O Supremo Tribunal Federal (STF) não deve julgar neste ano --e possivelmente tampouco até a sucessão dos comandos da Câmara e do Senado no início de fevereiro de 2023-- a legalidade do chamado orçamento secreto, forma de repasses bilionários que dá mais poder ao Congresso na distribuição de recursos orçamentários, com grau menor de transparência.
Ao contrário da expectativa na Corte antes do desfecho eleitoral, o processo não deverá ser pautado este ano pela presidente do STF e relatora do caso, Rosa Weber, segundo uma fonte com conhecimento do assunto, após lideranças no Parlamento indicarem disposição para buscar soluções políticas para o impasse depois da vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas urnas.
Na prática, essa decisão do Supremo tira da mesa a possibilidade de que o STF resolvesse a questão em breve, reduzindo o custo político de Lula, um crítico do orçamento secreto, de defender o fim do mecanismo que empoderou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Agora, Lira, fortalecido, pode negociar ao mesmo tempo tanto uma saída para as emendas de relator ou RP-9 --nome técnico dado ao orçamento secreto-- como um caminho para chamada PEC da Transição, uma das propostas do futuro governo Lula para viabilizar promessas de campanha de Lula e a continuidade do Auxílio Brasil de 600 reais no próximo ano.
A PEC, uma proposta de emenda à Constituição, demandaria uma articulação de Lira para impulsioná-la e aprová-la em tempo recorde ainda neste ano.
O presidente da Câmara apoiou durante as eleições o presidente derrotado Jair Bolsonaro (PL), fazendo campanha ostensiva para ele. Mas, num sinal de distensionamento, foi a primeira autoridade federal em Brasília a publicamente respaldar a vitória de Lula no dia 30 de outubro.
Lula e Lira vão se reunir nesta terça-feira. Aliados de ambos os lados têm dado indicações de que o petista não faria objeções a uma reeleição do deputado ao comando da Câmara.
São sinais de aproximação depois que, durante a campanha, o petista ter dito que trabalharia para acabar com o orçamento secreto, ao que Lira respondeu que "sob nenhuma hipótese" o Congresso aceitaria isso.
A proposta do orçamento para 2023 prevê 19,4 bilhões de reais em emendas de relator, metade dos valores reservados para as emendas parlamentares de maneira geral.
Antes da eleição, a expectativa no STF era que Rosa Weber colocasse em julgamento uma ação movida pelo PSol que pretendia acabar com o chamado orçamento secreto até o final do ano, segundo duas fontes disseram nos últimos meses.
Entretanto, o processo que questiona o mecanismo ainda não entrou na pauta dos julgamentos previstos para os dois próximos meses e não deverá mais entrar, segundo a fonte com conhecimento to assunto.
Se não houver uma solução política para o impasse até fevereiro, o STF poderá julgar o processo tendo no horizonte alguns caminhos: acabar totalmente com o expediente, mantê-lo ou até mesmo dar uma interpretação conforme a Constituição, podendo, por exemplo, exigir que o Congresso adote medidas para aumentar a transparência e a fiscalização pública desses recursos.
Uma saída negociada para o orçamento secreto foi aventada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em entrevista após o anúncio da vitória de Lula pelo TSE. Na ocasião, Pacheco defendeu uma costura dos atores envolvidos para resolver esse impasse.
"A gente pode ter uma grande concertação de alinhamento com as instituições. Acho plenamente possível encontrarmos um senso comum de alinhamento", disse ele.