Dilma Rousseff reconheceu publicamente pela primeira vez que não se deve permitir a ruína de grandes empreiteiras brasileiras citadas no escândalo de propina que tem a Petrobras como protagonista, mostrando estar ciente de que isso prejudicaria ainda mais a combalida economia brasileira.
No discurso de abertura da primeira reunião ministerial de sua nova equipe, a presidente afirmou que "ser capaz de combater a corrupção não pode significar a destruição de empresas privadas também". "As empresas têm de ser preservadas, as pessoas que foram culpadas é que têm que ser punidas, não as empresas", enfatizou.
Dilma já tinha mencionado o escândalo da Petrobras publicamente em outras ocasiões importantes recentes, como em sua diplomação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 18 de dezembro último, e no discurso de posse no Congresso Nacional, em 1o de janeiro.
Nos dois momentos anteriores, porém, a presidente ignorou qualquer menção às companhias privadas denunciadas pelo Ministério Público Federal, entre elas as maiores empreiteiras do país, tendo optado por defender enfaticamente apenas a Petrobras: o nome da estatal foi repetido à exaustão, oito e nove vezes, respectivamente.
No discurso desta terça-feira, a Petrobras foi citada seis vezes e as empresas privadas, duas. Foi um evidente sinal de entendimento, pela presidente, de que não basta apenas recuperar a estatal, cujos contratos com sobrepreço teriam abastecido por muitos anos os bolsos de ex-funcionários, executivos de fornecedoras e políticos.
As seis grandes empreiteiras citadas na denúncia feita em meados de dezembro pelo Ministério Público e aceita pela Justiça estão envolvidas em grandes empreendimentos no Brasil, como sócias ou responsáveis pelas obras.
OAS, Camargo Corrêa, UTC Engenharia, Mendes Júnior, Engevix e Galvão Engenharia têm presença em aeroportos, rodovias e grandes hidrelétricas, para citar apenas alguns exemplos. São projetos que representaram uma das principais apostas do primeiro mandato de Dilma e que continuarão sendo estratégicos para elevar os investimentos e movimentar a economia.
Mas o que mudou do fim do ano para cá que justifique um afago de Dilma às empresas privadas?
No começo de janeiro, a OAS deixou de pagar juros sobre títulos de dívida no exterior, o que motivou as principais agências de classificação de risco a piorarem a nota de crédito do grupo.
Desde então, Moody's e Standard & Poor's têm reduzido os ratings de grandes construtoras no Brasil, e não apenas daquelas citadas na Lava Jato. Isso significa, na prática, que vai ficar mais caro para essas companhias financiarem suas operações. Algumas delas negociam a venda de ativos para aliviar a pressão sobre sua solvência.
Um eventual colapso das empresas privadas citadas na Lava Jato representaria, portanto, a possível paralisação de obras fundamentais de infraestutura e com potencial de deixar dezenas de milhares de brasileiros sem emprego.
Dilma, claro, quer evitar que isso aconteça. Ela sabe que enfrenta um segundo mandato repleto de desafios, com a inflação acima do teto da meta mesmo com a elevação da taxa básica de juro Selic, aumento das apostas de recessão da economia em 2015 e piora do mercado de trabalho.
O governo já indicou que vê como saída acordos de leniência caso sejam propostos pelas empresas acusadas dentro da Lava Jato, como disse recentemente à Reuters o ministro da Advocacia-Geral da União, Luís Inácio Adams. Para ele, um acordo de leniência é bom para a empresa, por evitar o risco de que ela feche as portas, e "fortalece o processo de recuperação de patrimônio" desviado.
A discussão aqui não é se deveria haver menor concentração de negócios nas mãos de uma dezena de empreiteiras de grande porte no Brasil.
É claro que seria mais proveitoso para o país ter um número maior delas, mas o fato é que são poucas as que hoje têm musculatura financeira para participar de empreendimentos que exijam investimentos vultosos, uma realidade construída ao longo de décadas e que não se muda repentinamente.
* Esta coluna foi publicada na terça-feira, 27 de janeiro, no terminal financeiro Eikon, da Thomson Reuters.