Em troca de mensagens no WhatsApp com assessor do presidente Jair Bolsonaro em que denunciou irregularidade na compra de vacinas para covid-19, o deputado Luis Miranda (DEM-DF) afirmou que estava "rolando esquema de corrupção pesado" no Ministério da Saúde. "Tenho as provas e as testemunhas", escreve Miranda em uma das mensagens as quais o Estadão/Broadcast (leia abaixo) teve acesso.
O aviso foi enviado às 12h54 do dia 20 de março ao número de celular de um ajudante de ordem do presidente. Como resposta, o auxiliar de Bolsonaro responde com uma bandeira do Brasil. Uma hora depois, Miranda insiste: "Não esquece de avisar o PR (presidente). Depois não quero ninguém dizendo que eu implodi a república. Já tem PF e o c... no caso. Ele precisa saber e se antecipar". A resposta é outra bandeira do Brasil.
Às 16h, Miranda informa ao auxiliar do presidente que estava "a caminho". No mesmo dia, Bolsonaro recebeu o deputado no Palácio da Alvorada. O encontro foi registrado nas redes sociais por Miranda, que na ocasião disse ter ido tratar de combustíveis e vacinas.
Passados dois dias, o deputado voltou a procurar o auxiliar. "Pelo amor de Deus... isso é muito sério!", escreveu Miranda no dia 22. Sem resposta, ele insiste no dia seguinte."Bom dia irmão, o PR está chateado comigo? Algo que fiz?". O auxiliar do presidente responde: "Negativo, deputado. São muitas demandas. Vou relembrá-lo".
Também pelo aplicativo de mensagens, Miranda envia ao ajudante de ordem uma fatura de compra em nome da empresa Madison Biotech PTE LTDA. O documento, segundo afirmou o deputado ao Estadão, era uma fatura no valor de US$ 45 milhões referente a importação da vacina indiana Covaxin. O pagamento, porém, dependia da assinatura de seu irmão, Luis Ricardo Fernandes Miranda, que é chefe do Departamento de Logística do Ministério da Saúde. O parlamentar afirmou que seu irmão se recusou a assinar, pois a área técnica da pasta considerou indevido o pagamento antecipado.
O Ministério da Saúde assinou um contrato para a aquisição de 20 milhões de doses da Covaxin no dia 25 de fevereiro. Como revelou o Estadão, o valor que a pasta aceitou pagar pelo imunizante (US$ 15 por dose) é 1.000% mais alto do que a própria fabricante, o laboratório Bharat Biotech, estimou seis meses antes (US$ 1,34).
Diferentemente dos demais imunizantes, negociados diretamente com seus fabricantes (no País ou no exterior), a compra da Covaxin pelo Brasil foi intermediada pela Precisa Medicamentos. A empresa virou alvo da CPI da Covid, que na semana passada autorizou a quebra dos sigilos telefônico, telemático, fiscal e bancário de um de seus sócios, Francisco Maximiano. O depoimento do empresário na comissão estava marcado para hoje, mas ele alegou estar em quarentena após voltar da Índia e não compareceu.
O Ministério Público Federal (MPF), que investiga suspeitas envolvendo a compra da Covaxin, afirmou ver indícios de crime e "interesses divorciados do interesse público" na contratação. A procuradora da República Luciana Loureiro Oliveira, do Distrito Federal, decidiu enviar parte da apuração para a área criminal do MPF.