Cefas Luiz Paulino e Fabrício Ferreira de Oliveira, ex-assessores do deputado federal André Janones (Avante-MG), confirmaram que o parlamentar está envolvido em um esquema de "rachadinha" em seu gabinete, onde retira parte dos salários de seus auxiliares. A informação é do jornal Folha de S. Paulo.
Cefas trabalhou no gabinete de Janones de fevereiro de 2019 a novembro de 2021, enquanto Fabrício desempenhou suas funções de setembro de 2022 até o momento em que deixou o cargo.
"A maioria dos que ganhava um salário alto repassava de volta parte do que recebia", afirmou Fabrício à publicação.
De acordo com ele, a destinação do dinheiro ao parlamentar se dava em dinheiro vivo. "Eles [os assessores que trabalhavam nos estados] colocavam esse dinheiro em espécie em um envelope e iam para Brasília. É só a Polícia Federal quebrar o sigilo de todos os assessores para ver a dinâmica desses saques."
Fabrício Ferreira de Oliveira formalizou a denúncia ao Ministério Público de Minas Gerais em janeiro de 2022, e o caso foi encaminhado à Procuradoria-Geral da República devido ao foro privilegiado de Janones.
As acusações estão em trâmite no Supremo Tribunal Federal (STF) desde maio, sob a relatoria de Luiz Fux. Durante esse período, Fabrício incluiu uma gravação na qual um terceiro assessor do parlamentar mencionava a devolução mensal de R$ 4 mil a R$ 5 mil.
Já Cefas diz que não fez devolução do salário, mas que sabia do esquema: "Ele [Janones], através do Mario [Celestino da Silva, chefe de gabinete], pediu que todos assessores enviassem as fichas cadastrais com o campo do salário em branco! Eu não aceitei e mandei a minha preenchida eletronicamente, porque desconfiei que tinha algo errado."
"Acredito que como eu não aceitei enviar a ficha cadastral da Câmara com o campo de salário em branco, eles entenderam que eu não faria nenhum tipo de devolução", completou.
Os dois alegam que a coleta do dinheiro era realizada por Leandra Guedes Ferreira, na época namorada e assessora de Janones, atualmente prefeita de Ituitaba (MG) pelo Avante. Em comunicado, a prefeita negou ter conhecimento ou envolvimento em qualquer conduta ilegal.
O Terra entrou em contato com a assessoria de André Janones, mas ainda não teve sucesso. A reportagem será atualizado em caso de manifestação.
Entenda o caso
O deputado federal André Janones (AVANTE-MG) solicitou que os assessores de seu gabinete, na Câmara dos Deputados, destinassem uma parte de seus salários para custear suas despesas pessoais. A prática, conhecida como "rachadinha", configura enriquecimento ilícito, dano ao patrimônio público e pode resultar em inelegibilidade, de acordo com o entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Aúdio obtidos pelo portal Métropoles mostram o deputado dizendo como pretendia gastar os valores provenientes dos salários dos servidores públicos lotados em seu gabinete. “Casa, carro, poupança e previdência”, disse em áudio.
Janones, que obteve 238 mil votos em Minas Gerais, não sabia que estava sendo gravado.
A reunião com assessores aconteceu nas dependências da Câmara dos Deputados, na sala de reuniões do partido Avante, ao qual Janones pertence. Em outro trecho do áudio, Janones busca sensibilizar os servidores.
“Algumas pessoas aqui, que eu ainda vou conversar em particular depois, vão receber um pouco de salário a mais. E elas vão me ajudar a pagar as contas do que ficou da minha campanha de prefeito. Porque eu perdi R$ 675 mil na campanha. ‘Ah isso é devolver salário e você tá chamando de outro nome’. Não é. Porque eu devolver salário, você manda na minha conta e eu faço o que eu quiser”, tentou convencer o político.
O deputado prosseguiu: “O meu patrimônio foi todo dilapidado. Eu perdi uma casa de R$ 380 mil, um carro, uma poupança de R$ 200 mil e uma previdência de R$ 70 (mil). Eu acho justo que essas pessoas também participem comigo da reconstrução disso. Então, não considero isso uma corrupção."
Na sequência, Janones alegou que não seria legítimo os assessores ficarem com 100% de seus salários: “Por exemplo, o Mário vai ganhar R$ 10 mil [por mês]. Eu vou ganhar R$ 25 mil líquido. Só que o Mário, os R$ 10 mil é dele líquido. E eu, dos R$ 25 mil, R$ 15 mil eu vou usar para as dívidas que ficou [sic] de 2016. Não é justo, entendeu?”.
Ao mesmo tempo em que tentava justificar a rachadinha, Janones deixou claro que a divulgação dessa prática poderia ameaçar seu mandato como deputado federal. Durante sua declaração, o parlamentar tentou transmitir a ideia de que não se importaria muito caso fosse alvo de denúncias.
“E se eu tiver que ser colocado contra a parede, eu não tô fazendo nenhuma questão desse mandato. Para mim, renunciar hoje seria uma coisa tão natural. Se amanhã vier uma decisão da Justiça: ‘o André perdeu o mandato’, você sabe o que é eu não me entristecer um milímetro?”, disse.
O responsável pela gravação do áudio foi o ex-assessor de Janones, o jornalista Cefas Luiz. O áudio em questão é de 2019, e foi feito logo após a primeira eleição do parlamentar. O jornalista anunciou que entregará a gravação à PF, junto com outras evidências de possíveis irregularidades que teriam ocorrido no gabinete do deputado.