Áudios mostram que ex-chefe da Receita pressionou cúpula do órgão para reaver joias para Bolsonaro

Governo Bolsonaro tentou entrar no país com joias avaliadas em R$ 16,5 milhões de forma ilegal. Diamantes ficaram retidos na alfândega da Receita em Guarulhos

19 abr 2023 - 21h09
(atualizado às 21h29)
Foto: Estadão

Áudios enviados por WhatsApp comprovam que o ex-chefe da Receita Federal Júlio César Vieira Gomes pressionou funcionários da cúpula do órgão, no fim de 2022, em uma tentativa de reaver as joias sauditas dadas de presente ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL). Conforme o Estadão revelou, um conjunto de colar, anel, relógio e um par de brincos de diamantes avaliado em R$ 16,5 milhões ficou retido na alfândega do Aeroporto de Guarulhos após o governo Bolsonaro tentar entrar no País com as joias ilegalmente, em outubro de 2021.

Os áudios divulgados pelo portal G1 mostram que Gomes pediu para que os servidores atendessem um ofício assinado pelo tenente-coronel Mauro Cid, então ajudante de ordens de Bolsonaro. O documento indicava o nome do primeiro-tenente da Marinha, Jairo Moreira da Silva, que havia sido escalado para recuperar os bens. O militar chegou a viajar, sem sucesso, em uma avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para reaver os itens, como revelou o Estadão. "Faz esse favor, aí. Bota todo mundo para trabalhar de forma que a gente consiga cumprir isso daí, disponibiliza amanhã às 5h da tarde, tá?", afirmou o ex-secretário especial da Receita Federal, no dia 28 de dezembro do ano passado, em conversa com José Roberto Mazarin, que chefiava o órgão em São Paulo.

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Em um outro áudio, o ex-subsecretário-geral da Secretária Especial da Receita, José de Assis - considerado o número 2 do órgão -, indicou que Gomes está "numa pressão danada" para recuperar os diamantes. "Eu estou chegando na praia, Mazarin, aí eu vou encaminhar, ele mandou para mim. Vou mandar esse ofício para ti pelo Outlook para você", disse Assis, em diálogo com o então superintendente da Receita em São Paulo, José Roberto Mazarin.

Na conversa, Mazarin também diz que o pedido "é quase inexequível", uma vez que estaria faltando um documento. "O pessoal quer fazer muito bem feito e tem preocupação pelos valores, pela situação, por tudo que aconteceu. Então, quer fazer todos os registros, fazer certinho, incorporação para a União, né?", afirma. No dia seguinte, em 29 de dezembro, Gomes volta a enviar áudios para Mazarin. O então superintendente da Receita Federal o avisa da viagem do militar da Marinha para tentar recuperar as joias em São Paulo e diz querer mostrar urgência.

A missão com uso de aeronave oficial da FAB foi solicitada pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, segundo documento publicado no Portal da Transparência. A reportagem do Estadão apurou que houve ao menos oito tentativas frustradas de Bolsonaro de reaver as pedras preciosas, envolvendo seu próprio gabinete, três ministérios (Economia, Minas e Energia e Relações Exteriores) e militares.

Bolsonaro tem dado versões contraditórios sobre o caso. "Me acusam por um presente que não recebi, nem a primeira-dama", declarou, em 4 de março nos EUA. O ex-presidente também alegou que não tinha usado a estrutura da Aeronáutica para buscar as joias em Guarulhos. "Não mandei nenhum avião da FAB. Para de maldade. Nunca abusei de autoridade com ninguém" declarou. À Polícia Federal, contudo, Bolsonaro alegou que só houve intervenção de seus auxiliares para se evitar um suposto "vexame diplomático" do Brasil com o regime saudita.

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