Congresso tem dever constitucional de prestar contas sobre emendas, defendem especialistas

Embora sistemática atual esteja prevista nos regimentos internos das Casas Legislativas, ela vai na contramão da Constituição

16 ago 2024 - 16h06
(atualizado às 16h31)
Congresso Nacional
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Foto: Wilton Júnior/Wilton Júnior/Estadão / Estadão

A decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu a execução das emendas impositivas, abriu nova crise com o Congresso. De um lado, o ministro cobra transparência na indicação dos repasses. Do outro, Câmara dos Deputados e Senado Federal alegam que não dispõem de meios para rastrear os beneficiários do dinheiro na forma requisitada.

Especialistas em Direito Financeiro e Direito Constitucional ouvidos pelo Estadão avaliam que, embora a sistemática atual esteja prevista nos regimentos internos das Casas Legislativas, ela vai na contramão da Constituição. Segundo os advogados, princípios constitucionais como publicidade, moralidade e eficiência vêm sendo violados.

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"Não poderia, em uma democracia, existir quaisquer tipos de 'segredos orçamentários'. Isso é tão inconstitucional que até o porteiro do tribunal declararia a sua nulidade", afirma Lenio Luiz Streck, professor, parecerista e advogado.

Para ele, o modelo atual 'fragiliza' excessivamente o Palácio do Planalto: "Orçamento secreto é um oximoro, dois enunciados que se contradizem. Orçamento é sempre transparente. Se é secreto, não é constitucional. Emendas secretas ou invisíveis são uma forma de fragilizar o Poder Executivo, fazendo com que o Parlamento tome conta de uma parte do orçamento, impedindo a vontade popular que elegeu o presidente".

O advogado Carlos Eduardo Braga, especialista em Direito Financeiro, lembra que a sociedade tem direito de saber e fiscalizar como o dinheiro público é administrado.

"A transparência não foi erigida a princípio constitucional, mas está intrinsecamente ligada aos princípios constitucionais. E mais, está esculpida na própria noção de Estado Democrático de Direito. A transparência fiscal surge explicitamente na Lei de Responsabilidade Fiscal e, com isso, traz o conceito do direito anglo saxão do accountability, que pode ser entendido como o dever dos agentes públicos em prestar contas de seus atos de forma responsável e transparente", explica.

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Para o advogado Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional na PUC de São Paulo, o regimento interno da Câmara e do Senado "não está acima da Constituição".

"A postura correta e adequada do Legislativo seria submeter e fornecer os dados que o Judiciário corretamente está exigindo. Digo 'corretamente' porque o que o Judiciário fez neste caso foi aplicar princípios extremamente comezinhos da nossa Constituição, como o dever de transparência, de accountability, de controle sobre os gastos com o dinheiro público. O dinheiro público não pode ser tratado como se fosse um direito particular, privado, dos parlamentares", critica.

A advogada Vera Chemim, especialista em Direito Constitucional, destaca que a Constituição exige que as informações orçamentárias sejam divulgadas, garantindo rastreabilidade e controle.

"Quando as Emendas RP8 são destinadas a Estados e Municípios, estes devem publicizar valores e destinações para garantir a transparência, conforme a Lei de Responsabilidade Fiscal e outras normas. O acompanhamento e controle dessas emendas cabem à União, mas a questão é do âmbito dos Poderes políticos, não do Judiciário."

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A decisão de Flávio Dino vai a julgamento no plenário virtual do STF a partir desta sexta-feira, 16, quando os ministros vão decidir se confirmam ou não a liminar. O ministro suspendeu todas as emendas individuais até que o Congresso e o governo Lula regulem novos procedimentos.

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