Crescimento de facções criminosas em cidades da Amazônia Legal chega a 46%; estudo aponta impactos no desmatamento

Levantamento aponta que 260 municípios, o equivalente a 33,7% das cidades da região, registram atuação de grupos ligados ao narcotráfico

11 dez 2024 - 13h13
(atualizado às 13h55)
Pichação de facção determinando as regras na região de Vila do Conde, município de Barcarena-PA
Pichação de facção determinando as regras na região de Vila do Conde, município de Barcarena-PA
Foto: Acervo do IMC (Junho/2024)

Em 2024, houve um aumento de 46% no total de municípios da Amazônia Legal com atuação de facções criminosas, conforme aponta o estudo "Cartografias da Violência na Amazônia", publicado nesta quarta-feira, 11, pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em colaboração com o Instituto Mãe Crioula (IMC). O levantamento aponta que 260 municípios, o equivalente a 33,7% das cidades da região, registram atuação de grupos ligados ao narcotráfico.

A Amazônia Legal, composta por nove Estados (Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Maranhão), abrange 772 municípios e é responsável por 61,9% da Pan-Amazônia. Cercada por países fronteiriços como Bolívia, Peru, Colômbia e Venezuela, a região se torna um ponto estratégico para o tráfico transnacional de drogas e armas, como identificou o levantamento.

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Segundo o estudo, o Comando Vermelho (CV) é a organização criminosa mais interiorizada, presente em 130 municípios. Em seguida, o Primeiro Comando da Capital (PCC) domina 28 cidades. Outras facções também são bastante atuantes em alguns estados, como o Bonde dos 40, no Maranhão, e os Piratas dos Solimões, no Amazonas, que concentram suas atividades em roubos de cargas e contrabando de drogas provenientes de países da região andina, composta por nações da América do Sul como Colômbia, Peru e Bolívia.

O estudo também identificou uma tendência de estabilização dos conflitos entre as facções, com uma queda no número total de grupos ativos: de 22 facções em 2023 para 19 em 2024. No entanto, a dinâmica do crime organizado continua em constante transformação, com divergências, formação de novos grupos e alianças dentro do sistema prisional que impulsionam a expansão territorial dessas organizações.

O crescimento das facções criminosas na Amazônia tem agravado a situação da segurança pública, não só em relação ao tráfico de drogas, mas também com o impacto sobre as comunidades locais, como ribeirinhos, extrativistas e indígenas. A violência associada ao narcotráfico e ao controle territorial tem levado a um aumento de homicídios e outros crimes violentos.

A pesquisa apontou, por exemplo, que a chegada das facções criminosas ao interior da Amazônia tem também amplificado a violência de gênero, especialmente contra mulheres indígenas, ribeirinhas e negras. Em muitos casos, o crime organizado regula conflitos e intervém em situações de violência doméstica, punindo mulheres que se relacionam com membros de facções rivais ou que rompem esses relacionamentos. As punições podem variar de humilhações públicas a assassinatos. 

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A violência de gênero, associada à expansão do crime organizado, tem dificultado a implementação de políticas públicas eficazes de proteção às mulheres em situação de violência doméstica. A presença de facções criminosas nos territórios impede muitas mulheres de denunciar abusos, devido ao medo de retaliação. Em muitos casos, a aplicação da Lei Maria da Penha torna-se inviável, já que as medidas protetivas de urgência não podem ser monitoradas de forma eficaz em áreas dominadas por facções.

Narcotráfico e crimes ambientais

O narcotráfico exerce influência direta em outros crimes na região, como grilagem de terras, contrabando de madeira e mineração ilegal. Esses grupos também utilizam setores como o agronegócio para lavagem de dinheiro. A Amazônia Legal se consolidou como rota estratégica para o escoamento de drogas vindas de países produtores de cocaína, como Colômbia, Peru e Bolívia, além de ser ponto de exportação direta para o mercado internacional, através de portos como Vila do Conde (PA) e Manaus (AM).

A luta pelo controle das rotas do narcotráfico se mistura com antigos conflitos sobre a posse de terras e disputas pela exploração do solo, abrangendo desde o desmatamento até a atividade de garimpo. O ponto em comum entre essas questões é o uso da força para dominar esses territórios.

Além disso, os crimes se interligam e se complementam e estudo também revela uma conexão direta entre a degradação ambiental e a violência. Os pesquisadores identificaram nove fatores principais de desmatamento, incluindo áreas de expansão econômica que trouxeram violência em sua trajetória. Entre as que mais impactaram o meio ambiente, destacam-se as rodovias Cuiabá-Santarém e Transamazônica.

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Imposição e controle comunitário

Conforme o estudo, as facções não apenas dominam territórios, mas também impõem regras nas comunidades sob seu controle, muitas vezes através de pichações com ordens como “proibido roubar na comunidade”. Práticas como extorsões a comerciantes, roubos em vias fluviais e disputas violentas pelo controle territorial também fazem parte das estratégias de atuação desses grupos.

Violência estrutural e histórica

O estudo ressalta que a violência na Amazônia não é um fenômeno recente, ligado apenas à atuação das facções criminosas. Processos históricos de ocupação e exploração econômica, como a expansão da fronteira agrícola, grandes projetos minerais e a construção de infraestrutura, contribuíram para criar espaços marcados pela desigualdade, precariedade e expropriação de populações tradicionais. Esses fatores resultaram em exploração sexual, trabalho análogo à escravidão e assassinatos de lideranças.

Expansão para o ciberespaço

Os grupos criminosos também ampliaram sua atuação para as redes sociais, onde promovem sua “cosmologia do crime” através de músicas e conteúdos que exaltam suas dinâmicas locais. Esse tipo de propaganda é amplamente acessível, enquanto as plataformas digitais ainda apresentam baixo controle sobre esses materiais.

Fonte: Redação Terra
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