O senador Marcos do Val (Podemos-ES) abriu a boca para a Veja esta semana e para todo o país nesta quinta-feira para dizer, com todas as letras, que ouviu, numa reunião com o então presidente Jair Bolsonaro (PL) um convite para gravar alguma fala suspeita do presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, para tentar anular o resultado das eleições. A reunião, que tinha como terceiro participante o ex-deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), ocorreu no dia 9 de dezembro, três dias antes do quebra-quebra promovido por manifestantes bolsonaristas em Brasília e no qual, outro acusado de golpismo, o jornalista Oswaldo Eustáquio foi se abrigar sob as asas do presidente, no Alvorada.
No dia do quebra-quebra, do Val procurou o ministro Alexandre de Moraes para reportar o convite que recebera para, como disse Bolsonaro, “salvar o Brasil”. O golpe que “salvaria” o Brasil, segundo o relato de do Val à Veja, contaria com a instrumentalização do Gabinete de Segurança Institucional, o GSI, comandado pelo general Augusto Heleno. O GSI forneceria os equipamentos de espionagem, teriam dito Bolsonaro e Silveira ao senador do Val.
Nesta quinta-feira, 02, enquanto Daniel Silveira, ex-deputado desde o dia 1º de fevereiro, era preso no Rio de Janeiro por desobedecer às imposições do Supremo Tribunal Federal, o senador desabafava nas redes sociais. Xingado de traidor pelos antigos aliados, cogitou desistir do mandato e retomar sua vida de empresário nos Estados Unidos. Mas já refrescou a cabeça. Segundo a ex-bolsonarista Janaina Paschoal, ele manterá seu posto no Senado. Em entrevista coletiva, deu uma recuada, colocando toda a ideia do golpe na conta de Daniel Silveira. Até o filho de Bolsonaro, o senador Flávio, confirmou a reunião, na qual não estava presente, mas já disse que não foi crime. Segundo a nova versão de Marcos do Val, Bolsonaro apenas ouviu (mas não interveio nem condenou) a ideia mirabolante de Daniel Silveira.
Do Val foi convocado para a missão golpista por ter relacionamento mais próximo com Alexandre de Moraes. Segundo o senador, acreditavam que Moraes falaria alguma coisa que pudesse ser usada contra ele. Imaginemos o ministro, em almoço com o senador, rindo e dizendo, entre a salada e o prato de proteína: “sim, fraudei as urnas, meu amigo. Fiz o L porque Lula, ladrão, roubou meu coração.”
Toda a vida política de Jair Bolsonaro parece norteada pelo julgamento tacanho que ele faz sobre o outro, sobre a inteligência e a intenção dos outros. Também é marcada pelas figuras esdrúxulas com quem ele se aliou. Se usamos nossa própria consciência como régua para medir as pessoas, muito se explica sobre quem é essa figura política.
Lá da Flórida, onde agora se dedica a dar palestras, Jair Bolsonaro afirma que o mandato de Lula não vai durar. Se depender das ideias de gênio de seu entorno, o mandato do petista vai longe.
Todas as tentativas de golpe ligadas ao bolsonarismo deram errado. Dos ataques à credibilidade das urnas eletrônicas, da tentativa jurídica de anular os resultados das urnas que lhe foram prejudiciais, da minuta sem assinatura do golpe encontrada na casa de seu ministro da Justiça, da intentona do dia 8 de janeiro e dessa agora revelada tentativa de espionar o ministro Alexandre de Moraes. Tudo foi um fiasco.
Em vez de pensar tanto em Lula, está na hora de Bolsonaro começar a preparar sua defesa. As pistas todas dão conta de que ele pode ser a bola da vez.