A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entraram em pé de guerra por causa da exposição de conversas do empresário Roberto Mantovani com seu advogado.
A OAB pediu que o delegado Hiroshi de Araújo Sakaki seja punido pela inclusão de transcrições e prints dos diálogos em um dos relatórios da investigação do entrevero envolvendo o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e sua família no aeroporto de Roma.
O presidente da OAB, Beto Simonetti, disse que houve violação "grave" das prerrogativas dos advogados e que o delegado deve responder por abuso de autoridade.
Os delegados reagiram e divulgaram nesta sexta-feira, 23, um comunicado em que classificam a iniciativa da OAB como "inaceitável".
"Qualquer tentativa de pressionar a condução de investigações pode provocar prejuízos irreparáveis ao sistema de persecução penal e à própria democracia", diz a nota.
As conversas estão em um documento produzido em dezembro do ano passado e apresentado ao STF junto às conclusões da PF no inquérito. É um relatório da perícia feita nos celulares apreendidos com o empresário e sua família. A Polícia Federal dedica uma seção ao que chama de "tratativas de Roberto com seu advogado". São 11 páginas que descrevem trocas de mensagens entre a família e o criminalista Ralph Tórtima Filho.
No relatório da perícia, a PF destaca que o advogado orientou a família a não falar com a imprensa e pediu um relato completo do entrevero no aeroporto, com a sugestão de que a descrição fosse enviada de outro celular.
Em outro trecho do documento, a Polícia Federal expõe o rascunho, enviado pelo advogado, das versões que deveriam ser dadas pela família em depoimento. A PF afirma que elas "vieram a ser declaradas por eles em sede policial".
O ministro Dias Toffoli, relator do inquérito, determinou que todas as transcrições fossem excluídas dos autos.
A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal destacou que o documento não foi produzido por Hiroshi Sakaki e que ele não poderia "omitir qualquer dado ou informação". "É dever do delegado de Polícia Federal acostar aos autos do inquérito policial todas as provas e elementos de informação coletados durante a investigação."
COM A PALAVRA, A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS DELEGADOS DE POLÍCIA FEDERAL
A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) reforça a defesa da autonomia do Delegado de Polícia Federal para conduzir investigações criminais com base nas provas colhidas e em seu entendimento técnico-jurídico. As prerrogativas dos Delegados Federais jamais podem ser ignoradas ou atacadas. Qualquer tentativa de pressionar a condução de investigações pode provocar prejuízos irreparáveis ao sistema de persecução penal e à própria democracia.
Sem entrar no mérito das conclusões da investigação, é importante esclarecer que, ao contrário do que vem sendo divulgado, o Delegado Federal que conduziu o INQ 4940, que apurou o episódio ocorrido no aeroporto de Roma, não expôs no relatório final as conversas entre o investigado e seu advogado. Essas conversas sequer foram utilizadas para conclusão das investigações. Os diálogos constam em uma informação policial confeccionada por servidor encarregado de analisar os dados obtidos a partir de dispositivo apreendido, em cumprimento a determinação do próprio Supremo Tribunal Federal, no âmbito da PET 11.631.
Saliente-se que é dever do Delegado de Polícia Federal acostar aos autos do Inquérito Policial todas as provas e elementos de informação coletados durante a investigação, não podendo omitir qualquer dado ou informação, pois estes devem ser conhecidos pela acusação, pela defesa e pelo próprio julgador. Em suma, o sistema acusatório consagra a lealdade investigativa e processual, sendo essa alcançada, quando cada ator do referido sistema analisa e avalia todo conjunto probante, empregando e dando o valor que julgar adequado a cada informação.
No que tange à representação da Ordem dos Advogados do Brasil por abuso de autoridade, em que pese o papel importante dessa renomada entidade no Estado Democrático de Direito, a acusação causa estranheza, na medida que o crime em questão exige especial fim de agir (não descrito na petição) e, ainda, não pode se configurar por divergência na interpretação da lei ou na avaliação de fatos e provas. Insinuações de que um Delegado Federal, lotado em uma relevante diretoria da Polícia Federal, teria realizado tal conduta, são graves e deveriam estar fundamentadas em indícios razoáveis. Tal imputação atinge não apenas um Delegado de Polícia Federal, mas também a credibilidade da própria Polícia Federal, o que é inaceitável.
Os Delegados Federais se pautam sempre por uma ação republicana, em busca da elucidação dos fatos e não por interesses pessoais ou de terceiros. A Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal reafirma seu apoio à autoridade policial que conduziu o inquérito e repudia qualquer tentativa de intimidação dos Delegados de Polícia Federal no livre exercício de suas funções.