Líderes de atos divergem sobre pedido de intervenção militar

Revoltados Online acredita que participação de grupos diferentes, como o SOS Forças Armadas, nas manifestações antigoverno "fortalece o movimento" contra o PT. MBL e Vem pra Rua discordam e dizem "repudiar" e "não compactuar" com pedidos de intervenção

18 mar 2015 - 11h23
<p>Intervencionista carrega faixa, em inglês, a favor de governo militar em manifestação de SP</p>
Intervencionista carrega faixa, em inglês, a favor de governo militar em manifestação de SP
Foto: Paulo Pinto / Fotos Públicas / Divulgação

A manifestação antigoverno realizada em São Paulo, no último domingo, contou com diferentes coletivos, entre eles, o Revoltados Online, Movimento Brasil Livre, Vem Pra Rua e SOS Forças Armadas. Este último, que defende uma intervenção militar no País, foi o que mais chamou a atenção (e o que mais causou controvérsia). Pelos selfies com as tropas de choque, pelos coros do hino nacional, pelas orações (com direito a “livrai-nos do mal e do comunismo”), pelos aplausos a um ex-agente do Dops, pelos discursos inflamados e por diversos outros motivos, a presença do movimento dividiu opiniões até mesmo dos líderes dos outros grupos que promoveram o protesto. 

Marcello Reis, porta-voz do Revoltados Online, que luta pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff e pelo fim do voto em urna eletrônica, garante que os coletivos articuladores não têm relação alguma um com o outro. Mesmo assim, diz não se incomodar em “compartilhar” a liderança dos atos com os intervencionistas. Pelo contrário.

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“Todos os movimentos, independente de suas bandeiras principais, têm um foco, que é a retirada da presidente. O Vem Pra Rua não fala em impeachment, mas questiona a questão da Lava Jato. O pessoal da intervenção também não, mas quer tirar o PT do poder. Então o foco é um só. A participação de vários grupos diferentes fortalece o movimento como um todo. Agora ele já é um movimento brasileiro. Não é de uma pauta só, mas o foco é a retirada de quem está nos roubando”, disse ao Terra o representante do Revoltados Online.  

Outro grupo responsável pela organização é o Movimento Brasil Livre. Como o nome sugere, ele prega medidas clássicas do liberalismo, como redução do Estado, redução dos impostos e privatização de empresas estatais. De acordo com o coordenador Kim Kataguiri, o momento vivido pelo País fez com que o impedimento da presidente se tornasse também uma pauta urgente. Mas, aqui, os pedidos de intervenção militar não são bem vistos. 

Participantes pedem impeachment da presidente na Avenida Paulista
Foto: Paulo Pinto / Fotos Públicas / Divulgação

"Como movimento liberal e republicano, nós repudiamos qualquer tipo de ditadura. Repudiamos qualquer reivindicação antidemocrática. Um general tirar um presidente do poder é algo que não existe na Constituição", declarou. "Infelizmente, não temos como nos separar deles [SOS Forças Armadas]. Eles também possuem o direito de se manifestar. Mas deixamos claro em todos os nossos discursos que repudiamos não as pessoas que defendem a intervenção em si, mas a ideologia delas", completou. 

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O jovem contou que, em reunião com a polícia para definir quais seriam as regras da manifestação de domingo, todos os coletivos que já haviam protocolado pedido conseguiram o direito de levar um carro de som à Avenida Paulista. Já que não tinham como impedir a presença dos intervencionistas, então, recorreram à divisão da via em "blocos". 

"Nos preocupamos com a segurança de todos. Com a área separada, cada grupo teria seu espaço e cada pessoa poderia mostrar sua indignação onde se reconhecesse mais. Eu gostaria muito que o ato deles [SOS Forças Armadas] fosse em outro momento. Até tentamos conversar sobre isso, mas eles são irredutíveis. Querem fazer no dia e no horário que nós fazemos. Não temos poder sobre isso", lamentou. 

O movimento Vem Pra Rua divulgou nesta terça-feira uma carta "em repúdio à reeações do governo federal frente às manifestações de 15 de março", na qual diz: "condenamos qualquer tipo de extremismo (separatismo, intervenção militar, golpe de Estado) e não compactuamos com governos autoritários. Segundo o texto, o governo federal "tenta distorcer as manifestações históricas ocorridas em todo o País".

O Vem pra Rua afirma que sua causa é contra a corrupção e a falta de competência do governo na administração, sobretudo na condução da política econômica. "A conclusão é inequívoca. Ou o governo da presidente Dilma não entendeu aquilo que o povo nas ruas disse. de forma direta, no domingo, ou se faz de desentendido", diz o texto. E afirma: "Continuaremos, dentro da mais perfeita ordem e constitucionalidade, manifestando nossa indignação". O grupo, no entanto, não comenta a participação do SOS Forças Armadas na articulação das manifestações.

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Para intervencionista, regime militar foi “democrático”

Na sexta-feira, quando alguns desses movimentos realizaram uma “amostra” do ato de domingo na Avenida Paulista, a reportagem conversou com Renato Tamaio, fundador do SOS Forças Armadas. Na ocasião, ele confirmou que a intenção de todos os grupos é tirar o Partido dos Trabalhadores do governo, mas disse que "apenas isso" não é suficiente para "mudar o País para melhor". Para ele, somente um governo militar "temporário" poderia "organizar" as instituições políticas.

“Tanto impeachment como renúncia, na nossa ótica, não funcionam. Fazendo um resumo simples, é o mesmo que ter um galpão cheio de ratos e ir lá tirar a ratazana. Não adianta. No nosso entendimento, a intervenção vem para fazer uma limpa e começar a vida política do zero. Está tudo aparelhado. Não acreditamos nas instituições que estão aí. As pilastras que sustentam a democracia estão corroídas. A corrupção foi institucionalizada pelo PT e por todos os partidos que dão suporte a ele”, afirmou.

Trio do SOS Forças Armadas, um dos movimentos participantes do protesto
Foto: Paulo Pinto / Fotos Públicas / Divulgação

Em seguida, questionado sobre a repressão existente durante o período da ditadura, alegou que aquele foi um período democrático.

“Existe um tabu em torno da intervenção, mas quem viveu na época em que o regime foi vigente, de 1964 a 1985, sabe. Era um regime democrático militar. Tínhamos eleições para prefeito, para senador, para deputado estadual e federal. E o presidente e os governadores eram eleitos de forma indireta por esses representantes eleitos pelo povo”, argumentou.

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Tamaio, porém, deixou de comentar os conhecidos casos de tortura e assassinato cometidos por agentes do governo após o golpe de 1964, comandado pelos militares com o apoio de parte da população que temia suposta “ameaça comunista”. No relatório final divulgado no ano passado pela Comissão Nacional da Verdade (CNV), disponível para download gratuito na internet, podem ser conhecidos perfis de 191 brasileiros mortos e 243 “desaparecidos” durante o período – números que certamente são maiores, já que o acesso a dados e documentos foi dificultado pelas autoridades da época.  

E se o ato antigoverno ocorresse sob intervenção militar?

Ainda segundo o relatório, os excessos eram cometidos contra absolutamente qualquer pessoa que demonstrasse “comportamento subversivo”. Camponeses, povos indígenas, mulheres feministas, adeptos de religiões minoritárias, militantes de esquerda, populações LGBTs, estudantes e professores universitários eram os principais alvos, mas há registros até mesmo de crianças e idosos que foram torturados. Cadeira elétrica, pau-de-arara, espancamentos, choques, queimaduras e afogamentos eram algumas das táticas utilizadas.

Fonte: Terra
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