Quatro funcionários da prefeitura de São Paulo foram presos na manhã desta quarta-feira após ação conjunta do Ministério Público paulista (MP-SP) com a Controladoria Geral do Município (CGM). Entre os detidos, ligados à Subsecretaria da Receita da prefeitura durante a gestão do prefeito Gilberto Kassab (PSD), estão um ex-subscretário e dois ex-diretores, além de um agente de fiscalização.
Segundo o MP paulista, os quatro são apontados como integrantes de um grande esquema de corrupção que causou prejuízos calculados em pelo menos R$ 200 milhões aos cofres públicos, somente nos últimos três anos. Segundo a prefeitura de São Paulo, o valor pode chegar a R$ 500 milhões, se considerado todo o tempo em que o grupo atuou.
Todos são investigados pelos crimes de corrupção, concussão (exigir vantagem ou dinheiro em razão da função), lavagem de dinheiro, advocacia administrativa e formação de quadrilha.
As investigações apontam que os quatro auditores fiscais montaram um grande esquema de corrupção envolvendo os valores do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) cobrado de empreendedores imobiliários.
O MP não divulgou os nomes dos detidos, mas afirmou que, na operação foram presos R.B.R., ex-Subsecretário da Receita Municipal (exonerado do cargo no dia 19 de dezembro de 2012); E.H.B., ex-Diretor do Departamento de Arrecadação e Cobrança (exonerado do cargo em 21 de janeiro deste ano); C.d.L.L.A., ex-Diretor da Divisão de Cadastro de Imóveis (exonerado do cargo em 05 de fevereiro deste ano), e o agente de fiscalização L.A.C. de M..
Além das prisões, foram cumpridos mandados de busca e apreensão nas residências dos servidores e de terceiros, assim como nas sedes das empresas ligadas ao esquema.
A operação ocorreu em São Paulo e também em Santos e Cataguases (MG). Cerca de 40 pessoas participaram da ação, entre promotores de Justiça, agentes da Controladoria Geral do Município, e das polícias civis de São Paulo e de Minas Gerais. Também foi determinado pela Justiça o sequestro dos bens dos envolvidos e das empresas operadas por eles.
Segundo o MP, as investigações começaram há cerca de seis meses e contaram com o apoio da Secretaria Municipal de Finanças e Desenvolvimento Econômico e da Agência de Atuação Integrada de Combate ao Crime Organizado (Secretaria de Segurança Pública, Polícia Civil e Polícia Federal).
O MP afirma que o grupo passou a ser investigado depois que a CGM, criada na gestão do prefeito Fernando Haddad (PT), identificou evolução patrimonial incompatível do grupo. Também foi identificado que a análise da cobrança de ISS de grandes empreendimentos imobiliários em São Paulo era direcionada para o grupo criminoso e que dois desses servidores atuavam em um mesmo setor, responsável pela arrecadação do imposto para emissão do habite-se de empreendimentos imobiliários recém-construídos.
O recolhimento do ISS - calculado sobre o custo total da obra - é necessário para que o empreendedor obtenha o “habite-se". Os auditores fiscais emitiam guias com valores ínfimos e exigiam dos empreendedores o depósito de altas quantias em suas contas bancárias. Sem isso, os certificados de quitação do ISS não eram emitidos e o empreendimento não era liberado para ocupação.
Grupo tinha escritório próximo à prefeitura
Por meio de análise estatística, a CGM constatou que, nas obras sob a responsabilidade do grupo de auditores, a arrecadação do ISS era menor ao percentual arrecadado pela média dos outros servidores que atuavam na mesma área.
Em um dos casos, uma empreendedora recolheu, a título de ISS, uma guia no valor de R$ 17,9 mil e, no dia seguinte, depositou R$ 630 mil na conta de uma empresa que pertence a um dos auditores fiscais, valor que corresponde a 35 vezes o montante que entrou nos cofres públicos.
Em dezembro de 2010, uma construtora efetuou uma transferência no valor de R$ 407.165,65 para a conta da empesa de um dos fiscais. No dia seguinte (03/12/2010), a mesma empresa obteve o certificado de quitação do ISS, mediante o recolhimento aos cofres públicos municipais no valor de R$ 12.049,59, valor cerca de 34 vezes menor que aquele depositado na conta da empresa do servidor.
As investigações também descobriram que empresas incorporadoras depositaram, em um período inferior a 6 meses, mais de R$ 2 milhões na conta bancária da mesma empresa.
O esquema tinha como foco prédios residenciais e comerciais de alto padrão, com custo de construção superior a R$ 50 milhões. O Ministério Público investiga se as empresas foram vítimas de concussão, porque não teriam outra opção para obter o certificado de quitação do ISS, ou se praticaram crime de corrupção ativa, recolhendo aos cofres públicos valor abaixo do devido.
Grande parte do dinheiro obtido ilicitamente era depositada na conta de uma empresa de administração de bens em nome de L. A. C. de M. e da esposa dele. Depósitos em cheque também foram identificados.
Um dos membros do grupo, R. B. R., mantinha um escritório no Largo da Misericórdia, a 300 metros da prefeitura de São Paulo. O local era usado para atender aos interesses do grupo.
O Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime de Formação de Cartel e à Lavagem de Dinheiro e de Recuperação de Ativos (GEDEC) apurou que os quatro auditores fiscais construíram patrimônio superior a R$ 20 milhões com o dinheiro desviado dos cofres públicos.
Dentre os bens adquiridos criminosamente e sequestrados estão apartamentos de luxo, flats, prédios e lajes comerciais, em São Paulo e Santos, barcos e automóveis de luxo, uma pousada em Visconde de Mauá (RJ) e um apartamento duplex em Juiz de Fora (MG).
Na operação desta quarta-feira foram apreendidos com os quatro investigados motos e carros importados, grande quantidade de dinheiro - reais, dólares e euros -, documentos, computadores e pen-drives.
Além disso, testemunhas foram ouvidas e confirmaram a extorsão efetuada e o “modus operandi” da organização criminosa, informando detalhes e o nome de outros possíveis agentes que supostamente também atuavam no esquema.
Segundo a prefeitura, a CGM irá instaurar processo disciplinar para apurar as responsabilidades, na esfera administrativa, dos servidores envolvidos.
Uma força-tarefa será formada para avaliar medidas para o ressarcimento dos valores desviados aos cofres municipais. As empresas envolvidas no esquema podem ser cobradas.