Bolsonaro provoca Doria sobre 2022: "tem que pensar no País"

Alfinetada foi dada quando o presidente comentou as negociações para a transferência das provas da Fórmula 1 para o Rio de Janeiro

25 jun 2019 - 07h48
(atualizado às 09h28)

Quatro dias após cogitar disputar a reeleição, o presidente Jair Bolsonaro voltou ao assunto nesta segunda-feira, 24, para estocar um possível rival em 2022. Ao comentar as negociações para a transferência das provas da Fórmula 1 para o Rio de Janeiro, Bolsonaro afirmou que o governador de São Paulo, João Doria, deveria "pensar no País".

"A imprensa diz que ele será candidato à Presidência em 2022, então ele tem que pensar no Brasil. Se ele disputar a reeleição, aí ele pensa no seu Estado. Melhor ficar no Rio do que não ficar em lugar nenhum", disse Bolsonaro, em referência ao tucano. Na quinta-feira, o presidente já havia escolhido São Paulo para anunciar que poderia recuar da promessa de campanha e concorrer a um segundo mandato.

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Governador de São Paulo, João Doria
21/02/2019
REUTERS/Amanda Perobelli
Governador de São Paulo, João Doria 21/02/2019 REUTERS/Amanda Perobelli
Foto: Reuters

Doria, que não fala sobre planos presidenciais, desconversou: "Fórmula 1 não é questão política. É questão econômica. Não é hora de eleição. É momento de gestão", disse à reportagem.

É incomum que a sucessão presidencial seja debatida poucos meses após a posse de um presidente. Ainda assim, desde o início do ano, aliados e adversários de Bolsonaro passaram a calcular, articular e até mesmo declarar que tentarão suceder-lhe nas eleições de 2022.

Doria aparece até agora como o principal expoente do grupo. O empresário, que entrou na política em 2016, queria ter se lançado já em 2018. Sem conseguir furar a fila no partido, elegeu-se governador e saiu do pleito como a grande força do PSDB após a derrota do presidenciável Geraldo Alckmin nas urnas. Na convenção da sigla, em maio, Doria discursou aos gritos de "Brasil pra frente, Doria presidente".

O governador se movimenta em busca de apoio. Ambiciona atrair o DEM para seu projeto presidencial. Ao sair do governo, deixaria o vice, Rodrigo Garcia, um dos expoentes da cúpula do Democratas, como sucessor e candidato a novo mandato. Internamente, deixa correr especulações sobre uma eventual fusão dos dois partidos - hipótese que vinha sendo negada pelo comando do DEM.

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Doria não declarou nem pretende declarar tão cedo que tentará ser candidato em 2022. Quer sentir os ventos da política, segundo pessoas próximas. Outros políticos não têm a mesma cautela.

No próprio DEM, com quem o tucano aspira parceria, há postulantes. "Temos de parar com a falsa incógnita na política. Hoje, existe um desejo velado de tantos. Tenho muita tranquilidade em dizer: tenho de dar resultado em Goiás, claro, mas, se as condições forem propícias, vou dizer não?", disse em abril o governador de Goiás, Ronaldo Caiado. Ex-deputado e ex-senador, ele já foi candidato à Presidência em 1989 e, no ano passado, tentou viabilizar seu nome à disputa.

Caiado se junta ao governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), um neófito na política, no grupo dos que já pleitearam publicamente neste ano a vaga. Em março, o ex-juiz que assumira seu primeiro cargo público dois meses antes disse ao jornal O Globo que não vê como precipitado pensar na candidatura presidencial e que já havia contado, inclusive, a Bolsonaro sobre a intenção. O secretário da Casa Civil do Rio foi flagrado num vídeo em que diz que o chefe será presidente.

O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), disse em evento partidário em fevereiro que estava se preparando para 2022. "Vamos enfrentar o laranjal e a turma do mal", disse. A declaração animou apoiadores, mas ele diz que foi uma brincadeira. "Desde 2013, temos um vazio. O bolsonarismo se estrutura apenas pelo que não é, não representa nova força. Por isso, essa ansiedade de identificar nomes que possam preencher esse vazio", afirmou. "Mas o que vemos é carnaval fora de época. Isso é assunto para o final de 2021."

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Desgaste

A proliferação de postulantes ao Planalto logo após a posse não costuma acontecer, pois o novo presidente tende a contar com o entusiasmo da população no início de mandato e com trégua no mundo político, o que inibe conversas para lhe suceder.

Bolsonaro, porém, vem contribuindo para subverter a lógica. Optou por partir para o confronto com parlamentares, tachando-os de "velha política" e criando animosidade com líderes partidários. Ajudou a construir, assim, um ambiente em que todos se sentem liberados a se movimentar, segundo políticos ouvidos pela reportagem.

Governador de São Paulo, João Doria, e presidente Jair Bolsonaro 14/11/2018 REUTERS/Adriano Machado
Foto: Reuters

Soma-se a isso a erosão da popularidade de Bolsonaro. Pesquisa Ibope divulgada em abril indicou que ele tem a pior avaliação entre presidentes eleitos em início de mandato desde o fim do regime militar.

A análise da estratégia que levou Bolsonaro ao Palácio do Planalto também favoreceu a antecipação das conversas sobre a próxima eleição presidencial.

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A tese de que as redes sociais seriam peça-chave no pleito mostrou-se acertada. Isso faz com que políticos se sintam estimulados a iniciar o quanto antes seu planejamento. A imagem e o engajamento nos meios digitais precisam ser construídos com tempo. Bolsonaro, por exemplo, começou o trabalho nas redes mais de dois anos antes da eleição.

"O espaço político está nas redes. Tem de conquistar pelo discurso, pelas ideias radicais. É um trabalho de formiguinha. É como pedra na água, que vai criando ondas", disse Sérgio Denicoli, diretor da AP Exata, que faz monitoramento de redes sociais.

Persiste ainda a percepção de que o anseio por um "outsider" pode favorecer o surgimento de novo fenômeno eleitoral inesperado aos moldes do que se viu com Bolsonaro, que chegou ao Planalto sem estrutura partidária e impulsionado pela força das redes.

"A crise dos partidos políticos permanece. A esquerda está zonza e não vemos movimentação relevante. Então, há o sentimento de que, depois de Bolsonaro, por que não Luciano Huck, ou Joaquim Barbosa, ou o Doria?", disse Jairo Nicolau, do Centro de Pesquisa e Documentação (Cepedoc) da FGV. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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