A titular da Delegacia da Criança e Adolescente Vítima, Cristiana Bento, disse que a Polícia Civil vai voltar à casa no alto do Morro São José Operário, na Praça Seca, em Jacarepaguá, local onde ocorreu o estupro coletivo de uma jovem de 16 anos.
A decisão da polícia de voltar à comunidade na zona oeste do Rio foi tomada a partir do depoimento de Raphael de Assis Duarte Belo, de 41 anos. A delegada Cristiana Bento informou que, devido à importância do três suspeitos para as investigações, eles ainda não serão transferidos para um presídio do Estado.
Programa de proteção
A jovem vítima de estupro e sua família já foram encaminhadas pela Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos para o Programa de Proteção à Criança e ao Adolescente. O programa é mantido com recursos do governo federal com contrapartida do governo do Estado e é gerenciado por um conselho ligado ao Ministério da Justiça. Não há período previsto para a manutenção da família no programa. O prazo depende da avaliação dos profissionais de segurança e dos técnicos do programa, assim como do desejo da vítima em continuar sendo atendida.
Pelas regras do programa, nenhuma autoridade é informada da localização da vítima, que pode, inclusive, ter a identidade mudada. No período, ela receberá atendimento médico, psicológico e jurídico e, na medida do possível, terá mantido o padrão de vida.
“Havia um risco potencial à segurança da jovem, por isso achamos providencial a sua entrada no programa de proteção. A ameaça de morte era real", disse o secretário de Assistência Social e Direitos Humanos, Paulo Melo.
Câmara
A comissão externa de deputados que vai fiscalizar os atos de apuração do crime de estupro coletivo tem até a próxima terça-feira (7) para apresentar resultados. A proposta a ser elaborada deve reunir sugestões que já estão em tramitação na Câmara dos Deputados, que qualificam penalmente o crime, e determinam medidas de prevenção, punição e atendimento a este tipo de prática.
O presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA) se comprometeu a colocar o texto em votação já na próxima semana, caso o grupo consiga concluir o projeto a tempo de apresentá-lo ao colégio de líderes na tarde do dia 7, quando será discutida a pauta de votações. A comissão foi criada há apenas dois dias.
Na primeira reunião formal do grupo, realizada hoje (2), a presidente da comissão, Soraya Santos (PMDB-RJ), disse que o trabalho partirá de uma proposta que já havia sido elaborada pela bancada feminina da Casa, ainda no ano passado. O Projeto de Lei 2.265/15 triplica a pena nos casos de estupro coletivo praticado por três ou mais pessoas. Se duas pessoas praticarem o crime, a pena será em dobro.
“Primeiro, a comissão vai fazer a triagem do que já está maduro, porque não podemos mudar projetos de lei em um final de semana. Abriremos com o projeto da bancada feminina que já trata do tema, e com outros sobre o mesmo assunto. Vamos tentar agregar no mérito, e fazer um guarda-chuva [de ações previstas]”, afirmou Soraya. A deputada agendou para a manhã de terça-feira (6) uma nova reunião do colegiado, para concluir o texto. “Na segunda-feira, estaremos no Rio de Janeiro, por isso temos que nos reunir aqui, na manhã de terça”, completou.
A deputada disse que, no dia 6, um grupo de parlamentares que integram a comissão vai até a capital fluminense para conversar com o governador em exercício do Rio de Janeiro, Francisco Dornelles e com o secretário de Estado de Segurança do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, sobre a apuração do caso ocorrido em maio. A parlamentar também defendeu que outra comitiva siga para o Piauí, a fim de acompanhar as investigações de crime similar ocorrido na região, praticado contra uma adolescente de 17 anos, em Bom Jesus.
Em 2015, segundo dados do Disque 100, foram registradas 17.588 denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes, equivalentes a duas por hora. Ao todo, foram 22.851 vítimas, sendo 70% delas meninas. De acordo com o 9º Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, uma mulher é estuprada a cada 11 minutos no Brasil. Como a proposta é ampliar o trabalho da comissão, para alcançar o crime de estupro coletivo de forma geral, Soraya ainda sugeriu alteração do nome da comissão.
Proposta
A deputada disse que iniciou conversas com o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, e com a ex-deputada Fátima Pelaes, secretária de Políticas para Mulheres, para tentar conduzir o trabalho em parceria com ações do Executivo. Na proposta que será apresentada em plenário, Soraya destacou que estão previstas medidas a serem adotadas por todos os Poderes.
No PL 2665/15, a bancada alerta que apenas 35% das vítimas costumam relatar o episódio à polícia, o que pode significar que o Brasil tenha "convivido" com cerca de 143 mil estupros em 2013, e não os 50,3 mil casos relatados no 8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública no mesmo ano.
O deputado delegado Edson Moreira (PR-MG) sugeriu que a lei preveja “preferencialmente” que a apuração de casos de estupro seja conduzida por agentes mulheres. Rebatendo a proposta, Soraya disse que, em conversa com delegadas, se surpreendeu com os elogios direcionados aos delegados homens nestas apurações. Para ela, o caso do Rio, em que o delegado foi afastado do caso depois de denúncias feitas pela vítima, foi uma exceção, por ter conduzido a conversa na presença de outros três homens e com uma abordagem errada.
“Não estamos querendo limitar homens e mulheres. O que as mulheres não querem é serem tratadas como coisas, no sentido de posse e, muitas vezes, piores que animais. Não porque é homem, mas porque o cidadão não respeitou a vítima”, afirmou.
Médico legista, o deputado Dr. João (PR-RJ) reforçou que a tese da exclusividade de atendimento da mulher por outra mulher “não vai resolver o problema”. “Sou mé
dico, e 90% dos meus pacientes são mulheres”, afirmou. O parlamentar lembrou que o crime de atentado violento ao pudor deixou de estar previso na lei penal. “Quando tinha um caso de atentado ao pudor era 10 anos de cadeia, e para estupro, outros 10 anos, e quando praticavam os dois, ia para 20. Quando houve absorção dos dois [crimes], quem foi beneficiado foi o agressor. Isto provocou redução da pena”, alertou.
Dr. João ainda defendeu que esteja incluída na proposta a reestruturação do Instituto Médico Legal (IML). “As condições para atendimento à mulher é absolutamente constrangedora. Existe ainda uma proposta para que não fosse mais feito o atendimento destas mulheres nos IMLs, mas nos hospitais”, acrescentou.
Outras medidas que podem entrar no projeto são a previsão de delegacias para mulheres em todos os municípios com mais de 60 mil habitantes e a criação de um fundo de enfrentamento da violência contra a mulher.