Quase três meses após a publicação da chamada "Declaração à Nação", na qual selou uma trégua com os outros Poderes, o presidente Jair Bolsonaro retomou nesta quarta-feira, 8, os ataques ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Na avaliação de Bolsonaro, o magistrado comete "abusos" e está "no quintal de casa".
Em entrevista ao jornal Gazeta do Povo, o presidente criticou a decisão de Moraes de abrir inquérito sobre a live em que ele fez uma falsa associação entre vacinas contra covid-19 e o desenvolvimento de aids.
"É um abuso. É o que eu disse: ele está no quintal de casa. Será que ele vai entrar? Será que ele vai ter coragem de entrar? Não é um desafio para ele. Quem está avançando é ele; não sou eu", disse Bolsonaro, que ainda voltou a criticar a prisão do presidente do PTB, Roberto Jefferson, também autorizada por Moraes. "Isso é uma violência".
Sem entrar em detalhes, o presidente afirmou que há pessoas cruzando as quatro linhas da Constituição. "Estamos cada vez mais nos preparando para buscar o ponto de inflexão nisso, que não chegou ainda. Espero que essas pessoas não avancem mais", insistiu.
Bolsonaro disse que o novo ministro do STF André Mendonça - indicado por ele e aprovado na semana passada em sabatina no Senado -, votará com o governo no julgamento do marco temporal para demarcação de terras indígenas. Na prática, o presidente antecipou o voto de um ministro que nem tomou posse e disse que ele se posicionará contra a revisão do atual entendimento da lei.
Em novo confronto com o Supremo, Bolsonaro também afirmou que a Corte ameaçou o governo ao exigir o passaporte da vacina no País. Os protocolos anunciados ontem pelo Executivo, no entanto, permitem a entrada de viajantes não imunizados contra a covid no Brasil, mediante quarentena de cinco dias e apresentação de teste negativo para o coronavírus no final deste período. Bolsonaro disse ter participado da reunião que estabeleceu as medidas.
"O STF estava ameaçando, via Barroso. Se a gente não exigisse passaporte vacinal, ele exigiria numa canetada. Colocamos PCR com uma quarentena, acho que satisfez. Da minha parte, eu não tomei vacina e não vou (tomar)", declarou Bolsonaro.
Na terça-feira, 7, o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, deu prazo de 48 horas para o governo explicar por que não cobra comprovante de vacinação para autorizar a entrada de viajantes no Brasil.
Embora o Palácio do Planalto tenha anunciado as novas medidas, ainda não houve a publicação de portaria para formalizá-las, como prometido pelo ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira.
Em mais um ataque às vacinas, Bolsonaro afirmou que um ministro "está passando mal" após ter tomado a terceira dose. Não revelou, porém, a identidade do auxiliar. "As vacinas têm vários efeitos colaterais", disse o presidente, desprezando o fato de que os imunizantes são comprovadamente seguros e aprovados pelas autoridades sanitárias.
Perfil
Ainda na entrevista, o presidente observou que, após emplacar no STF André Mendonça, nome classificado por ele como "terrivelmente evangélico", vai escolher ministros com perfil do seu eleitorado para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). A Corte tem duas vagas abertas.
Bolsonaro também confirmou a escolha ideológica para juízes de tribunais regionais. "Globo diz que vou escolher por critério ideológico. Não, não, vou escolher pessoal do PSOL", ironizou ele.
Ao falar de economia, Bolsonaro reiterou que a redução do preço dos combustíveis é algo "natural" para os próximos meses, considerando a queda na cotação do petróleo no exterior, e negou ter informações privilegiadas da Petrobras sobre reajustes da gasolina e do diesel. A empresa é investigada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), sob acusação de repassar informações ao presidente, que no domingo anunciou a baixa no valor dos combustíveis.
Até o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), seu antigo aliado, foi alvo de ataques por dizer que o ICMS cobrado pelos Estados sobre os combustíveis é uma alíquota que não variou na maioria do País. "Falou que eu era mentiroso. Mentiroso é ele. É um crime o que acontece no Brasil todo", criticou Bolsonaro, que costuma apontar o dedo para os Estados quando cita o aumento na taxação dos combustíveis.
Quando abordou o cenário político, o presidente afirmou que sua reeleição, "para o sistema", não é interessante. "Mercado sempre aproveita para fazer algo contra a gente", argumentou.
Em terceiro lugar nas pesquisas de intenção de voto, o ex-juiz da Lava Jato Sérgio Moro recebeu novas estocadas. Bolsonaro admitiu na entrevista que esperava a interferência de Moro em órgãos de investigação, quando ele era ministro da Justiça.
"Esse cara não fez absolutamente nada para que Coaf e Receita não bisbilhotassem minha vida e a dos brasileiros", declarou o chefe do Executivo, referindo-se ao provável rival nas eleições de 2022. "Pode investigar o presidente? Pode, mas legalmente", emendou.
De acordo com Bolsonaro, Moro "selecionava" as ações da Polícia Federal. "Queria mandar embora lá atrás. Mas, como ele tinha prestígio grande, ficava difícil justificar", afirmou o presidente.
Ele também revelou um diálogo com o antigo aliado. Na conversa, teria questionado Moro sobre investigações da Polícia Federal relacionadas ao então ministro do Turismo Marcelo Álvaro Antônio, acusado de envolvimento em um esquema de candidaturas laranja nas eleições de 2018.
"Por que a PF está investigando esse ministro que foi candidato?", perguntou o presidente a Moro. "Por que você não está investigando outros? É só para queimar o governo?"
Vice
Nesta nova campanha, o candidato ideal a vice, na avaliação de Bolsonaro, seria um nordestino ou um mineiro. "Pode ser um general de quatro estrelas também", observou ele, ao dizer que já está em contato com um "possível vice".
Nos corredores do Palácio do Planalto, especula-se sobre a escolha do ministro das Comunicações, Fábio Faria, para o posto. Faria é do Rio Grande do Norte e evangélico. Há agora rumores sobre negociações para emplacar na chapa o ministro da Defesa, general Braga Netto. Mas, segundo Bolsonaro, todos os nomes que circularem na imprensa para vice serão "riscados" de sua lista. "Já tenho dois nomes riscados", avisou.