O advogado de 12 policiais militares do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) acusados de participar do chamado massacre do Carandiru, Celso Vendramini, ameaçou abandonar pela segunda vez o júri popular que será realizado nesta segunda-feira, em São Paulo, mais de 22 anos após o episódio. À época, 111 presos foram assassinados no pavilhão 9 do complexo penitenciário.
O júri seria o quarto e último do caso. O terceiro julgamento, entretanto, foi adiado mês passado depois de Vendramini alegar parcialidade do juiz que preside o júri, Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo, durante o interrogatório do primeiro de 15 réus.
O julgamento do caso foi dividido em etapas - conforme as peças da acusação, de acordo com a ordem de entrada de diferentes pelotões da PM em andares distintos do pavilhão 9 do Carandiru. Ano passado, por exemplo, um primeiro júri do caso terminou em abril com a condenação de 23 PMs a 156 anos de prisão pelo assassinato de 13 detentos que estavam no segundo pavimento da unidade.
Em agosto, outros 25 policiais foram condenados a 624 anos de reclusão pela morte de 52 detentos do terceiro pavimento. O júri adiado de fevereiro foi adiado para 31 de março pelo juiz, que ainda aplicou multa de 70 salários mínimos (R$ 50.680) ao advogado.
Em entrevista ao Terra, Vendramini afirmou ter requerido ao juiz que ele se declarasse suspeito de presidir os júris seguintes e deixasse o caso. Como o magistrado negou, o advogado apelou ao Tribunal de Justiça de São Paulo para que o novo julgamento fosse suspenso. O desembargador Ivan Sartori negou o pleito.
"As perguntas aos réus precisam ser objetivas - no júri passado não foram graças ao Ministério Público, e, neste, tenho certeza que o ambiente vai estar pior ainda. Não tenho tanto dinheiro quanto o juiz para pagar essa multa e vou com paz no coração, mas, se for preciso abandonar novamente e multado mais uma vez, o farei. Não vou me sujeitar a coisas erradas no Tribunal do Júri", ameaçou o advogado, que não quis dizer se os réus - serão 10, já que dois morreram -permanecerão em silêncio ou falarão.
Vendramini afirmou ainda que "não há provas, não há testemunhas, não há nenhum exame de balística" capaz de comprovar que os PMs do Gate efetivamente atuaram no quinto pavimento. "Eles estiveram no terceiro pavimento e não nega que efetuaram tiros lá, pois foram recebidos a tiros; quanto ao quinto pavimento, não podem assumir algo que não fizeram - e desde 1992 estão dizendo isso, mas faltou investigação", alfinetou.
"Júri não é como advogado quer", diz promotor
Pela acusação, novamente vão atuar os promotores Márcio Friggi e Eduardo Olavo Canto Neto. Para Canto Neto, que se mostrou surpreso com a ameaça de novo abandono feita pelo advogado dos PMs, "a expectativa é de que os trabalhos sejam muito tranquilos".
"Vamos tentar fazer nosso trabalho; estamos preparados, a prova foi bem reunida e esperamos que o advogado não faça isso (abandonar o júri). O juiz não atuou de forma abusiva no júri passado, e o advogado precisa entender que um juro precisa ser realizado conforme o Código de Processo Penal, e não do jeito que ele quer", disse.
Pela defesa, fora arroladas como testemunhas agentes penitenciários e o desembargador Fernando Antonio Torres Garcia, à época do massacre, juiz corregedor dos presídios paulistas.
Pela acusação, novamente - a exemplo dos júris passados - serão ouvidos o perito Osvaldo Negrini Neto, sobreviventes do massacre e o ex-diretor de disciplina da Casa de Detenção Moacir dos Santos.
O júri acontece no Plenário 10 do Fórum Criminal da Barra Funda, zona oeste de São Paulo, a partir das 9 horas. A previsão é que o julgamento dure uma semana.