A estratégia de Michel Temer para salvar seu mandato, posta em prática no último domingo (24/05), já sofreu seu primeiro revés. Nesta terça-feira (30/5), o ex-ministro da Justiça Osmar Serraglio recusou a proposta do presidente de remanejá-lo para a chefia do Ministério da Transparência.
A decisão de Serraglio foi anunciada ao PMDB e depois confirmada em uma nota curta. Fora do governo, ele deve reassumir seu mandato como deputado federal pelo Paraná. Segundo fontes próximas de Serraglio, o presidente nunca comunicou pessoalmente ao ex-ministro que pretendia fazer uma troca de cadeiras entre os ministérios. Serraglio, que ficou menos de três meses no cargo, acabou descobrindo por meio da imprensa que havia sido demitido.
Com a recusa de Serraglio, o complicado xadrez elaborado por Temer ficou embaralhado. Além de realocar um aliado dócil para garantir o controle sobre a Transparência - pasta responsável pelos acordos de leniência com empresas envolvidas na Lava Jato -, a permanência de Serraglio no governo representaria uma blindagem para o deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), o ex-assessor especial de Temer flagrado pela Polícia Federal recebendo uma mala de dinheiro da JBS. Segundo indica a gravação do empresário Joesley Batista, da JBS, Rocha Loures era o interlocutor entre o presidente e a empresa.
Desde que deixou o cargo de assessor especial, em março, Rocha Loures vinha desempenhado mandato de deputado na condição de suplente do próprio Serraglio, que deixou a Câmara para assumir a Justiça. Com a volta deste último à Câmara, Rocha Loures perde a vaga - ainda que ela tenha sido suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Sem a vaga, ele também perde o foro privilegiado.
Desde que Temer anunciou a reconfiguração do seu ministério, a vontade de deixar Serraglio em alguma posição ministerial vinha sendo encarada por setores da imprensa e da oposição como uma tentativa de blindar Rocha Loures. Agora, há risco de que parte das investigações que correm contra o peemedebista sejam remetidas para a primeira instância. No caso envolvendo o inquérito com Temer, no entanto, é provável que o STF ainda possa decida manter o caso na própria corte, já que envolve o presidente.
Desde que o caso veio à tona, surgiram várias especulações de que o ex-assessor do presidente também possa fechar um acordo de delação premiada. Com sua saída da Câmara, também aumentam as especulações de que ele possa ser preso, tal como aconteceu com outros deputados que perderam o mandato, como Eduardo Cunha.
Troca de cadeiras
Dois dias atrás, Temer substituiu Serraglio na Justiça por Torquato Jardim, que vinha comandando a pasta da Transparência desde o ano passado. A entrada de Jardim mostrou que o presidente pretende melhorar sua interlocução com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e levantou o temor de que o Planalto pretende endurecer com o comando da Polícia Federal, que é subordinada à pasta da Justiça. Ex-ministro do TSE, onde o Temer enfrenta uma ação que pode cassar seu governo, Jardim já deixou claro que pode mexer com a PF, que no momento investiga o presidente como parte de um inquérito instaurado no STF.
Já Serraglio, que havia sido nomeado para a Justiça em fevereiro, evitou fazer declarações do gênero. Em uma das gravações da JBS, o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG), principal promotor da entrada dos tucanos no governo Temer, chamou Serraglio de "bosta" e disse que sua nomeação foi um "erro" do presidente porque o então ministro não nomeou "delegados amigos".
Com a recusa de Serraglio, apenas parte da ofensiva de Temer de reforçar os flancos do seu governo e da sua própria figura permanece.
Com a sua volta à Câmara, Serraglio também pode passar a se preocupar com a própria pele. Serraglio foi citado e grampeado durante a Operação Carne Fraca, que investiga um esquema de corrupção e adulteração no setor de carnes do Brasil.
O ex-ministro foi um dos padrinhos políticos de Daniel Gonçalves Filho, um ex-superintendente do Ministério da Agricultura no Paraná, preso na operação. No momento, especula-se que Gonçalves esteja negociando ele próprio uma delação que possa envolver Serraglio.
A troca de cargos promovida por Temer ocorre justamente a menos de dez dias da retomada pelo TSE do julgamento da ação que pode resultar na cassação da chapa Dilma-Temer 2014.
Semanas atrás, o Planalto estava confiante que o resultado do julgamento seria favorável para Temer ou que a ação seria pelo menos postergada indefinidamente. Com a delação da JBS, que implicou diretamente o presidente, o cálculo parece ter mudado. O meio político aposta que é certo que a chapa agora será condenada.
Restam dúvidas se a presença de uma figura como Jardim em um ministério tao importante poderá mesmo influenciar de alguma maneira o julgamento. Tradicionalmente, a pasta da Justiça é o canal de interlocução entre o Executivo e o Judiciário.