A esposa de Cleiton Barbosa Moura, uma das vítimas da operação policial em Guarujá, no litoral de São Paulo, alegou que o marido foi executado pela polícia. Ao Terra, ela contou que Cleiton foi arrastado de sua residência até um mangue, onde foi "fuzilado" na presença do filho de apenas 10 meses.
A Polícia Civil, por sua vez, afirma que as 13 mortes ocorreram durante confrontos com os agentes na Operação Escudo, deflagrada após o assassinato do soldado Patrick Bastos Reis na comunidade Sítio Conceiçãozinha, em Guarujá.
Cleiton, de 24 anos, foi morto a tiros ao lado de casa, na Rua Operária, no Sítio Conceiçãozinha, em 29 de julho. De cima do barraco, sua esposa, aos prantos, mostrou o sangue no local e contou detalhes do ocorrido.
"Dois policiais entraram aqui dentro de casa, tiraram ele daqui, pegaram o neném dele. Levaram-no ali para trás do corredor, se você for ver ainda tem a poça de sangue, e deram um tiro de fuzil. Foi o que o matou", disse a mulher que optou por não revelar seu nome.
Ela também afirmou que o marido trabalhava como ajudante de pedreiro, mas havia sido detido por tráfico de drogas em 2020.
"Ele nunca mais mexeu com drogas. Ele estava trabalhando como ajudante de pedreiro. Estávamos pagando a casa e as contas. Não tenho nada para comer. Agora, estou sozinha com 5 crianças em casa, como vou fazer?", disse emocionada.
A esposa de Cleiton também alegou que os policiais "forjaram" crimes contra ele. Segundo ela, os agentes teriam colocado drogas dentro de uma das mochilas de seu filho e registrado que o marido estava portando uma pistola no local.
"Além de matar meu esposo, eles o forjaram com drogas, com arma e ainda levaram os 2 celulares do meu filho. Isso não poderia ter sido feito por um pai de família; tirar ele de dentro de casa e, além disso, fazer a abordagem e matar sem ele ter feito nada. Eles não estão respeitando ninguém", declarou.
Detalhes sobre a morte de Cleiton
A mulher relatou que vivia com Cleiton e mais 5 filhos. De acordo com a viúva, no dia do ocorrido, ela estava trabalhando fora de casa e havia deixado o marido cuidando da criança.
A mulher relatou ao Terra que recebeu informações de que policiais invadiram o imóvel e arrastaram Cleiton para fora, conduzindo-o até uma área próxima à casa. Ela afirmou que o marido foi executado por um tiro de fuzil.
Logo após a suposta execução, segundo ela, um dos filhos dela, de apenas 13 anos, retornou à residência e testemunhou a situação.
"Eles [ policiais] perguntaram ao meu filho: 'ele mexe com vocês? Maltrata?' Meu filho disse que não. E foi aí que esse policial [retornou ao beco e] deu 2 tiros para o alto, para fingir que foi o meu esposo".
Por fim, ela relatou que um policial entregou o bebê ao filho, antes dos agentes deixarem o local.
Moradores denunciam abusos
Outros moradores afirmam que não houve troca de tiros nas mortes ocorridas na comunidade. Eles afirmaram que Cleiton foi a primeira vítima, e que o outro rapaz morto ontem não pertencia à comunidade, pois ninguém o conhecia ou sabia de sua identidade.
Segundo relatos, a Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) já o trouxe dentro da viatura. Em seguida, mandou que o rapaz entrasse no mato, onde, na sequência, atiraram contra ele.
'Muito sangue derramado'
Após as 12 mortes, a comunidade Sítio Conceiçãozinho não esconde o medo e evita sair de dentro casa. Com comércios e ruas vazias, uma atendente de um estabelecimento relatou ao Terra que o clima é de tensão.
"Ontem estava cheio de polícia. O povo fica meio assustado. A gente tem medo de sair e ter uma troca de tiros, de ter crianças passando na hora, trabalhadores passando pela rua", disse ela, enquanto limpava a bancada do bar onde trabalha. No comércio, que normalmente costuma ter movimento, não havia nenhum cliente.
Poucos metros a frente, um jovem nascido e criado na comunidade afirmou que a violência está se estendendo em todas as comunidades. "Está terrível em todas as quebradas, aqui está tendo muita violência policial e todos os comércios estão fechando cedo".
Outra moradora, que vive no bairro há 25 anos, era a única na calçada de casa. Ela relata que a região onde vive, pouco após a entrada da comunidade, costuma ser muito tranquila. No entanto, durante a operação policial, ela e seus vizinhos optam por evitar sair de casa.
"Só estou aqui fora porque tô varrendo mesmo. A situação está como em todas as favelas, muito policial, muito sangue derramado. O comentário que tá é que tiraram o rapaz de dentro de casa e mataram" disse ela, ao se referir a morte Cleiton.
"Aqui estamos com muito medo, 19 horas as casas e comércios estão todos fechados. Até porque tem toque de recolher, né? Aqui só está saindo quem tem que trabalhar mesmo, que não tem como não sair. Isso mudou toda nossa rotina, a gente tem medo de sair pra fazer qualquer coisa. Tem muita gente revoltada. E isso acontece só onde é favela né, nos bairros ricos não acontece nada", completou.
O Terra passou 2 horas na comunidade e, durante o período, presenciou a patrulha da Rota pelas ruas do bairro.
Na noite de segunda-feira, 31, moradores realizaram uma manifestação na entrada do bairro Sítio Conceiçãozinha, em Guarujá, em protesto contra a operação da Polícia Militar (PM).
*Com colaboração de Hugo Barbosa.