Carla Sássi decidiu criar uma ONG (organização não governamental) para resgatar animais de desastres depois que tempestades arrasaram a região serrana do Rio em 2011.
Agora ela está de novo no mesmo lugar, para salvar os bichos da pior tragédia da história de Petrópolis, que também foi causada pelas chuvas, há uma semana.
"O cenário é o mesmo. Parece que não fizeram nada para mudar a situação", lamenta a médica veterinária, de 41 anos.
Carla chegou na quarta-feira passada (16/2) à cidade, junto com outros voluntários do Grupo de Resgate de Animais em Desastre (Grad).
Ela calcula que só o seu grupo já salvou mais de 200 bichos. "Todo mundo teve que sair, e os animais ficaram para trás", diz Carla.
O Grad é uma das ONGs que estão trabalhando junto com equipes de emergência e funcionários da Prefeitura para ajudar os animais pegos pelos deslizamentos, desmoronamentos e enchentes.
A Coordenadoria de Bem-Estar Animal de Petrópolis (Cobea) estima que ao todo mais de 400 foram resgatados na cidade até agora.
"As áreas que foram afetadas tinham várias famílias", explica Raphaela Buriche, coordenadora do Cobea.
Muita gente fugiu correndo só com a roupa do corpo. Alguns conseguiram salvar os animais. Outros, não.
Agora, já passou o mais crítico - a procura pelos animais no meio dos escombros.
O trabalho nesse momento é para tirar os que não conseguiram sair das áreas de risco e cuidar da saúde deles.
"Os animais estão muito assustados e arredios, e a gente precisa atravessar barreira caída, ir em área que tem perigo de desabar. Está bem difícil e exaustivo, mas é gratificante porque são vidas que a gente consegue salvar", diz Raphaela.
Também é preciso encontrar um lugar para receber os animais.
Vários perderam seus donos - mais de 180 pessoas morreram no desastre, e dezenas ainda estão desaparecidas.
Também tem quem só aceita sair de casa se os bichos também tiverem para onde ir.
Muitas pessoas ficaram sem teto e foram para abrigos ou para outros lugares onde não dá para os animais ficarem.
Os animais estão sendo levados para lares temporários, e clínicas estão atendendo voluntariamente os feridos.
"Os animais são às vezes o único elo das pessoas com tudo que elas perderam, o vínculo que fica com o lugar em que elas moravam", diz Carla Sássi, do Grad.
'Atenção com os animais mudou'
A veterinária conta que começou a fazer esse trabalho depois de ver na TV uma mulher perder seu cachorro na enxurrada em Nova Friburgo há 12 anos.
Ela decidiu ir para lá ajudar por um final de semana e acabou ficando um mês. Criou depois a ONG junto com mais dois veterinários.
O Grad já trabalhou em outras tragédias, como o rompimento da barragem de Brumadinho, os incêndios no Pantanal e as enchentes no Acre.
Carla diz que, de todas, o rompimento da barragem em Mariana foi um ponto de virada para a atenção com os animais em desastres.
Antes, eles ficavam em segundo plano, eram invisíveis, diz a veterinária. "Eles não eram tratados como vítimas."
"Mas, em Mariana, o número de animais era gigantesco. Era uma zona rural, e os animais tinham um papel muito importante na vida das pessoas. Ali, a percepção mudou."
'Difícil prever quando os resgates vão acabar'
Ela afirma que uma das grandes dificuldades em Petrópolis tem sido chegar nos pontos de deslizamentos, porque há muito engarrafamento por toda a cidade.
"Também tem alerta de chuvas todos os dias, e qualquer chuva agrava a situação."
Carla estima que o Grad deve salvar mais 100 a 150 animais nos próximos dias em Petrópolis.
Raphaela Buriche, do Cobea, diz que ainda não consegue dizer quando os resgates vão terminar.
"Queria ter essa resposta, mas não tenho", diz ela.
"São muitas áreas de desabamento, e a cada momento chegam novas informações de animais que precisam de ajuda."
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