Mesmo debaixo de chuva fina na maior parte do tempo, centenas de pessoas se reuniram nesta quinta-feira (15) na Praça Santos Andrade, em Curitiba, para homenagear a vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e o motorista Anderson Pedro Gomes, assassinados a tiros na noite anterior, no centro do Rio de Janeiro. A vigília começou por volta das 18h30, nas escadarias da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Às 20h20, lideranças ainda discursavam.
Embora convocado pelo PSOL, partido da vereadora, e pela #PartidA, movimento feminista do qual ela fazia parte, o ato reuniu militantes de legendas, coletivos e organizações sociais diversas, além de estudantes e artistas.
O público levou velas, faixas, flores e cartazes com dizeres como "vidas negras importam", "Marielle Presente" e "Quantos mais morrerão?". Nas falas, nos gritos e nas músicas, sempre acompanhadas de batuques, a atuação aguerrida de Marielle em defesa das mulheres, sobretudo das negras, periféricas, mães e LGBTs (lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais), como ela, era a todo momento lembrada.
Para Carla Cobalchini, militante do Mais, uma das correntes do PSOL, e servidora da UFPR, a morte da vereadora não pode ser em vão. "O tiro que acertou a Marielle acertou a cada um de nós. E hoje nosso dever aqui é transformar nosso luto em luta. Temos de dizer com todas as letras que o que aconteceu foi uma execução política", afirmou.
Na avaliação da jornalista Waleiska Fernandes, da #partidA, o assassinato da parlamentar, uma das sete mulheres entre 51 vereadores da capital fluminense, foi, acima de tudo, machista e racista. "Ninguém quer mulher no poder e ninguém quer preto no poder. Faço um apelo a todas e todos que estão aqui. A gente quer de novo votar em branco e rico? Que tenhamos coragem. Que a Marielle seja semente para florescer dentro de nós e a gente ocupe todos os espaços que puder".
Ente os presentes estava também o presidente do PT no Paraná, Dr. Rosinha. "O golpe que se instalou hoje é uma ditadura, uma ditadura do Poder Judiciário, que tem sido conivente com todos os homicídios e principalmente feminicídios (assassinatos cometidos com viés de gênero) nesse país. Mas nós não vamos nos calar. Continuaremos nas ruas e nas praças", disse.
Outras cidades
Protestos semelhantes aconteceram em outras cidades paranaenses, caso de Ponta Grossa, Cascavel e Maringá, e na maioria das capitais brasileiras. Em Londrina, no Norte do Estado, quem promoveu a manifestação foi o grupo “Sociedade de Pretas Elegantes do Brasil”, que fez igualmente um alerta para o genocídio da população negra. A concentração se deu a partir das 17 horas, na rotatória das avenidas Juscelino Kubitscheck e Higienópolis.
Nascida e criada no Complexo da Maré, a parlamentar de 38 anos vinha denunciando em suas redes sociais diversos ataques cometidos contra jovens nas comunidades cariocas desde o início da intervenção federal na segurança pública, há um mês. “Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe”?, questionou, no Twitter, um dia antes de ser executada. O post fazia referência a Matheus Melo, de 23 anos. A família acusa policiais de terem assassinado o rapaz quando ele saía de moto do Jacarezinho, no último dia 2.
Marielle também tinha acabado de tornar pública uma ação truculenta da Polícia Militar (PM) na região do Itajá, na comunidade de Acari. Socióloga e mestra em Administração Pública, ela conquistou mais de 46 mil votos em sua primeira eleição, em 2016, fazendo da defesa dos direitos humanos sua principal bandeira. Presidiu a Comissão de Defesa das Mulheres e havia assumido, no dia 28 de fevereiro, a relatoria de uma comissão criada na Câmara Municipal para acompanhar a intervenção no Rio.
O crime
A vereadora e o motorista que a acompanhava foram mortos a tiros dentro de um carro na Rua Joaquim Palhares, no bairro do Estácio, por volta das 21h30 de quarta-feira (14). Uma terceira passageira, assessora de Marielle, foi atingida por estilhaços e, apesar do choque, passa bem. A principal linha de investigação da Delegacia de Homicídios é execução. A perícia encontrou nove cápsulas de tiros no local. Os criminosos fugiram sem levar nada.
Em nota, o PSOL ressaltou a atuação da parlamentar, informou que honrará sua luta e exigiu apuração imediata e rigorosa do crime.
Veja a íntegra:
“Estamos ao lado dos familiares, amigos, assessores e dirigentes partidários do PSOL/RJ nesse momento de dor e indignação. A atuação de Marielle como vereadora e ativista dos direitos humanos orgulha toda a militância do PSOL e será honrada na continuidade de sua luta. Não podemos descartar a hipótese de crime político, ou seja, uma execução. Marielle tinha acabado de denunciar a ação brutal e truculenta da PM na região do Irajá, na comunidade de Acari. Além disso, as características do crime com um carro emparelhando com o veículo onde estava a vereadora, efetuando muitos disparos e fugindo em seguida reforçam essa possibilidade. Por isso, exigimos apuração imediata e rigorosa desse crime hediondo. Não nos calaremos!
Marielle, presente!
Partido Socialismo e Liberdade
14 de março de 2018.”