Instalada no Senado Federal em setembro de 2013, após uma série de revelações de espionagem no Brasil pela Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA) - com base em documentos vazados pelo ex-prestador de serviços da agência norte-americana Edward Snowden -, a CPI da Espionagem não confirmou a "materialidade de crime" relacionada às denúncias divulgadas pela imprensa, com investigações inconclusivas sob essa ótica.
A CPI avalia que a Polícia Federal terá dificuldade para comprovar delito e indícios de autoria.
"Os depoimentos colhidos nos autos do inquérito são todos, infelizmente, muito evasivos, de modo que até então a PF sequer tinha ideia de onde teria sido efetuada a interceptação clandestina: se no território brasileiro, nos cabos submarinos, nos satélites geoestacionários ou se as informações foram simplesmente cedidas pelas empresas de serviços de Internet, a partir de servidores localizados nos EUA", destaca o relatório.
"Os acontecimentos que motivaram esta CPI assinalam o despreparo do poder público no Brasil para fazer frente às ações de inteligência de outros governos e organizações", atesta o relatório de 301 páginas, que será divulgado oficialmente na próxima quarta-feira, 9 de abril.
O relatório da CPI - que foi presidida pela autora do requerimento de criação da comissão, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), e que teve como relator o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) - vai na contramão de declarações da presidente Dilma Rousseff em setembro passado na Assembleia Geral da ONU, em Nova York, quando afirmou que "o Brasil sabe proteger-se".
Até comunicações de Dilma com seus assessores diretos teriam sido monitoradas pela NSA, de acordo com as denúncias de Snowden.
Ao apontar que há "profunda vulnerabilidade do Estado brasileiro e de nossa população a ações de espionagem" e que isso continuará a ocorrer, a CPI conclama que o país "desenvolva mecanismos de proteção do conhecimento e de segurança cibernética".
Segundo o relatório, algumas das vulnerabilidades são consequências da própria infraestrutura de comunicações que o Brasil tem adotado ao longo dos anos. A maioria dos cabos submarinos para ligações internacionais passa por Miami, mesmo que os EUA não sejam o destino final da chamada.
"Estamos entregando informação para eles (os norte-americanos)", alertou o especialista em segurança cibernética Paulo Pagliusi, um dos ouvidos pela CPI, em uma entrevista no Rio de Janeiro.
Limitações do sistema de inteligência
Há ainda limitações do próprio sistema de inteligência brasileiro. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin), por exemplo, não pode interceptar ligações e tem orçamento apertado. Dos quase 530 milhões de reais previstos para a Abin em 2012, 467,2 milhões de reais tinham como destinação gastos com pessoal e encargos sociais, 55,7 milhões de reais para outras despesas correntes e apenas 4,9 milhões de reais para investimentos.
"Não há interesse em investir em inteligência. E se tem medo da inteligência", ressaltou o consultor legislativo do Senado e ex-agente da Abin, Joanisval Brito Gonçalves.
O relatório final da CPI sugere mudanças que aumentem a segurança cibernética do Brasil em quatro grandes linhas de atuação: tecnológica, pessoal, processual e institucional.
A construção de cabos submarinos que não passem pelos EUA, o lançamento de satélite brasileiro e o desenvolvimento de tecnologia nacional são algumas das recomendações. Investimentos em sistemas de inteligência, inteligência de sinais e criptografia também devem ser priorizados.
A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) recomenda, entre outras coisas, que o governo crie mecanismos de controle para monitorar o ciclo completo de desenvolvimento e produção de hardware e software no país.