O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), defendeu em entrevista à Reuters que o Congresso analise pedidos de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro, ao mesmo tempo que preferiu não opinar se Bolsonaro deve ser destituído da Presidência por causa de sua gestão da pandemia de Covid-19.
"Essa é uma colocação que tem que ser feita pelo Congresso Nacional. A Câmara tem mais de 60 pedidos de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro por diferentes razões. Entendo apenas --como cidadão e não como governador-- que cabe ao Congresso Nacional analisar aspectos que são importantes na obediência à Constituição", disse Doria à Reuters na quinta-feira.
"Mas não cabe a mim, como governador do Estado de São Paulo, fazer considerações a esse respeito. Espero sim que o Congresso tenha responsabilidade, tenha altivez, tenha independência e discuta todos os temas que são relevantes para o Brasil e para os brasileiros."
Doria é atualmente o principal crítico de Bolsonaro, especialmente pela atuação do presidente na pandemia, e a troca de farpas pública entre ambos é frequente. O governador paulista também é amplamente visto como provável candidato à Presidência em 2022, quando Bolsonaro buscará a reeleição.
Ele, no entanto, não se coloca como principal antagonista do presidente, mas sim como um escolhido por Bolsonaro para ser seu principal inimigo político.
"O presidente Bolsonaro me coloca nessa condição. Há mais de um ano, aliás, ele indica que eu sou o seu principal adversário, adversário mais perigoso, e me oferece os piores comentários, os piores palavrões, as piores manifestações", afirmou.
Na eleição de 2018, a situação era diferente. Diante da força de Bolsonaro no segundo turno do pleito, Doria procurou mostrar proximidade política com o então candidato para se fortalecer na disputa estadual, pregando o voto "BolsoDoria". O governador afirma estar arrependido do apoio e do voto dado a Bolsonaro.
Já a atenção reservada por Bolsonaro a Doria atualmente indica que ele vê no tucano um adversário que pode atrair pelo menos parte dos eleitores que o escolheram em 2018.
Um dos principais pontos de embate entre Doria e Bolsonaro nos últimos meses foi a CoronaVac, vacina contra Covid-19 do laboratório chinês Sinovac, que está sendo envasada no Brasil pelo Instituto Butantan, vinculado ao governo paulista.
Após Bolsonaro criticar a origem chinesa da vacina, afirmando que ela não inspirava confiança, e garantir que o imunizante não seria adquirido pelo Ministério da Saúde, a CoronaVac foi comprada pelo governo federal e 8,7 milhões de doses foram entregues pelo Butantan ao Programa Nacional de Imunização (PNI), parte do total de 46 milhões de doses acertadas para entrega até abril.
Até o momento, além da CoronaVac, o Brasil conta somente com 2 milhões de doses da vacina da AstraZeneca, desenvolvida em conjunto com a Universidade de Oxford, para vacinar contra uma doença que já matou quase 230 mil pessoas no país.
Sem colocar-se publicamente como candidato à Presidência no pleito do ano que vem, Doria avaliou que a CoronaVac, cuja aplicação começou em janeiro em São Paulo em evento com a presença do governador que deu a largada na campanha nacional de vacinação contra a Covid-19, ajudou a nacionalizar seu nome. Recentemente, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, principal liderança histórica do PSDB, afirmou que Doria precisa tornar-se um nome nacional para se credenciar à disputa ao Planalto.
"Veja como a dinâmica da política é muito rápida. Três meses atrás não se imaginaria que eu pudesse ter o nome nacionalizado tão rapidamente sem sequer viajar", disse.
"Mas o meu nome se nacionalizou rapidamente em todo o país, dadas as circunstâncias de que nós defendemos a ciência, a vida e a vacina. E conseguimos, e devo dizer, vencemos também, porque foi essa a tese vencedora, vitoriosa, de termos uma vacina, de iniciarmos a vacinação."
ALIANÇA PARA 2022
Eleito prefeito de São Paulo em 2016 em primeiro turno, algo inédito na capital paulista em eleições com possibilidade de dois turnos, Doria prometeu que cumpriria o mandato até o final, mas renunciou à prefeitura em 2018 para disputar o governo do Estado e, na ocasião, argumentou que foi compelido por aliados a fazê-lo. Ele não descartou deixar o Palácio dos Bandeirantes no ano que vem nas mesmas circunstâncias para enfrentar Bolsonaro.
"Pode ser", disse. "É cedo para oferecer essa resposta", respondeu o governador, apontando que a prioridade agora deve ser o combate à pandemia.
Ao mesmo tempo, ele aposta que PSDB, MDB e DEM estarão juntos na disputa eleitoral do ano que vem e não descarta ampliar este campo à esquerda.
O vice de Doria, Rodrigo Garcia, é do DEM, ao mesmo tempo que na eleição municipal do ano passado na capital paulista, Bruno Covas (PSDB) foi reeleito tendo um vice do MDB. Doria declarou apoio à candidatura de Baleia Rossi (MDB-SP) à presidência da Câmara dos Deputados em uma postulação patrocinada pelo ex-presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Baleia foi derrotado ainda em primeiro turno por Arthur Lira (PP-AL), candidato de Bolsonaro que o apoiou abertamente. O DEM desistiu de participar do bloco partidário de apoio ao emedebista e o PSDB flertou com essa possibilidade, mas acabou decidindo manter-se formalmente no grupo. O episódio teria levado Maia a aventar a possibilidade de deixar o DEM.
"Eu confio que, para as eleições de 2022, nós teremos de fato uma aliança entre o PSDB, o MDB sob liderança do deputado Baleia Rossi, e o DEM, ou o sucessor do DEM. O DEM vive uma situação anômala, uma situação diferenciada neste momento, talvez com a saída de alguns de seus líderes", avaliou,
"Mas seja num novo partido decorrente disso, ou estabilizado e pacificado o próprio DEM, eu acredito que estaremos juntos para formar uma grande aliança pelo Brasil para as eleições presidenciais de 2022", acrescentou.
Sobre seu próprio partido, Doria defendeu que a legenda se reúna nos próximos meses para deliberar sobre os posicionamentos da sigla "para que tenhamos princípios, altivez e sobretudo a história e a biografia do PSDB preservadas".