Joias, vacina e, agora, golpe: as acusações contra Bolsonaro

Ex-presidente é acusado por envolvimento em fraude no cartão de vacina contra a covid-19 e no caso das joias recebidas pela Presidência.

21 nov 2024 - 16h49
(atualizado às 22h01)
Além dos indiciamentos, ex-presidente tornou-se inelegível pelo TSE
Além dos indiciamentos, ex-presidente tornou-se inelegível pelo TSE
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil / BBC News Brasil

A Polícia Federal (PF) indiciou nesta quinta-feira (21/11) o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 36 pessoas, dentre elas os generais Walter Braga Netto e Augusto Heleno, que fizeram parte de seu governo.

Eles são suspeitos de tentativa de golpe de Estado para manter o ex-presidente no poder após as eleições de 2022, e foram indiciados pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa.

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O indiciamento significa que a PF viu indícios suficientes para considerar que um crime foi praticado e, assim, formalizou esses indícios em um inquérito.

O documento ainda passará pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que decidirá se os tornarão réus ou não.

Em sua conta na rede social X, Bolsonaro reproduziu trechos de uma entrevista que deu ao portal Metrópoles falando sobre o indiciamento.

Ele acusa o ministro do STF, Alexandre de Moares, que, segundo o ex-presidente "prende sem denúncia, faz pesca probatória e tem uma assessoria bastante criativa."

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Bolsonaro também afirmou que aguardará seu advogado, e que o caso irá para a PGR "obviamente".

Essa é a terceira vez que o ex-presidente é indiciado. Entenda a quais são os outros dois casos que podem levar Bolsonaro a julgamento.

Inquérito sobre joias

Em julho deste ano, Bolsonaro e outras 11 pessoas foram indiciadas pela PF no inquérito que apura um suposto esquema de negociação ilegal de joias dadas por delegações estrangeiras à Presidência da República quando Bolsonaro era presidente.

Na ocasião, Bolsonaro foi indiciado por três crimes: organização criminosa (com penas de um a três anos de reclusão); lavagem de dinheiro (de três a 10 anos) e peculato (apropriação de bem público), que podem levar a uma pena de dois a 12 anos de reclusão.

Segundo o inquérito da PF, a suposta associação criminosa formada pelo ex-presidente e seus ex-assessores teria desviado ou tentado desviar itens com valor de mercado de até R$ 6,8 milhões (US$ 1,2 milhão).

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A investigação apontou que "os valores obtidos dessas vendas eram convertidos em dinheiro em espécie e ingressavam no patrimônio pessoal do ex-presidente da República, por meio de pessoas interpostas e sem utilizar o sistema bancário formal, com o objetivo de ocultar a origem, localização e propriedade dos valores", segundo o documento.

Conforme os investigadores, o grupo teria utilizado o Gabinete Adjunto de Documentação Histórica do Gabinete Pessoal da Presidência da República (GADH/GPPR) para desviar presentes de alto valor.

O departamento, que era presidido por Marcelo da Silva Vieira, destinaria os presentes recebidos ao acervo privado de Bolsonaro, desconsiderando o valor dos objetos e ampliando ilegalmente o conceito de "bens personalíssimos", para abranger qualquer bem de uso pessoal.

Outra forma apontada pela investigação para realizar os desvios dos bens era simplesmente não registrar o momento da entrega do presente, para que ele fosse subtraído diretamente pelo ex-presidente, sem sequer passar pela avaliação do GADH.

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O dinheiro obtido com as vendas das joias sauditas teria entrado para o patrimônio pessoal de Bolsonaro e servido para custear as despesas dele e de sua família nos Estados Unidos entre os dias 30 de dezembro de 2022 e 30 de março de 2023, segundo o inquérito da PF.

Os indiciados neste caso são:

  • Jair Messias Bolsonaro, ex-presidente da República, indiciado por associação criminosa, lavagem de dinheiro e peculato (apropriação de bem público);
  • Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior, ex-ministro de Minas e Energia, indiciado por apropriação e associação criminosa;
  • Fábio Wajngarten, ex-chefe da Secretaria de Comunicação Social e advogado de Bolsonaro, indiciado por lavagem e associação criminosa;
  • Frederick Wassef, advogado de Bolsonaro, indiciado por lavagem e associação criminosa;
  • José Roberto Bueno Junior, ex-chefe de gabinete do Ministério de Minas e Energia, indiciado por associação criminosa, lavagem de dinheiro e apropriação;
  • Julio Cesar Vieira Gomes, ex-secretário da Receita Federal, indiciado por associação, lavagem, apropriação e advocacia administrativa perante a administração fazendária;
  • Marcelo Costa Câmara, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, indiciado por lavagem de dinheiro;
  • Marcelo da Silva Vieira, ex-chefe do setor de presentes durante o governo Bolsonaro, indicado por apropriação e associação criminosa;
  • Marcos André dos Santos Soeiro, ex-assessor do ex-ministro de Minas e Energia, indiciado por apropriação e associação criminosa;
  • Mauro Cesar Barbosa Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, indiciado por associação criminosa, lavagem de dinheiro e peculato.
  • Mauro Cesar Lourena Cid, general da reserva e pai de Mauro Cid, indicado por lavagem e associação criminosa;
  • Osmar Crivelatti, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro; indicado por lavagem e associação criminosa.

Bolsonaro e seus ex-assessores negaram qualquer irregularidade no trâmite das joias.

Na ocasião, o advogado criminalista Cezar Roberto Bittencourt, responsável pela defesa do tenente-coronel Mauro Cid, disse ao jornal Folha de S. Paulo que o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro não se beneficiou do negócio.

"Ele confessa que comprou as joias evidentemente a mando do presidente", disse Bittencourt ao jornal.

Fraude no cartão de vacina

Em março deste ano, Bolsonaro, seu ex-ajudante de ordens Mauro Cid e outros 14 aliados foram indiciados pelos crimes de associação criminosa e inserção de dados falsos em sistema de informações, no inquérito que apura suposta fraude em cartões de vacinação da covid-19.

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A investigação teve início em 2023. A PF suspeitava que Mauro Cid e outros assessores próximos de Bolsonaro teriam colaborado para emitir certificados falsos de imunização contra a covid-19 para o então presidente e sua filha.

O documento falso garantiria a entrada de ambos nos Estados Unidos no final de 2022, antes da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Na época, a apresentação desse documento na alfândega americana era uma exigência para a maioria das pessoas. No entanto, isso não seria necessário para Bolsonaro e sua filha, graças ao passaporte diplomático que possuíam.

Na época, o ex-presidente negou que tivesse conhecimento da falsificação. Já para a PF, registros no aplicativo ConecteSus — sistema do Ministério da Saúde que emite o certificado de vacinação — de que a conta associada ao ex-presidente foi acessada de dentro do Palácio do Planalto por seu ex-ajudante de ordens para a emissão de comprovantes falsos reforçaria a hipótese que Bolsonaro sabia da falsificação.

O grupo é suspeito de ter inserido dados falsos de vacinação contra a covid-19 no sistema do Ministério da Saúde para forjar os certificados de vacinação também de Mauro Cid, da sua mulher e de três filhas do casal (duas menores de idade); e de mais dois assessores do ex-presidente.

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Supostamente, a finalidade das falsificações também seria viabilizar a entrada dessas pessoas nos Estados Unidos.

O crime de inserção de dados falsos em sistema de informações tem pena de 2 a 12 anos de prisão, enquanto o de associação criminosa estabelece pena de 1 a 3 anos.

Inelegível

Além dos indiciamentos, Bolsonaro foi condenado a oito anos de inelegibilidade em dois processos separados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

No primeiro, em junho do ano passado, foi condenado por abuso do poder político por ter convocado uma reunião com embaixadores de países estrangeiros em Brasília meses antes das eleições presidenciais e usado meios de comunicação governamentais para discursar contra a integridade do sistema eleitoral brasileiro.

No segundo processo, foi condenado em outubro do ano passado por abuso do poder político e econômico por ter usado recursos públicos durante as comemorações do Dia da Independência de 2022 para fazer campanha eleitoral.

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Bolsonaro sempre disse ser inocente. Como na esfera eleitoral não haveria mais recursos disponíveis contra as condenações, a defesa de Bolsonaro recorreu ao STF para tentar reverter a inelegibilidade.

Em um dos recursos, a defesa alega que as condenações a Bolsonaro teriam violado princípios constitucionais como a inclusão de provas que, inicialmente, não estariam vinculadas aos processos eleitorais como a chamada "minuta do golpe".

Aliados de Bolsonaro defendem uma "anistia", o que poderia abrir caminho para que o ex-presidente disputasse as eleições em 2026.

Somente no TSE, há um total de 18 ações de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) contra Bolsonaro, incluindo a julgada agora.

As AIJEs tratam de acusações de abuso de poder nas eleições e têm como pena a inelegibilidade - caso Bolsonaro venha a ser novamente condenado, no entanto, não haverá acréscimo no período em que ficará inelegível.

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