Relator adjunto da Constituição de 1988, o deputado José Fogaça (PMDB-RS) votou contra a redução da maioridade penal na terça-feira, 31 de março. O peemedebista, que também relatou o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), acredita que o artigo 228 não pode ser alterado e lembra que a Assembleia Constituinte aplaudiu, quase que por unanimidade, a emenda apresentada.
“Os constituintes estavam muito conscientes. Foi talvez a única emenda, o artigo 228, que a Constituinte parou e aplaudiu quase que por unanimidade”, disse o deputado, em entrevista ao Terra. O peemedebista lembra que a Constituição incluiu como um princípio a “brevidade e a excepcionalidade” quanto à aplicação de qualquer medida privativa de liberdade a menores.
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Membro da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o ex-senador constituinte acredita que a Câmara dos Deputados “está optando pelo caminho mais fácil”. Para ele, o fato de o artigo 228 ser ou não uma cláusula pétrea é apenas uma questão formal, enquanto a discussão deveria focar na necessidade de preservar políticas socioeducativas de jovens infratores.
Na terça-feira, a CCJ aprovou uma PEC que pode alterar o artigo da Constituição para reduzir a maioridade penal para 16 anos. Atualmente, um jovem com menos de 18 anos só pode ficar internado por no máximo três anos, sendo que a manutenção da medida precisa ser reavaliada a cada seis meses.
Leia a entrevista:
Terra - O senhor acha que a maioridade penal que é cláusula pétrea?
José Fogaça - Eu não tenho dúvida disso. Mas acho que não é esse o argumento. É meramente formal, que não entra no mérito da questão. O Brasil fez uma aposta num grande esforço, um esforço moral, físico e econômico e parece que o País frustrou-se inteiramente nesse esforço, fracassou e agora desiste, optando pelo caminho mais fácil, que é reduzir a maioridade e transformar o menor em maior.
Terra - E qual seria a solução?
José Fogaça - A solução é o ECA. É o modelo da doutrina de proteção integral. O estatuto propõe à sociedade brasileira não uma atitude passiva, uma atitude inócua, produz uma atitude proativa. Tem que tomar iniciativa, tem que ter políticas públicas em relação à juventude. O ECA propõe dois pilares: um que é a doutrina da proteção integral, a estrutura de proteção, que é casa, família e escola. O adolescente ao invés de ser internado, ele deve ir para casa, para a família, se não tiver família, tem que ir para uma casa substituta. Nada substitui a família, nada é igual a família. Em casos de atos infracionais mais graves, as medidas socioeducativas. Toda a experiência desses anos tem demonstrado que as medidas socioeducativas levam à redução da delinquência. Um adolescente que passa por medidas socioeducativas leva a delinquir menos que os adultos.
Terra - Mas na CCJ vocês avaliaram só a admissibilidade, se é constitucional ou não. No debate da Constituição, foi discutido se a maioridade poderia ser alterada?
José Fogaça - Direitos e garantias individuais temos inúmeras, espalhadas pela Constituição. No artigo 227 há um princípio que não pode ser descumprido, usa a palavra princípio, que é o da eventualidade e brevidade da restrição de liberdade, em relação ao menor de 18 anos. Que não pode ter um tratamento um tratamento penal equivalente ao adulto. É um princípio, é uma garantia, é um direito fundamental. Mas ainda é só uma questão formal. Os constituintes estavam muito conscientes. Foi talvez a única emenda, o artigo 228, que a Constituinte parou e foi aplaudida quase que por unanimidade. Naquele processo célere, intenso de votações, foi um momento especial. A Constituinte toda parou, foi um deputado do Espírito Santo, que apresentou e defendeu a emenda.
Terra - E como o senhor avalia o cumprimento do ECA?
José Fogaça - O empreendimento de políticas públicas e sociais voltadas para a doutrina da proteção integral realmente há uma deficiência em nível federal, estadual e dos municípios. Todos devem colaborar para isso. Isso é uma tarefa primordial de um prefeito, criar uma retaguarda de proteção, ter uma política habitacional. Se um jovem de 16 anos não tem casa, se ele está numa situação irregular porque ele não tem habitação, tem que construir uma casa para a família, se não tem escola tem que sair, a prefeitura tem que ser proativa, coloca-lo numa escola. Se ele não tem família, tem que construir uma opção de família para ele. Tem que instituir casas de lares. O jovem que vai para uma casa de lar não volta a delinquir em hipótese alguma. São pais protetivos, pagos pelo governo.
Terra - Os deputados estão falando muito no clamor da população. Pesquisas mostram que a grande maioria da população defende a redução da maioridade penal.
José Fogaça - O caminho melhor foi de certa forma relaxado, ele foi secundarizado pelas políticas públicas. Há um caminho aparentemente mais fácil que é: bota na cadeia como os demais. É o mesmo remédio aos adultos. Não é por causa da ausência de penas que existe o ato infracional, mas eu reconheço que uma maioria enorme da população defende.