A jornalista Miriam Leitão publicou um post no Twitter há alguns dias celebrando os ministros que chegam com o novo governo. “Gente, quero curtir o momento”, escreveu. Durante o governo Lula 1 e Lula 2 e no governo Dilma, Miriam foi uma das vozes mais críticas a ponto de ser ofendida por uma trupe petista em um avião. Foi um horror. Logo, não se pode chamar Miriam de petista. E, com certeza, ela logo vai criticar o governo Lula. Assim se espera. Porque é nosso papel de jornalista colocar a lupa nos problemas e soar o alarme. E estamos atentas e atentos, creiam.
Mas é que não dá para deixar de curtir o momento da retomada da democracia. Quando a Cultura volta a ser ministério e entra em cena Margareth Menezes, uma das vozes negras mais bonitas e importantes do país. Uma mulher que canta a espiritualidade de matriz africana e coloca na música os orixás que o governo Bolsonaro tratou de esconder até de um quadro que decorava o Palácio do Alvorada.
Entra no governo também o jurista Silvio Almeida, na pasta de Direitos Humanos, um estudioso que desfulanizou o racismo (quando a gente atribui o racismo a uma ou outra pessoa, que cancelamos de imediato e logo esquecemos) e nos mostrou como essa chaga é estrutural e como temos de combatê-la nas instituições e dentro de cada um de nós.
Temos de curtir o momento em que o Brasil passa a ter um ministério dos Povos Indígenas e uma mulher indígena em seu comando, Sonia Guajajara, que neste sábado foi cercada pelos parentes de diversas etnias, que evocaram cantos e rezas de proteção, luta e alegria. Como não curtir o momento em que a Funai, enfim, será presidida por uma pessoa indígena? E uma mulher! Salve, Joênia Wapichana!
Como não curtir o momento em que chega ao governo a jornalista Anielle Franco, irmã da Marielle e também uma ativista e estudiosa de primeira dos direitos da mulher e dos pretos e pretas?
Um momento em que a evangélica Marina Silva será de novo ministra não porque o governo quer fazer média com os evangélicos, mas porque ela é porreta na defesa da Amazônia e das florestas brasileiras.
E a ministra da Saúde? Nisia Trindade. Enfim, uma mulher e, de novo, a ciência à frente de qualquer terraplanismo e negacionismo de vacina. Sai a cloroquina, volta o Zé Gotinha. E a Ana Moser nos Esportes?
Vamos, então, “curtir o momento”.
Curtir este momento não é dar um cheque em branco para o presidente Lula. Até porque cheque nem se vê mais. Estamos atentos e prontinhos para criticar toda e qualquer pisada na bola. Por falar nisso: 1) poxa, presidente, só 30% de ministras? 2) poxa, presidente, e esse ministro das Comunicações?
Curtir este momento é só festejar que uma era de trevas teve seu fim patético, ontem, quando um presidente acovardado abreviou seu governo em dois dias, pegou o avião e rumou para Miami por tempo indeterminado.
Que 2023 venha com muitos sonhos para todos e muitas cobranças para o governo Lula 3 porque há muito, muito mesmo a reconstruir.