Mudança em foro privilegiado pode aumentar impunidade, diz Mendes

4 mai 2018 - 19h12
(atualizado em 5/5/2018 às 09h14)

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de delegar à primeira instância da Justiça o julgamento de crimes cometidos por deputados e senadores em casos não relacionados a seus mandatos pode aumentar a impunidade dada a falta de estrutura do primeiro andar do Poder Judiciário em vários Estados, disse nesta sexta-feira o ministro Gilmar Mendes, do STF.

Ministro Gilmar Mendes, do STF, durante entrevista à mídia estrangeira no Rio de Janeiro
04/05/2018 REUTERS/Ricardo Moraes
Ministro Gilmar Mendes, do STF, durante entrevista à mídia estrangeira no Rio de Janeiro 04/05/2018 REUTERS/Ricardo Moraes
Foto: Reuters

Apesar do grande número de casos e processos no Supremo, Gilmar teme pelos resultados na Justiça de primeiro grau.

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"Minha expectativa é que essa situação vai piorar... comecem a acompanhar os processos que vão baixar para a primeira instância e comecem a ver no que resultou daqui a seis ou oito meses… o cenário não é fácil", disse ele a jornalistas no Rio de Janeiro.

Para o ministro do STF, as justiças locais têm estruturas mais frágeis e mais sujeitas a pressões de forças regionais, o que em tese deve afetar a qualidade e o ritmo de andamento dos processos

"Pense num político no Nordeste ou do Norte agora sendo processado por juiz de uma comarca local e investigado por delegado local com essa realidade que se tem em Sergipe, Alagoas, Pernambuco, onde os juízes são bem qualificados e remunerados, mas a estrutura não é toda assim", avaliou ele.

Nessa quinta-feira, por unanimidade, o STF decidiu restringir o foro privilegiado para deputados e senadores e a maioria dos ministros definiu que só serão processados na corte os parlamentares investigados por fatos relacionados ao mandato e cometidos no exercício do cargo. Muitos inquéritos e ações penais serão remetidas a primeira instância do Judiciário.

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Para Gilmar, o Legislativo deveria se pronunciar sobre a abrangência do foro, mas enquanto isso não ocorre órgãos como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deveriam estabelecer metas, níveis de produtividade e celeridade às instâncias de primeiro grau de forma que os processos sejam efetivamente julgados.

"A primeira instância não está estruturada. Vide o caso do Eduardo Azeredo (ex-governador de Minas Gerais e ex-presidente do PSDB). O caso estava no Supremo e foi para a primeira instância, que só julgou depois de 10 anos. A estrutura da Justiça estadual é, em muitos casos, deficiente", afirmou.

"Nos Estados, se não houver apoio do CNJ, a pressão será muito grande."

O ministro acredita que a decisão do Supremo dessa quinta-feira vai fomentar debates regionais para mudanças também no foro de deputados estaduais e vereadores.

Sobre a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Gilmar disse acreditar que o petista, que lidera as pesquisas de intenção de voto para presidente da República, esteja inelegível pela Lei da Ficha Limpa.

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Ele avaliou que o PT já tem consciência da inviabilidade da candidatura, mas ainda não declarou isso publicamente por que a retirada de Lula esfacelaria as pretensões do partido na disputa deste ano.

Apesar de já ter feito diversas críticas ao PT, Gilmar reconheceu a força política de Lula, especialmente no Nordeste, e chegou a chamar o petista de mito e a compará-lo ao padre Cícero.

"Não vejo possibilidade de ser candidato a não ser que seja revista a decisão da condenação em segunda instância. E teria que revogar a condenação. Até o Lula sabe disso, me parece, mas não se diz porque o PT, por razões eleitorais; o Lula ainda é ponto de união", frisou.

No mês passado, o ex-presidente do STF Joaquim Barbosa se filou ao PSB e abriu a possibilidade de se lançar candidato a presidente. Gilmar, no entanto, não acredita na viabilidade da candidatura do ex-colega de corte, com quem já teve desentendimentos públicos no plenário do Supremo, por entender que Barbosa teria dificuldades para fazer articulações políticas.

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Com relação a uma eventual terceira denúncia contra o presidente MIchel Temer, envolvendo o chamado inquérito dos portos, Gilmar disse que a Procuradoria-Geral da República (PGR) não vai se deixar levar pelo clima pré-eleitoral que já toma conta do país.

"Há um ambiente de muita especulação e só faria algo se houvesse base e não para agradar a mídia, até porque estamos a poucos meses das eleições", avaliou.

"O ambiente no Brasil se tornou elétrico. Nós temos uma pré-eleição e isso contamina na divulgação dessas notícias", finalizou.

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