A Igreja Universal do Reino de Deus, liderada pelo bispo Edir Macedo, pressionou o governo brasileiro e usou sua influência no Congresso nas últimas semanas em busca de apoio político para tentar solucionar os conflitos em Angola envolvendo a direção brasileira da denominação e religiosos locais.
Em junho, bispos e pastores da Universal no país romperam com a cúpula da igreja, assumiram o controle dos templos e expulsaram os colegas brasileiros.
O presidente Jair Bolsonaro, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o embaixador do Brasil em Angola, Paulino Franco de Carvalho Neto, e representantes do Congresso têm assumido posições em defesa da Universal.
A igreja afirma que pastores brasileiros foram agredidos e colocados para fora de suas casas, e 65 de seus missionários no país estariam sofrendo ameaças.
Por outro lado, os angolanos acusaram a direção brasileira da IURD - em um manifesto assinado por 320 bispos e pastores - de supostos crimes como evasão de divisas, expatriação ilícita de capital, racismo, discriminação, abuso de autoridade e imposição da prática de vasectomia aos pastores.
Os rebelados dizem totalizar 362 dos 464 pastores em atividade em Angola - enquanto a Universal afirma que seriam "ex-seguidores" - e afirmam ter o controle de 220 dos cerca de 300 templos da igreja no país.
A IURD diz que 30 templos foram tomados. Em uma nota, a igreja definiu os opositores da direção brasileira como um grupo de religiosos "desvinculados da instituição por práticas e desvio de condutas morais e, em alguns casos, criminosas e contrárias aos princípios cristãos exigidos de um ministro de culto".
Bolsonaro enviou uma carta, na segunda-feira (13/07), ao seu colega presidente de Angola, João Lourenço, manifestando preocupação com os acontecimentos no país e pedindo o aumento de proteção aos brasileiros.
"Meu apelo a Vossa Excelência é para que, sem prejuízo dos trâmites judiciais, com seu tempo próprio, se aumente a proteção de membros da IURD, a fim de garantir sua integridade física e material e a restituição de propriedades e moradias, enquanto prosseguem as deliberações nas instâncias pertinentes", reivindicou Bolsonaro.
O deputado federal e filho do presidente Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) postou a carta no Twitter, reforçando o pedido.
PERSEGUIÇÃO A PASTORES DA UNIVERSAL EM ANGOLA
Por trás das agressões e expulsões há tb o desrespeito à liberdade religiosa, de imprensa e direitos humanos. Esperamos que as autoridades angolanas resolvam eventuais conflitos de maneira civilizada. @recordtvoficial @jornaldarecord pic.twitter.com/qlyIvvlLtl
— Eduardo Bolsonaro🇧🇷 (@BolsonaroSP) July 13, 2020
Uma comissão de senadores e deputados brasileiros deverá visitar Angola no início do próximo mês para pedir ao governo local que seja garantida no país a "reciprocidade de tratamento" a cidadãos brasileiros, tal como os angolanos usufruem no Brasil.
Viagem de parlamentares
O senador Major Olímpio (PSL-SP), membro da Comissão de Relações Exteriores do Senado, entende que os direitos de brasileiros ligados à igreja estariam sendo desrespeitados.
Um pedido do senador para o envio de parlamentares brasileiros a Angola para checar a situação foi aprovado na Comissão de Relações Exteriores do Senado, na quinta-feira.
A visita deverá ocorrer na segunda semana de agosto, porque no momento não é permitida a entrada no país, devido à pandemia do coronavírus.
Além do Major Olímpio, Nelsinho Trad (PSD-MS) e Marcos do Val (Podemos-ES) também apresentaram requerimentos no Senado sugerindo a formação da comissão para apurar "a grave situação da Igreja Universal do Reino de Deus que sofre perseguição religiosa" e os supostos atos de violência contra pastores brasileiros.
Os parlamentares pediram ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que requisite um avião da Força Aérea Brasileira para viabilizar a missão.
A Universal saiu em busca de apoio político e passou a denunciar nos veículos de comunicação de seu grupo que estaria sendo vítima de perseguição, depois que o Serviço de Investigação Criminal (SIC) da Polícia Nacional de Angola iniciou, na sexta-feira (10), ações de busca e apreensão em residências de bispos e pastores, escritórios e templos religiosos da instituição em Angola.
A polícia local cumpria determinação judicial. Os policiais apreenderam computadores, câmeras de segurança, livros contábeis e documentos bancários.
Um processo-crime foi aberto na polícia de Angola para investigar as denúncias de pastores angolanos, em novembro de 2019, quando começaram os protestos de religiosos locais contra a direção da IURD.
O caso foi encaminhado à Procuradoria Geral da República angolana e, daí, seguirá para um tribunal. As duas partes ainda devem ser chamadas a depor.
Reação no Brasil
A TV Record, ligada à Universal, exibiu dezenas de depoimentos em apoio à igreja, vindos de políticos de vários partidos e de empresários como Paulo Skaf, presidente da Fiesp.
Bispos e pastores da Universal também estão pedindo aos fiéis, nos templos do Brasil e de todo o mundo, para enviarem cartas e mensagens de protestos ao presidente de Angola, João Lourenço, e ao embaixador do país no Brasil, Nelson Manuel Cosme.
As autoridades angolanas não têm se manifestado sobre as investigações no país envolvendo a Universal.
Mas a TV Pública Angolana (TPA) exibiu reportagens ressaltando o bom relacionamento e a amizade entre os povos dos dois países. Mostrou, entre outros, o depoimento de Camila Silveira, diretora da Câmara de Comércio Brasil Angola.
"Os dois países têm uma sincronia no comércio, na amizade entre os povos. Existe uma união completa e perfeita", garantiu.
Em reportagens da TPA, pastores angolanos que se opõem à direção brasileira da IURD têm tido espaço para expor suas queixas e protestos. Por isso, a emissora foi criticada pelo responsável pela Universal no país, o bispo brasileiro Honorilton Gonçalves.
Um advogado e analista político angolano, Hélder Chihuto, questionou nas redes sociais a participação de Bolsonaro e parlamentares brasileiros em uma "questão interna de caráter institucional" de Angola.
O advogado lembrou que a Igreja Universal em Angola é uma instituição "de direito angolano" e está submetida às leis do país. Para ele, a pressão "viola o princípio internacional de não ingerência entre os Estados".