O luto é um processo solitário. Cada um sente a dor a seu modo. Que o diga o presidente Jair Bolsonaro (PL). Ele está cada vez mais sozinho no Palácio do Alvorado, onde ainda não digeriu a derrota para o eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Um de seus maiores trunfos, o governador eleito de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), já se descolou da chama golpista que o capitão tenta manter acesa diante dos quartéis.
Tarcísio deu a letra em entrevista à CNN: “nunca fui bolsonarista raiz”. "Sou cristão, contra aborto, contra liberação de drogas, mas não vou entrar em guerra ideológica e cultural”, avisou o novo governador. Também não quis entrar em bola dividida com o Supremo Tribunal Federal (STF). Esta semana, foi flagrado aos risos com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, mais detestado por Bolsonaro do que todo o petismo.
A vitória de Lula foi um alento para a carreira de Tarcísio de Freitas. Ele foi indicado e bancado por Bolsonaro para comandar um estado no qual ele sequer morava. Se Bolsonaro tivesse vencido, Tarcísio teria mais cara de interventor do Estado, agindo a reboque do presidente, do que de governador. Agora, pode correr solto pelo Palácio dos Bandeirantes.
Na escolha de seus secretários, mostrou algumas de suas características: o liberalismo econômico e sua intenção de privatizar a Sabesp, com nomes técnicos especializados em desestatização; a influência de Gilberto Kassab (PSD), que além de secretário emplacou outros companheiros; e um quê conservador nas áreas sociais e, sobretudo na Segurança Pública.
A bem da verdade, Tarcísio nunca foi o queridinho dos bolsonaristas raiz, mas isso não impediu que eles festejassem sua vitória e o procurassem no gabinete do governo de transição. Entre os visitantes, estava o filho do presidente, Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que deu uma passadinha no escritório do vitorioso antes de embarcar para o Catar para ver a Seleção, ops, para distribuir pendrives a aliados internacionais.
Agora, Tarcísio tem diante de si uma forma de mostrar que não é o bolsonarista raiz que segue diligente para um precipício apesar de todas os avisos da ciência de que está no caminho errado.
Mais uma pesquisa confirmou o sucesso das câmeras individuais pregadas nos uniformes dos policiais militares. Em um ano (de julho de 2021 a julho passado), as câmeras evitaram 104 mortes, revela a pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV). É uma redução de 57% no número de mortes em ocorrências policiais.
Durante a campanha, Tarcísio disse ser contra as câmeras porque elas mostrariam que o governo duvida de seus policiais. É sempre bom lembrar que ninguém está acima de dúvidas: nem a polícia, nem o governo, nem os cidadãos. Agora, disse que vai avaliar os estudos. Que vença o bom senso do uso das câmeras que, como já mostramos aqui, também estão evitando a morte dos próprios policiais: houve uma redução de 95%.