em um momento em que o coronavírus "já circula com bastante velocidade e volta a ocupar os leitos hospitalares", diz a Fiocruz.
Além disso, "a circulação das pessoas no período de festas de fim de ano e férias deve acelerar a disseminação do vírus", afirma a instituição na nota técnica.
Foi o que ocorreu na Europa, onde, após a sincronização das epidemias, a maior movimentação no período de férias acelerou a disseminação da covid-19 e levou a um aumento de casos.
A instituição alerta que isso resultou nos países europeus em um maior número de casos graves e mortes, mesmo com o avanço dos tratamentos.
O mesmo deve ocorrer no Brasil com as epidemias sincronizadas. O aumento de casos tende agora a ocorrer ao mesmo tempo em vários locais, "o que gera um volume alto de casos sem possibilidade de atendimento".
"Os impactos desse crescimento, somados a vários fatores - desmobilização de leitos extras dos hospitais de campanha; a ocupação de leitos por outros problemas de saúde que ficaram represados durante o avanço da epidemia de covid-19; a maior circulação de pessoas; as dificuldades de identificação de casos e seus contatos devido à baixa testagem; e o relaxamento dos cuidados de distanciamento social, uso de máscaras e higiene - podem acarretar um cenário preocupante", diz a Fiocruz.
Isso se agrava pelo fato de as equipes médicas estão esgotadas, após passarem o ano sobrecarregadas por causa da pandemia e da "falta de comprometimento da população e de gestores na redução dos casos".
"A reabertura de leitos não garante acesso ao atendimento se não houver equipes qualificadas para dar suporte aos pacientes", alerta a Fiocruz.
O que fazer para evitar o colapso
A instituição conclui a nota técnica aconselhando que sejam tomadas medidas para reduzir a circulação de pessoas entre as cidades, o que é comum no fim de ano.
Também devem ser reforçadas as ações de distanciamento social aplicadas no dia-a-dia.
A Fiocruz alerta que as festas de Natal e Ano Novo podem, em vez de trazer um "conforto emocional", tornar o início de 2021 um período ainda mais difícil.
Por isso, a instituição diz não ser recomendável fazer festas que gerem aglomerações de pessoas.
Se ocorrerem, as reuniões devem envolver o mínimo de pessoas possível e, preferencialmente, serem feitas em locais abertos ou bem ventilados.
Sempre que possível, os participantes devem manter o distanciamento entre os presentes e usar máscaras e álcool gel.
"O auto isolamento deve ser realizado, tanto antes, quanto depois do retorno de viagens", diz a Fiocruz.
Por fim, os cuidados devem ser redobrados nos deslocamentos, para evitar acidentes, já que "com a ocupação dos leitos para tratamento de covid-19, outros agravos de saúde podem não dispor de atendimento em UTI".