Entidades criam 'força-tarefa' para atender à decisão de Dino sobre transparência de emendas

Ministro do STF determinou suspensão dos repasses de emendas parlamentares a 13 entidades que foram consideradas não transparentes em relatório da Controladoria-Geral da União (CGU)

10 jan 2025 - 15h19

BRASÍLIA - Fundações de apoio à pesquisa ligadas a universidades públicas fazem uma "força-tarefa" para atender às exigências de transparência do Supremo Tribunal Federal (STF) após o ministro Flávio Dino determinar a suspensão dos repasses de emendas parlamentares a 13 entidades que foram consideradas não transparentes em relatório da Controladoria-Geral da União (CGU). O prazo de cinco dias determinado pelo ministro para o governo cumprir a decisão de Dino termina nesta sexta-feira, 10.

Segundo apurou o Estadão/Broadcast Político, houve uma reunião virtual na última quarta-feira, 8, entre os representantes das entidades que foram alvo da decisão e membros da CGU e da Advocacia-Geral da União (AGU). De acordo com um participante do encontro, a CGU disse que vai pedir a Dino a prorrogação do prazo para que todas as fundações possam sanar as lacunas de transparência antes do bloqueio efetivo dos repasses.

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As fundações podem ser contratadas pelas instituições de ensino e ciência para que exerçam a gestão administrativa e financeira necessária à execução de projetos científicos. Até agora, três fundações ligadas a universidades públicas apresentaram a Dino as melhorias feitas em seus portais e pediram a liberação dos repasses: a Fundação Euclides da Cunha (FEC), que presta apoio à Universidade Federal Fluminense (UFF), a Fundação Coordenação de Projetos, Pesquisas e Estudos Tecnológicos (Coppetec), ligada à UFRJ e à Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), e a Fundação de Apoio à Pesquisa (Funape), associada à Universidade Federal de Goiás (UFG).

Dino publicou despacho na última quinta-feira, 9, intimando a CGU a se manifestar em até 15 dias corridos sobre os pedidos. O órgão de controle deverá atestar se as fundações cumpriram ou não os requisitos de transparência.

O presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies), Antonio Fernando Queiroz, rejeita a alegação de que as fundações não atuam com transparência. De acordo com Queiroz, os portais de transparência dessas entidades já publicavam todos os dados relativos aos projetos geridos, inclusive com dinheiro de emendas parlamentares. Ele explica que a CGU considerou a prestação de contas não adequada porque os sites não identificavam quais recursos vinham de emendas.

Isso se deve, de acordo com ele, a uma dificuldade operacional: as emendas são recebidas pelas universidades, que, por sua vez, direcionam as verbas a determinado projeto científico e contratam as fundações para gerir os recursos. Por isso, segundo Queiroz, as fundações podem receber valores mistos, sem dados de quais são oriundos das emendas e quais vêm de recursos próprios da universidade. Ele destaca que essa identificação não era cobrada pela CGU até a decisão de Dino.

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Essa lacuna, de acordo com o presidente do Confies, está sendo sanada na força-tarefa realizada pelas fundações. Na prática, as fundações têm que identificar, junto às instituições de ensino, o que era emenda parlamentar em cada recurso recebido e relacionar os valores a cada projeto gerido.

"A gente, na realidade, não recebe a emenda parlamentar na fundação, a gente recebe um projeto. Agora a gente colocou fonte do recurso, emenda parlamentar (no portal de transparência)", explica. Segundo representantes do Conselho, a preocupação maior é de que a suspensão gere restrições para o recebimento de verbas de outras naturezas. "Se houver o bloqueio, as fundações de apoio deixam de receber recursos de todas as fontes. E aí fica uma coisa bem complicada, porque a gente tem projetos com o Hospital do Câncer, com vacinas, com pesquisas de inovação tecnológica importantíssimas do Brasil. Então, cria realmente um caos", afirma Queiroz.

Segundo o Confies, foi criado também, nesta semana, um grupo de trabalho de duração de cerca de 30 dias para preparar uma recomendação de padronização das metodologias de inserção de informações nos portais de transparência das fundações. A equipe tem cerca de 15 pessoas e conta com membros da CGU e da AGU.

Na semana passada, Dino suspendeu os repasses de emendas parlamentares a 13 entidades privadas que não fornecem transparência adequada ou não divulgam as informações requeridas, de acordo com relatório da CGU entregue ao Supremo. Dessas entidades, oito são fundações que gerenciam verbas para pesquisas e operações em universidades públicas, como a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

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O relatório mostrou que apenas quatro entre 26 entidades fiscalizadas pelo órgão apresentaram sistemas de transparência plenamente eficientes. No período analisado pela CGU, entre 2 e 21 de dezembro, foram autorizados (empenhados, no jargão orçamentário) R$ 133,3 milhões em benefício das entidades consideradas não transparentes. Desse montante, R$ 53,8 milhões foram destinados a fundações ligadas a universidades públicas.

Gestão 'às escuras' das verbas de emendas parlamentares

Especialistas de organizações de incentivo à transparência avaliam que há uma gestão "às escuras" das verbas de emendas parlamentares por parte das universidades públicas e das fundações ligadas a essas instituições, o que demanda uma diretriz dos ministérios do governo federal para padronizar a disponibilização das informações referentes a esses recursos.

A relação entre as instituições federais de ensino superior e as fundações de apoio foi regulamentada por uma lei federal de 1994. Segundo as regras, as instituições de ensino e ciência podem celebrar convênios e contratos para que as fundações exerçam a gestão administrativa e financeira necessária à execução dos projetos científicos.

Segundo Marina Atoji, diretora de programas da Transparência Brasil, as fundações foram criadas sob o argumento da desburocratização na captação e na gestão de recursos, já que não precisam lidar com travas que seriam aplicáveis às universidades.

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Embora essa razão seja válida para evitar demoras nas pesquisas, diz a especialista, o que ocorre hoje é uma "desburocratização às escuras". Ela afirma que as fundações privadas operam de "forma bastante livre" e fora do radar da fiscalização dos órgãos de controle e da sociedade sobre o uso de recursos públicos.

"Isso é um incentivo a que elas sejam pouco transparentes e não o contrário", avalia. "Há um risco muito alto de mau uso do dinheiro ou de uso ineficiente."

Em notas enviadas ao Estadão/Broadcast, as fundações alegam que não há como atender aos requisitos de transparência sem envolver as universidades apoiadas porque são elas que negociam, recebem e registram a origem dos recursos. Para Atoji, esse argumento soa como um subterfúgio.

"A transparência não precisa ser exclusiva de uma ou de outra. Ela pode ser e deve ser, inclusive, repetida, duplicada. A fundação também põe a mão nesse dinheiro em algum momento", analisa.

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Roberto Livianu, procurador de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção, observa que o governo deveria ter um conjunto de protocolos para evitar esse tipo de situação. "A omissão de ministérios em relação a isso é criticável. Porque você precisa ter um padrão de comportamento, um conjunto de protocolos relevante que venha por parte do Executivo para evitar esse tipo de situação", avalia.

"A rastreabilidade é garantida pelo artigo 37 da Constituição, que diz respeito ao princípio da publicidade. O ministro Flávio Dino nada mais está fazendo do que cumprir o seu papel. Em relação às universidades públicas, isso deveria ser ainda maior, porque a pesquisa no âmbito universitário é extremamente importante para a produção do conhecimento", complementa o especialista em transparência.

Os ministérios da Educação (MEC) e da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) não responderam aos questionamentos. Procurada pelo Estadão/Broadcast, a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) também não comentou.

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