BRASÍLIA - A Embaixada da Arábia Saudita tem silenciado sobre a entrada ilegal das joias que o regime saudita deu de presente ao então presidente Jair Bolsonaro e a primeira-dama Michelle Bolsonaro. Desde sábado, o Estadão pede um posicionamento às representações internacionais, por e-mail e telefone. Foram contatadas tanto a chancelaria brasileira em Riade, capital da Arábia Saudita, quando a embaixada do regime árabe em Brasília. Não houve nenhuma resposta.
Nesta terça-feira, 7, o Estadão esteve pessoalmente na Embaixada da Arábia Saudita, em Brasília, para tentar ouvir algum porta-voz sobre o assunto. Ao chegar ao local, enquanto estava na rua, a reportagem foi abordada pelos seguranças, equipes que ficam distribuídas dentro e fora do imóvel. Os funcionários não queriam que imagens fossem feitas do local, mesmo do meio da rua.
Depois de pedir para falar com algum representante do órgão, o segurança tomou os dados dos repórteres e pediu que aguardasse do lado de fora do prédio. Minutos depois, um funcionário identificado como Hamad Alex, responsável pelo departamento econômico da embaixada, veio até o portão.
Hamad disse que tinha conhecimento do caso das joias, mas pediu que o pedido de posicionamento fosse encaminhado a um terceiro e-mail, o que foi feito no mesmo momento. "Normalmente tem que marcar um horário com o embaixador. Como vocês devem imaginar, ele tem muitos compromissos. Não é a pessoa chegar e falar, mas manda o e-mail e a gente responde", afirmou.
A reportagem perguntou se não poderia falar com algum responsável sobre o assunto. Hamad Alex voltou a negar. "No momento não, até porque a gente está à espera". Questionado sobre o que esperava, ele disse: "do posicionamento". Mais uma vez, a reportagem insistiu: "posicionamento de quem, do governo brasileiro?", ao que o representante respondeu: "Da Arábia Saudita."
O Estadão segue aguardando um posicionamento oficial do regime árabe sobre o caso.
Como revelou a reportagem, o ex-presidente Jair Bolsonaro atuou pessoalmente para tentar liberar o conjunto de joias e relógio de diamantes dados como presente pelo regime saudita. O jogo de joias foi inicialmente avaliado pelos fiscais da Receita em US$ 1 milhão, conforme seu termo de retenção. Depois, chegou a ser reavaliado, com possibilidade de chegar a até 3 milhões de euros, o equivalente a cerca de R$ 16,5 milhões.
Depois da retenção, o governo Bolsonaro fez, ao menos, oito tentativas para tentar ficar com as joias, incluindo ações por meio de ministérios, militares e próprio gabinete da Presidência da República. Um segundo pacote de joias, com relógio e outros itens, chegou a entrar irregularmente no País, conforme afirmou ao Estadão o ex-ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que liderava a comitiva que trouxe os itens ao Brasil, em 26 de outubro de 2021.
Nesta segunda-feira, 6, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal deram início às investigações sobre o caso. O inquérito vai correr em sigilo na Delegacia Especializada de Combate a Crimes Fazendários da superintendência da corporação em São Paulo. Os investigadores têm 30 dias para concluir o inquérito, mas o prazo pode ser prorrogado se houver necessidade. Umas das primeiras medidas da investigação deverá ser o depoimento de integrantes da comitiva que trouxe as joias da Arábia Saudita.
O ex-presidente Bolsonaro se defendeu das acusações, afirmando que não pediu, nem recebeu o presente. Já a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, a quem o item mais valioso do presente seria endereçado, também negou ter conhecimento das joias e ironizou o ocorrido.