O feriado de 7 de Setembro se tornou a mais elevada aposta política de Jair Bolsonaro desde que assumiu o Palácio do Planalto. Em um momento de isolamento, o presidente acirrou as tensões institucionais ao convocar manifestações de apoio a seu governo e ataques a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Essa é a opinião majoritária de analistas e políticos ouvidos pelo Estadão.
Bolsonaro participou e discursou nos eventos em São Paulo e Brasília. No sentido oposto, grupos de esquerda também programam atos em quase 200 municípios contra o governo, o que motivou autoridades da segurança pública a criarem esquemas inéditos de policiamento para evitar embates entre os manifestantes, especialmente no transporte público.
Bolsonaro e apoiadores intensificaram a convocação para os atos nos últimos 30 dias após a rejeição da PEC do voto impresso na Câmara dos Deputados. O STF decretou a prisão de bolsonaristas que ameaçaram ministros da Corte. A Procuradoria-Geral da República viu 'levante' em atos convocados por apoiadores de Bolsonaro, que chegou a comparar as manifestações a um 'ultimato' contra os ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso.
O movimento ocorre em um cenário de inflação próxima dos dois dígitos, crise hídrica e risco de racionamento energético, avanço de investigações contra filhos do presidente na Justiça Federal e no Rio, e o Brasil perto da marca de 600 mil mortos pela covid-19.
"Numa dinâmica de apostas, o presidente tem poucas opções no campo da institucionalidade. A não ser que tenha ases nas mangas, que não conseguimos enxergar, sua estratégia é ameaçar virar a mesa. A sociedade parece disposta a pagar para ver", disse o cientista político Carlos Melo.
Em São Paulo, na Avenida Paulista, caravanas de apoiadores vindas do interior e de outros Estados marcaram presença. Tornar o ato 'gigantesco', como foi convocado pelos aliados do presidente, é o ponto central na estratégia de confronto adotada por Bolsonaro. O real impacto da convocação nas ruas em todo o País ainda é incerto. Dados de monitoramento das redes sociais indicam que o assunto está concentrado em determinados perfis, com baixo engajamento fora do campo bolsonarista mais fiel.
Cientistas políticos veem os atos como parte de uma estratégia de sobrevivência de Bolsonaro, diante da falta de agenda e de propostas para reverter o contexto negativo. "Sem poder agir da maneira que ele gostaria, ele radicaliza", avalia Carolina Botelho, pesquisadora do Laboratório de Neurociência Cognitiva e Social/Mackenzie. José Alvaro Moisés, da USP, afirmou que não foram episódios, como a prisão do ex-deputado Roberto Jefferson e a rejeição do impeachment do ministro Alexandre de Moraes que construíram o contexto dos atos, mas sim, uma forma de fazer política que combina atos, gestos e proclamações públicas que "corroem a democracia por dentro".
"Ao mesmo tempo, em que mobiliza segmentos da sociedade a favor de suas posições para pressionar as instituições democráticas legais e constitucionais, ele pressiona as Forças Armadas para, eventualmente, terem um tipo de participação que extrapole as suas funções constitucionais."
Dirigentes partidários de centro-direita ouvidos pelo Estadão relativizam eventuais ganhos eleitorais do presidente com a aposta no 7 de Setembro. "Não muda nada. Existe uma diferença entre torcedor e eleitor. Quem vai para a rua entrar em uma linha de discurso igual é torcedor", afirmou o presidente do DEM, ACM Neto.
"A população não quer saber quem coloca mais gente na rua. Ela quer saber quem vai resolver o problema do preço do arroz, feijão, da luz, quem vai resolver a vacina, quem vai apresentar as políticas públicas", disse Gilberto Kassab, presidente do PSD.