Janot apresenta denúncia contra Temer; veja próximos passos

É a primeira vez que um presidente da República é denunciado ao STF durante seu mandato; Janot fala em crime de corrupção passiva.

26 jun 2017 - 20h51
(atualizado em 27/6/2017 às 07h31)

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou na noite desta segunda-feira ao Supremo Tribunal Federal (STF) um pedido para que o presidente Michel Temer seja processado por corrupção passiva, juntamente com o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR).

Rodrigo Rocha Loures
Rodrigo Rocha Loures
Foto: BBC News Brasil

A acusação preparada por Janot se baseia nas investigações que foram abertas após as delações de executivos da JBS Joesley e Wesley Batista na Operação Lava Jato.

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O procurador afirma que Temer aceitou, por intermédio de Loures, "vantagem indevida de R$ 500 mil ofertada por Joesley Batista, cujo pagamento foi realizado pelo executivo da J&F Ricardo Saud".

"Além do efetivo recebimento do montante espúrio mencionado, Michel Temer e Rodrigo Loures, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, com vontade livre e consciente, ainda aceitaram a promessa de vantagem indevida no montante de R$ 38 milhões", diz o pedido.

É a primeira vez que um presidente da República é denunciado ao STF durante seu mandato. O Planalto ainda não se manifestou sobre a denúncia.

Em suas manifestações públicas sobre o caso, o presidente tem criticado Joesley, acusando-o de ser "o criminoso notório de maior sucesso na história brasileira".

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Em abril deste ano, o ex-deputado e ex-assessor do presidente Rodrigo Rocha Loures foi filmado saindo de um restaurante em São Paulo com uma mala contendo R$ 500 mil.

De acordo com a PGR, o dinheiro era parte da propina paga pela JBS a Temer em troca de favorecimento no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), num processo para reduzir preço do gás fornecido pela Petrobras a uma termelétrica da empresa.

No pedido, Janot diz que "os interesses privados dos acusados passaram a prevalecer sobre a defesa do interesse público, valor que deveria ser por ele devidamente observado".

"Em outras palavras: Michel Temer e Rodrigo Loures desvirtuaram as importantes funções públicas que exercem, visando, apenas, ao atendimento de seus interesses escusos", afirma o procurador.

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Janot pede que o presidente e o ex-deputado sejam condenados a pagar indenizações aos cofres públicos por danos morais coletivos, no valor de R$ 10 milhões e R$ 2 milhões, respectivamente.

Ainda que tenha sido apresentado ao STF, o pedido precisa ser primeiro avaliado pela Câmara dos Deputados. Só se o pedido for aprovado pela Câmara e, posteriormente, pelo STF, Temer se tornará réu e será afastado do cargo.

A BBC Brasil explica abaixo os trâmites do processo:

Crime de responsabilidade X crimes comuns

Há tramitações distintas para os casos em que um presidente é acusado por crimes de responsabilidade e por crimes comuns.

Crimes de responsabilidade são violações exclusivas ao exercício do mandato (é o caso da denúncia que levou ao impeachment de Dilma Rousseff, acusada de violar a lei orçamentária). Nesses processos, o julgamento do presidente cabe ao Senado.

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Já acusações contra um presidente por crimes comuns (como os atribuídos a Temer pelo procurador-geral) são julgados pelo STF, desde que haja a autorização da Câmara dos Deputados.

Por isso, após a apresentação da denúncia pelo procurador, a presidente do STF, Cármen Lúcia, a encaminhará para a Câmara.

O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não tem a possibilidade de arquivar a iniciativa, devendo submetê-la à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

A defesa de Temer terá o prazo de dez sessões para se manifestar sobre a denúncia.

Após essa etapa, haverá um prazo de cinco sessões para que um deputado indicado por Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), o presidente da CCJ, apresente um relatório sobre a denúncia, recomendando que ela seja admitida ou rejeitada.

O deputado terá de ser escolhido entre os 66 membros da comissão, embora os partidos sejam livres para substituir seus representantes no órgão. Pacheco diz que não escolherá "um nome do governo" para a função.

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O prazo para a apresentação do relatório será de cinco sessões. O relatório será então votado pelos membros da CCJ.

É possível que a defesa de Temer e o relator concluam seus trabalhos antes dos prazos, para acelerar o processo e evitar um maior desgaste do presidente.

Juízo político

Sendo aprovado ou rejeitado na comissão, o relatório será submetido ao plenário da Câmara, para que seja votado por todos os deputados.

Cada deputado será chamado ao microfone para se posicionar a favor ou contra a admissão da denúncia.

Segundo o ex-ministro do STF Carlos Velloso, ao se posicionar, cada deputado deverá verificar se "a acusação é consistente, se tem ela base em alegações e fundamentos plausíveis, ou se a notícia do fato reprovável tem razoável procedência, não sendo a acusação simplesmente fruto de quizílias [inimizades] ou desavenças políticas".

Para Velloso, ao decidir sobre a denúncia, "a Câmara dos Deputados profere juízo político", e não jurídico.

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Contagem dos votos

Para que a denúncia seja aceita, são necessários os votos de 342 dos 513 deputados (dois terços).

Já Temer se livra da denúncia se acumular ao menos 172 votos e/ou abstenções.

Se o presidente vencer a votação, a denúncia será arquivada.

Caso contrário, ela volta ao Supremo, para que os ministros da corte também avaliem se a denúncia deve ou não ser aceita.

De volta ao STF

Se os ministros do STF avaliarem que Temer não deve ser julgado, a denúncia é arquivada.

Se avaliarem que a denúncia é válida, Temer será afastado temporariamente por até 180 dias, sendo substituido pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), nesse período.

O STF terá seis meses para julgar o caso. Se Temer for absolvido ou o Supremo não completar o julgamento em 180 dias, o peemedebista volta automaticamente à Presidência.

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Se condenado, perde o mandato.

Temer só poderia ser preso após uma eventual condenação, pois não há na legislação a possibilidade de prisão provisória para presidentes da República.

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