A Delegação da União Europeia para Relações com o Brasil promoveu nesta quinta-feira (29), no Parlamento Europeu, em Bruxelas, um debate sobre o futuro governo Jair Bolsonaro. As reuniões do grupo, que é responsável por estreitar os laços diplomáticos do bloco com o país, supervisionando a parceira estratégica, além de promover a troca interparlamentar, ocorrem duas vezes por semestre.
No segundo e último debate deste semestre, Adrianus Koetsenruijter, diretor do departamento para América Latina do Serviço Europeu de Ação Externa (SEAE), o serviço diplomático europeu, afirmou que a polarização da sociedade brasileira é preocupante e pediu responsabilidade a Bolsonaro para apaziguar essa divisão.
"Vemos a diversificação do Congresso brasileiro como um grande desafio para o novo governo", avaliou Koetsenruijter, que lembrou que o Brasil é um grande parceiro da União Europeia.
Como um parceiro estratégico da UE desde 2007, o bloco se aproximou do Brasil. Bruxelas pôde contar com sua estreita colaboração para realizações como o Acordo de Paris de 2015 contra as mudanças climáticas. O fato de o Brasil ser um parceiro confiável e importante costuma ser destacado em diferentes instâncias europeias.
A incerteza sobre essa parceira cresce agora depois da guinada política no país, ainda mais após o anúncio da retirada da candidatura brasileira como sede da Conferência do Clima em 2019. Mudanças climáticas, desenvolvimento sustentável, direitos humanos e políticas de gênero e inclusão são os principais pontos da cooperação europeia, principalmente com os países da América Latina.
"Temos grandes ambições em relação às mudanças climáticas. Mesmo sabendo que o tema não é muito considerado por Bolsonaro, temos bons argumentos conseguir que ele trabalhe conosco. O novo governo encontrará o caminho para a UE", destacou Koetsenruijter.
A cientista política Fanny Vridagh, da Universidade Livre de Bruxelas, que também foi convidada para o debate, tem uma visão semelhante à do diplomata europeu. "Não acredito que Bolsonaro, um grande pragmático, tenha interesse em cortar relações com a UE", disse Vridagh à DW. "Antes que uma falta de cooperação nas questões climáticas prejudique as relações com a UE, ele recuaria", acrescentou.
Em relação às políticas de gênero, Koetsenruijter disse que não se pode deixar 50% da população de fora da cooperação bilateral. "Acredito que encontraremos um caminho. O futuro presidente tem moderado suas declarações. Minha esperança está colocada principalmente nas mulheres do Brasil", acrescentou o diplomata.
Já Vridagh não é tão otimista. "Não há dúvida de que as políticas de gênero não serão sua prioridade. Esse tipo de ideia é para ele um complô marxista". Em sua opinião, no caso de a UE se importar muito, Bolsonaro "poderá não lutar contra as que já existem, mas as deixará de lado".
Por outro lado, a questão da segurança é uma prioridade para o novo governo. A cooperação europeia vê nesta temática algumas possibilidades estratégicas: missões conjuntas, segurança cibernética, ciência e tecnologia. "Temos muitos anos de histórias de êxito nestes campos e esperamos que continue assim", afirmou Koetsenruijter.
"Temos certeza que o governo Bolsonaro vai querer continuar cooperando com Bruxelas, não somente porque somos os maiores investidores", continuou Koetsenruijter. O avanço das negociações com de um acordo comercial entre o Mercosul e a UE está na lista de prioridades europeias.
Vridagh, porém, fez uma avaliação diferente sobre este quesito. "O acordo entre UE e Mercosul não será fechado com Bolsonaro. Seu anúncio foi que pensa em deixar o Mercosul, pois quer se distanciar dos países menos desenvolvidos", afirmou a cientista política e acrescentou que parece mais provável que o presidente eleito se esforçará para se aproximar dos Estados Unidos.
Em sua exposição, Koetsenruijter destacou ainda o trabalho conjunto realizado com governos anteriores nas áreas de direitos humanos e povos indígenas.
"Embora saibamos que até agora não houve muito eco no futuro governo, nosso trabalho tem tido um grande eco na sociedade e esperamos poder continuá-lo. O Brasil tem sido para nós um parceiro estratégico não somente bilateral, mas também como um soft power na América Latina, África e Ásia. Temos algo a oferecer a este governo e estamos abertos ao diálogo", concluiu o diplomata.